Somos um país pobre. Potencialmente, bilionários. Mega-abençoados pela natureza. Factualmente miseráveis. Há 500 anos preferimos a praia ao batente. E não existe almoço grátis. A natureza nos dá tudo. Só precisa semear, plantar e colher. Mas isso dá muito trabalho. Assim, permanecemos ao sol… Como dizia meu professor de medicina legal, somos potentes coeundi – a tal da ereção, uma atrás da outra –, mas absolutamente impotentes generandi – incapazes de procriar, produzir riquezas, “beefs…” – “where is the beef?”. Como não geramos riqueza vivemos brigando com o cobertor curto. Insuficiente para suprir todas as necessidades básicas e essenciais e ainda deixar algum troco para investimentos.
Assim, com a realidade não se brinca e muito menos se desafia. A realidade é: ou nos adequamos e trabalhamos dentro das condicionantes e limites que impõe essa realidade – obra exclusiva nossa – ou passaremos a vida com o corpo abarrotado de roxos, arranhões, fraturas. Claro, se sobrevivermos. Enquanto insistirmos em consertar o passado não conseguiremos construir o futuro. Passaremos a vida apagando incêndios, tapando buracos, correndo atrás. O Brasil precisa definir qual é o seu negócio. Eleger um posicionamento. Planejar-se. Construir o seu Brasil Brand Book: manifesto narrativa, visão, missão, valores, compromissos e legado. E almejar ser o que nosso DNA – natureza e competências específicas – nos potencializa a ser. E isso é tudo.
Depois de duas tentativas, o Mam do Rio conseguiu vender um de seus quadros para pagar dívidas vencidas. Vendeu por US$ 13 milhões o quadro Nº 16 do artista Jackson Pollock, pintado no ano de 1950. Inicialmente, nas duas primeiras tentativas, pedia US$ 25 milhões. Assim como anos atrás o Masp precisou vender a obra de Paul Guaguin, José e a Mulher de Potifar, supostamente doada ao museu por um mecenas de ocasião, Baby Pignatari, mediante insistentes pedidos e supostas ameaças de Assis Chateaubriand tendo Pietro Maria Bardi como mensageiro.
E aí começa a discussão: “não deveriam vender”, “por que venderam?”, “quando conseguiremos preservar nossas reservas e patrimônio cultural” e por aí vai. Pergunta, será que estamos em condição de investirmos em arte? Milhões de desempregados, milhões de desalentados, milhões carentes de saneamento básico, e a galerinha da Paulista e de Ipanema reclamando da venda de quadros? Será que num país onde falta dinheiro pra tudo – desde educação, passando por saúde, saneamento, trabalho – deveríamos insistir em museus e patrimônio artístico. Um de nossos museus, em São Paulo, por falta de dinheiro e manutenção adequada foi recentemente consumido pelo fogo, e parcela expressiva do patrimônio artístico do país que escapou dos incêndios, permanece abandonada e descuidada. Poucos anos depois, um segundo museu passou pela mesma calamidade, no Rio de Janeiro.
O Museu do Ipiranga está fechado para reforma, vai completar seis anos, deveria reabrir em 2022, mas sabe-se lá se isso vai acontecer. E seu acervo de 30 mil objetos foi espalhado por diferentes lugares… E por falar em obras de arte, as tais das obras de arte da engenharia – pontes, viadutos, túneis, barragens, diques, eclusas, muros de sustentação… Todos ou todas, carecendo de manutenção urgente, e por aí vai.
Assim, ou nos damos conta e raciocinamos a partir de nossas verdades e mazelas, ou estaremos condenados a continuar vivendo situações de mentiras e falsidades, absolutamente distantes, quilometricamente distantes, de nossa verdadeira e única realidade. Será que um dia assumiremos e reconheceremos todas as nossas limitações e nos tornaremos um país de verdade? Um dia Vinicius de Moraes incomodou
as feias – depois desculpou-se e foi perdoado, quando disse, “as feias que me desculpem, mas beleza é fundamental”. Sigo na pegada, “os preguiçosos que me desculpem, mas trabalho é fundamental”. Ou, se preferirem, já ganhamos na loteria. Agora só falta tirar a bunda da cadeira e irmos receber o prêmio. Construir um país de verdade. Ou não… Dá trabalho… Feliz Ano Novo. Ótimo 2020!
Francisco Alberto Madia de Souza é consultor de marketing (famadia@madiamm.com.br)