O RioContentMarket, evento realizado recentemente no Rio de Janeiro, destinou este ano espaço bem maior ao branded content, área que faz tempo deixou de ser novidade e que a cada dia apresenta novos desafios para agências, produtoras e outros fornecedores do mundo da comunicação.

 

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Eco Moliterno, vice-presidente de criação da Africa, deixou seu recado sobre o assunto em um painel em que explicou para a plateia as diferentes nuances dos formatos publicitários de hoje, desde os anúncios de varejo, focados 100% em vendas, passando por comerciais com enredo, o advertainment exemplificado por trabalhos como Volvo Live Test Series, o product placement de filmes que fez brilhar marcas como a Chevrolet no filme Transformers e finalmente o branded content propriamente dito, em que o conteúdo está a serviço da propaganda e vice-versa, em projetos como Intel Inside.

“É nessa junção que está a oportunidade para publicidade e conteúdo trabalharem juntos. Costumo dizer que a publicidade corre 100 metros rasos, e o conteúdo corre maratonas. Sabemos hoje que o conteúdo longevo gera maior engajamento”, diz Moliterno, que mostrou para a plateia cases de branded content da Africa como Brasileiros de coração, Isso muda o mundo, para o Itaú; e Eduardo e Mônica e Exagerado, para a Vivo. Muitos outros cases bem-sucedidos foram apresentados no evento para marcas como Nike, Nissan, Fiat, Unilever e Avon.

O que fica claro sobre o uso do branded content é o desejo de anunciantes de se associarem à novidade e à inovação, e ao desejo de estabelecer uma conexão mais “humana” entre a marca e as pessoas.
Como a Nissan no projeto A rota da tocha, uma série de dez documentários para o SporTV, 70 peças para plataformas digitais, dois comerciais e dos minidocumentários para cinema sobre a seleção e as histórias de personagens que vão carregar a Tocha Olímpica em 2016.

A busca da produção era por personagens “atrevidos”, e o objetivo era posicionar a própria marca Nissan, protagonista do projeto, como atrevida. E, mais do que isso, aproximá-la de histórias surpreendentes, humanizando a comunicação.

Outro exemplo de marca que investe em conteúdo como estratégia de reposicionamento e associação da marca à inovação é RomeoReboot, da FlagGCX/CuboCC para a marca Axe, da Unilever. Larissa Jorge, gerente de marketing de Axe, conta que a marca precisava evoluir e se comunicar com o “homem moderno”. A marca tem o papel de “puxar” a inovação dentro da Unilever, através da plataforma House of Axe. Após uma ampla pesquisa sobre os dilemas desse homem moderno, a Flag/Cubo desenvolveu a série de quatro filmes RomeoReboot, em parceria com profissionais de conteúdo como o roteirista Felipe Braga. 

“O nosso business mudou, e o próximo estágio é a criatividade e a relevância. A próxima curva de performance virá da capacidade de se comunicar mais individualmente com cada consumidor”, disse Roberto Martini, da FlagGCX, para quem um dos segredos de trabalhar bem com branded content é colocar o ego “lá embaixo” em nome do engajamento.

Também entra no território do branded content o desejo das marcas de estarem no território das “tensões sociais” não para polemizar, mas para promover a identificação. Malu Antonio, gerente de publicidade da Fiat, marca que vem fazendo isso com alguma frequência, nunca foi tão dífícil construir marcas: não há mais horário nobre e produzir e distribuir conteúdo está nas mãos das pessoas. No lugar de “surfar nessa onda”, é preciso ser de fato relevante.

Essa busca, segundo ela, depois de inúmeros projetos de branded content, mudou a história da empresa no Brasil. A marca chegou a promover um seminário sobre mobilidade urbana para discutir o futuro. Segundo ela, trabalhar com conteúdo implica em ter coragem de construir, de fato, com as pessoas. Sem roteiro. Não se trata do poder de contar uma história e sim abrir mão do poder para produzir conteúdos que têm a ver com a verdade da marca. Vem pra rua, ação da Copa das Confederações em meio às primeiras manifestações de descontentamento dos brasileiros em relação à política, é lembrada até os dias de hoje. “É muito mais do que fazer propaganda. Vem pra rua tornou-se uma campanha das pessoas, e não mais da Fiat. A mágica acontece quando a realidade da marca encontra a realidade das pessoas. É raro, mas acontece”, comenta.

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Gilberto Topczewski, da produtora Big Bonsai, trabalha com branded content desde 2006 para a Nike, em muitos casos em parceria com as agências que atendem a marca, e afirma que o objetivo da marca era – e continua sendo – ir além e construir uma conversa autêntica com os consumidores. Um dos projetos que começaram como uma série de filmes sobre o futebol de rua, acabou se transformando em um campeonato, a Batalha das quadras, que envolveu mais de 500 times entre Rio e São Paulo e virou programa na MTV. Vários projetos acabaram ganhando uma longevidade em diversas plataformas de maneira orgânica. “O branded content faz parte dessa shared economy que vivemos, é um mundo mais colaborativo, de um milhão de possibilidades”.

No Brasil, o branded content ainda é visto, em muitos casos, como o “primo pobre” da propaganda tradicional. Projetos são, muitas vezes, alternativas de anunciantes que possuem verbas mais limitadas, e não desejam ou não podem investir grandes somas em marketing. O próprio projeto da Tocha Olímpica da Nissan, por exemplo, representou um investimento de R$ 4 milhões para a montadora, bem distante dos R$ 15 milhões eventualmente gastos pelo Bradesco, também patrocinador das Olimpíadas Rio 2016, em campanhas na mídia tradicional.

Um dos grandes dilemas principalmente das agências para trabalhar com o branded content é que o formato não pode seguir vias tradicionais de remuneração e o processo colaborativo acaba fragmentando a verba entre muitos players, o que torna os projetos, em muitos casos, pouco rentáveis.

Patrícia Weiss, especialista em branded content, explica que antes de falar em investimentos nessa área, é preciso entender que em outros países a indústria do entretenimento é muito mais desenvolvida e, consequentemente, paga-se melhor pela produção do entretenimento e pelas ideias e profissionais.

“Naturalmente, os valores pagos para uma diária de produção de um filme publicitário no Brasil são sensivelmente superiores aos de uma diária de produção de entretenimento. Agora, quando se trata de branded content, como o modelo de negócio brasileiro é completamente ultrapassado e totalmente condicionado à compra de mídia, o incentivo e o foco do volume de investimento da marca vão para a propaganda tradicional como prioridade, enquanto o conteúdo ainda é percebido como algo menos importante e mais ‘alternativo’”, diz.