O Brasil foi o país mais premiado em Print & Publishing Lions, novo nome da área de mídia impressa do Cannes Lions, repetindo a sua força nesta competição com um total de 13 Leões conquistados. O Reino Unido ficou em segundo lugar, com dez prêmios, seguido pela Alemanha, com sete. O resultado também é melhor do que o número de Leões do ano passado, que totalizou 11, mas inferior a 2013 e 2014, quando o país recebeu 25 e 22 prêmios, respectivamente. Mas vale lembrar que o número de inscrições brasileiras caiu 10% no Festival Internacional de Criatividade como um todo. Neste ano, as agências brasileiras conquistaram quatro Leões de ouro, quatro de prata e cinco de bronze na competição.

Alê Oliveira

A Y&R surpreendeu e teve o melhor desempenho, com cinco Leões, sendo dois de ouro, um de prata e dois de bronze. Inicialmente a AlmapBBDO tinha ficado em segundo lugar sozinha, mas perdeu a posição após uma acusação de machismo contra uma campanha criada para a Bayer, premiada com o Leão de bronze em Outdoor Lions (leia matéria na página 38). Diante da polêmica, a agência solicitou à organização do Cannes Lions a retirada de todas as peças da marca inscritas no festival. Com isso, ela abriu mão de dois Leões – além da série mp3/mov/doc, que foi o pivô da polêmica em Outdoor Lions, a Almap também tinha sido premiada com um bronze pela série Box e careca, em Print & Publishing. A Bayer informou para veículos da imprensa internacional que o referido trabalho teria sido criado para veiculação limitada com objetivo apenas de ser inscrito em Cannes e sua veiculação na mídia teria sido paga pela própria rede BBDO.

Uma fonte ligada ao anunciante informou ao PROPMARK que a polêmica surgiu diante de uma divergência de decisões entre a Bayer internacional e a Bayer do Brasil.

Um dos trabalhos da série premiada em Outdoor Lions, o mov, traz o título Don’t worry Babe, I’m not filming this. Mov (Não se preocupe querida, eu não estou filmando isso, em uma tradução livre). Além de ser acusado de machista, o prêmio ao trabalho foi criticado em Cannes por poder ser associado ao recente crime de estupro coletivo de uma adolescente no Rio de Janeiro, que foi filmado.

A Almap emitiu um comunicado lamentando que o trabalho tenha causado constrangimento e afirmando que “Repudiamos a prática de filmagem não consensual e qualquer espécie de violência ou invasão de privacidade. Ficaremos atentos para evitar o problema no futuro.”
Com essa exclusão do Leão de bronze da Almap, a agência ficou com um ouro e duas pratas, empatando em número de Leões com a F/Nazca Saatchi & Saatchi, que ganhou um de ouro, um de prata e um de bronze. A DM9DDB ganhou um de bronze e a Africa conquistou um de bronze (confira todos os Leões na tabela).

Hugo Rodrigues, presidente da Publicis Brasil, jurado da competição este ano, disse que o Brasil saiu vitorioso, considerando que o mercado brasileiro ganhou quase metade dos ouros concedidos na competição, que foram apenas dez no total, e a redução de inscrições. “Esse resultado tem de ser comemorado, tivemos uma redução absurda de peças”. Este ano, a área recebeu 3.775 peças no total, contra 4.470 em 2015.

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Para o publicitário, o resultado foi muito positivo. Ele também comentou sobre os Leões brasileiros de ouro. “Eu acho que o trabalho feito para a Livraria Penguin (da Y&R) é muito bom, porque eles conseguiram traduzir uma verdade. Ou seja, você realmente tem nos filmes um sucesso inferior aos livros. E nunca ninguém tinha visto isso. E eles conseguiram traduzir. Foi um ouro fácil de dar. A peça da Getty Images (da AlmapBBDO) é brilhante artisticamente. A discussão foi um pouco maior, mas conseguiu o ouro. A campanha de Leica (da F/Nazca) é fantástica, continua com aquela poesia que já deu a eles o Grand Prix em Filme no ano passado. E o trabalho de Freddo é muito mais próximo de uma campanha publicitária típica, clássica, mas tem um trabalho de fotografia brilhante e uma reação das pessoas na foto muito feliz no sentido de impactar quem está vendo”, conclui Rodrigues.

Sobre a experiência no júri este ano (sua segunda vez em Cannes), ele disse que foi tensa, pois existem muitos interesses em jogo. “Eu venho para Cannes há 16 anos consecutivos. O festival está cada vez maior e mais em torno do business, o que é muito bom e, ao mesmo tempo, mais perigoso, porque tudo que envolve mais dinheiro se torna mais passível de influência de grandes grupos. Todos nós sabemos que existem quatro ou cinco grandes grupos de comunicação no mundo, que controlam 90% das agências. É um jogo desgastante. Uma sugestão que vou fazer para o Terry Savage e o Philip Thomas (chairman e CEO do festival, respectivamente) é que eu acho que não deveria ser permitido o uso de celular durante as votações. Acho que existe muita influência de fora”, afirma.

Grand Prix para McWhopper gera polêmica

O Grand Prix vencedor deste ano da repaginada competição Print & Publishing, que propõe um conceito mais amplo, passando a avaliar também trabalhos editoriais veiculados em mídia digital, gerou polêmica no festival e aponta mudanças no modo de pensamento da indústria a respeito do que realmente é importante na área, uma das mais tradicionais da propaganda – se é o resultado ou a estética da peça. O case vencedor McWhopper, criado pela Y&R de Auckland, Nova Zelândia, para o Burger King, não é um primor de direção de arte, como a maioria das pessoas espera de uma campanha de print, mas a ideia conquistou os jurados pela simplicidade e repercussão mundial que alcançou. A peça usou jornais norte-americanos – The New York Times e Chicago Tribune – para publicar uma simples carta aberta ao McDonald’s propondo uma trégua na guerra mercadológica entre estas duas redes de fastfood.
A ideia era que as concorrentes, juntas, criassem um sanduíche híbrido para unir suas marcas registradas, o Big Mac e o Whopper. O resultado seria vendido em uma lanchonete temporária em Atlanta por um dia e todo o lucro seria destinado à ONG Peace One Day, uma organização que promove a paz mundial. O McDonald’s recusou a oferta da rival, mas a ação foi suficiente para gerar buzz mundial, a ponto de outras marcas, como a brasileira Giraffas e a norte-americana Denny’s, proporem parcerias com o Burger King.
O presidente do júri de Print & Publishing, Joji Jacob, diretor-executivo de criação da DDB Group, destacou que a peça é muito simples, mas que ela virou uma sensação mundial. Segundo ele, o trabalho foi muito debatido entre os jurados. Aliás, parte do júri defendeu que não fosse concedido o GP este ano. “Havia outras peças com um craft muito superior, mas pensamos que esse é o futuro de print. Um anúncio provocativo, que se espalhou pelo mundo inteiro”, pontuou Jacob.
Para Hugo Rodrigues, o GP traduz a nova realidade da propaganda. “Fiquei muito feliz com o GP. O mundo é feito de memes. O mundo é feito de coisas muito mais simples. Essa é a maior prova. A gente tem de saber avaliar a propaganda. O objetivo era lançar um desafio. O desafio venceu qualquer limite. Atingiu o mundo inteiro. Ultrapassou qualquer mídia que pudesse ser comprada. Isso é brilhante e merece o Grand Prix. A ideia é simples. O anúncio começa com um título de uma carta aberta. Quer algo mais antigo e com uma repercussão mais atual do que foi?”.
Segundo o criativo, o desconforto entre os jurados foi total. “Em muitos momentos chegou-se a cogitar a não ter Grand Prix. Nós estamos no ano de 2016, no século 21, e ainda existe a luta pela criatividade publicitária. Não é que isso deve ser descartado, mas não pode ser levado tão a sério. O que está em jogo aqui é muito mais a repercussão das peças para o consumidor lá fora. Houve um desconforto porque as pessoas esperam ver anúncio com cara de fotografia, de arte. E, infelizmente, nós não somos artistas. Artistas são pessoas que fazem algo fenomenal e alguém se interessa. Nós somos meros profissionais contratados para resolver problemas de marca. E isso foi muito discutido. É um GP de uma peça de resultado. Ela demonstra que o papel não está fora de moda quando consegue transformar o consumidor em mídia. Não precisa se matar só em torno de coisas lindas. A beleza é importante, mas quando você tem uma ideia poderosa, ela vence até a estética”, finaliza.