O Brasil saiu do Cannes Lions sem Leões em Mobile, júri presidido pela brasileira Joanna Monteiro, recém-promovida a CCO da FCB Brasil (era VP de criação – veja matéria na página 26), e o fato deu margem a algumas discussões em torno da categoria. Segundo Joanna, o Brasil perdeu em tecnologia: a maioria dos jurados tinha background de tecnologia, fazendo com que a área ganhasse mais força em detrimento da criação. Eram, segundo relatou Joanna, “14 pessoas de países ricos que trabalham com tecnologia de ponta”, e com isso o Brasil não teve condições de competir. Faz pensar acerca do que realmente faz a diferença nas estratégias de comunicação em Mobile: uma boa ideia sem tecnologia chega lá ou são fundamentais os recursos tecnológicos inovadores – que acabam se transformando na própria boa ideia em Mobile?
Em Cannes, a categoria foi criada em 2012, sendo que no ano passado o Brasil inscreveu 124 trabalhos e conquistou o Grand Prix com “Protection Ad”, da FCB Brasil para Nivea, e outros 12 Leões (sendo que nos anos anteriores, respectivamente, levou seis e três). Este ano, o Brasil inscreveu 96 trabalhos e chegou a emplacar quatro deles no shortlist: “Hello Pizza”, da FCB para CNA; “Clássicos por trás dos clássicos”, da Artplan para Orquestra Sinfônica Brasileira; “Caminhada de cachorro”, da Publicis para Purina; e “#NoFilter”, da Loducca para a ONG de surfistas Waves for Water. São quatro trabalhos, essencialmente criativos, nos quais de fato a ideia fala mais alto do que a tecnologia. Mas nenhum deles chegou a Leão.
O Grand Prix foi altamente tecnológico: “Cardboard”, o óculos de realidade virtual de papelão do Google, de fácil acesso e patente aberta, divulgado com a Mountain View, house do Google. O produto se tornou um grande sucesso no mercado, ganhou mais de 600 aplicativos compatíveis, levou fabricantes terceirizados a produzirem e venderem 1 milhão de óculos, resultou no upload de 28 mil vídeos diferentes sobre os óculos, que foram adotados em campanhas e estratégias de marcas como Volvo, Lionsgate e Converse.
Mas, o que parece uma grande vitória da tecnologia, talvez em Mobile seja de fato a própria ideia, e cada vez fique mais difícil distinguir uma coisa da outra. Ocorre que isso é uma realidade em países mais maduros. No Brasil, a verdade é que o mobile vive seus estágios iniciais.
Alberto Pardo, CEO da Adsmovil, chama atenção para o fato de que 4% do investimento total digital vai para o segmento mobile no Brasil, enquanto em outros mercados – como EUA e Reino Unido – o percentual é de quase 15%. “O ecossistema ainda está em fase de construção e precisa de tempo. O Brasil ainda está muito focado no segmento desktop. Anunciantes locais grandes já têm mais de 30% do seu tráfego proveniente do mobile, mas o investimento de marcas é inferior a 5%”, diz Pardo, lembrando que o tamanho do mercado de smartphones é o que temos a nosso favor, pois representa um grande potencial de criação de um grande ecossistema de anúncios mobile. Nos falta melhor entendimento das mídias mobile e seu papel para as marcas neste cenário. Laura Florense, vice-presidente de criação da LOV, concorda que ainda se pensa muito na versão “desktop”. “Pensar primeiro no celular é um desafio bem maior. Precisamos ter melhores processos para criação de apps e plataformas, e driblar o imediatismo do mercado brasileiro.”
Segundo Laura, a angústia dos clientes e das agências por resultados imediatos ou a curtíssimo prazo é um grande impedimento para projetos mais elaborados. “Do nosso lado, dos criativos, precisamos pensar em ideias mais simples (de fácil implementação) até que todo mundo esteja na mesma página em relação a tempo e investimento”, afirma.
O problema do prazo seria, portanto, um complicador maior do que a tecnologia. “Não acho que temos limitações tecnológicas. Temos ótimos profissionais e a maioria das agências está atualizada e faz parte de grandes grupos como, no nosso caso, o grupo Dentsu Aegis Network. Como tudo na vida, é uma questão de prática mesmo. Precisamos fazer mais projetos para aprender e ficarmos melhores”, conclui.
Denis Gustavo, diretor de integração digital da Leo Burnett Tailor Made, concorda que um dos pontos fracos no Brasil é o processo curto para pensar mobile de forma efetiva. Aqui ainda existem os termos “desdobramento” e “replicação” para o mobile.
“Pensar no projeto onde todos os meios são considerados desde o primeiro minuto deveria ser regra em todos os jobs, mas nem sempre o timing que temos é suficiente. Com essa mudança de mindset, todos poderão entender o mobile não apenas como um meio, mas como parte importante do comportamento do consumidor”, disse.
A questão é “como pensar” o meio: como plataforma de mídia ou como serviço e entretenimento. De uma forma ou de outra, é importante que o mobile não seja visto como a continuação de um trabalho criativo. De todas as questões, a menos relevante, ele acredita, tem a ver com limitações tecnológicas. “Temos ótimos profissionais com capacidade para desenvolver qualquer coisa. Mobile não é novidade para nós, mas ainda é preciso evoluir muito. Tentar. Errar muito. É um trabalho contínuo”, conclui.
Cris Camargo, diretora-executiva do Interactive Advertising Bureau (IAB) Brasil, acredita que entender a velocidade com que evoluem as tecnologias e suas inúmeras possibilidades, além de quebrar alguns paradigmas, é o grande desafio para muitas empresas, e não só no Brasil. “Quando demos os primeiros passos para a publicidade digital, cometemos vários erros que nos permitiram evoluir em métricas, formatos, entregas, eficiência. O mesmo irá acontecer com as plataformas móveis. Entender os formatos mais eficientes e as melhores métricas será um passo necessário para quem estiver disposto a evoluir.”
Cris vê a evolução do modelo de negócios da publicidade mobile como um processo natural para todas as indústrias. “Quando outros meios de comunicação surgiram, os modelos de negócios também não estavam completamente estabelecidos. Aprenderemos qual o ponto de equilíbrio ideal na prática. A diferença é o tempo e a forma de aprender. Não há tempo para dez anos de estudo de modelo de negócios. É necessário estabelecer relações transparentes e com parceiros de negócios dispostos a assumir riscos”, afirma.
A executiva enxerga um futuro promissor para o meio. Como no início da publicidade digital, quando anunciantes dedicavam um budget muito pequeno e equipes muito juniors para a operação, começa a cair a ficha de que também no mobile os padrões de pensamento terão de evoluir.
“Não há certo ou errado. Certo e garantido é entender que a comunicação humana será realizada por plataformas móveis. Como usufruir deste movimento, como ter a receita perfeita de modelo de negócios, como trazer resultados eficientes para seu negócio? Estas são as perguntas de um milhão de dólares!”.