É fato que as redes sociais deixaram as empresas mais vulneráveis em relação à opinião dos consumidores quanto ao produto e às ações que promovem. Muito mais além de reclamações em sites do gênero, atualmente as pessoas têm o poder até mesmo de organizar pegadinhas contra empresas que utilizam a tecnologia na tentativa de criar engajamento. Depois dos exemplos mais notórios de Skol e da sopa Vono, que foram bombardeadas na internet no Carnaval deste ano por mensagens sexistas em peças de publicidade, na última sexta-feira (15) foi a vez da Itaipava sofrer o golpe.
Com a ideia de comemorar o sucesso da campanha “O Verão É Nosso”, a cerveja usou suas páginas nas redes sociais para promover a hashtag #FicaVerão após a divulgação de um vídeo da atriz Aline Riscado, que interpreta a personagem dos comerciais criados pela agência Y&R, informando que com a mudança de estação ela teria que se retirar da comunicação da marca, a não ser que os internautas pedissem para ela permanecer. A cada hashtag publicada, a Itaipava ainda mandava uma resposta automática de agradecimento.
Rapidamente as pessoas aproveitaram para expor críticas – algumas ferozes – contra o produto e principalmente contra o conceito da campanha. Entre as mensagens, destaque para o tweet da internauta @LeilaGermano, que postou “esse #FicaVerão é bem machistão, né?” e ainda recebeu um “obrigado” como resposta (foto de abertura da matéria). “As empresas estão aprendendo com a dor”, resume o professor de Ciências Sociais e do Consumo da ESPM, Fabio Mariano.
Apesar do buzz negativo no último dia da campanha, no entanto, as vendas da Itaipava apresentam crescimento durante o período em que a personagem Verão esteve no ar. De acordo com dados da Nielsen, o market share do Grupo Petrópolis, dono da marca, aumentou nos últimos meses e fez a empresa ultrapassar pela primeira vez os 13% de participação no mercado cervejeiro nacional, consolidando a posição da companhia no segundo lugar, atrás apenas da Ambev. Além disso, já em fevereiro, depois das veiculações dos dois primeiros comerciais da trilogia da personagem, a Itaipava voltou a figurar no ranking da pesquisa “Preferência de Marcas em Propagandas de TV”, realizada pelo Datafolha. Com tanto recall e números positivos, por que então a ação tomou uma revertida no último momento?
“O mercado em geral está um passo antes das grandes transformações que estão acontecendo e nunca essas mudanças ocorreram em um período tão curto de tempo. A voz dos formadores de opinião, hoje, não é mais uma voz, é um grito. Mesmo que seja uma minoria, dez pessoas que sejam, têm o poder de gerar polêmica e isso ganha força”, explica o professor Fabio Mariano.
Fórmula antiga
A maioria das críticas contra a campanha da Itaipava estavam relacionadas a um conteúdo possivelmente machista, porém também se destacaram mensagens como a do usuário @Raphaelrpais, que foi mais adiante e acusou a campanha da Itaipava de ser “vergonhosamente ultrapassada”. Embora concorde com a opinião, Fabio Mariano explica porque a fórmula mulher, futebol e bordão, entre outros elementos, continua sendo amplamente usada por grandes anunciantes e agências. “É a crença de que em time que está ganhando não se mexe. Utilizam fórmulas conhecidas para gerar recall. Mulher gostosa e bordão são recursos que acionam partes do nosso cérebro. Mas nem tudo que fica guardado na memória é positivo. Acontece muitas vezes de uma música ruim grudar na mente e a gente pedir pelo amor de Deus para esquecer aquela canção”, diz.
Segundo Bruno Maletta, sócio da Consumoteca, boutique de conhecimento especializada no consumidor brasileiro que realiza levantamento de dados a partir de análises antropológicas, hoje em dia, campanhas que usam esses símbolos certamente alcançam o resultado de vendas no curto prazo, mas correm o risco de perder o poder da marca ao longo dos anos caso insista em linhas de comunicação que entram em conflito com os valores que estão ganhando força. “A percepção da sociedade tem impacto a longo prazo. Não é apenas uma campanha que fará a marca deixar de ser consumida de vez. Porém, é um movimento da sociedade. Hoje as pessoas percebem certas coisas de forma mais negativa do que antes”, diz.
O professor Ricardo Zagallo, diretor do Centro de Altos Estudos da ESPM ou (CAEPM-ESPM), concorda com o ponto de vista. O pesquisador do mercado publicitário acredita que o objetivo é gerar polêmica e se aproveitar dos efeitos que podem inclusive surpreender no primeiro momento, mas é preciso ter cuidado ao abusar da estratégia. “É uma fórmula desgastada que funciona. Porém, será que a preocupação tem que ser só vender ou é mais importante construir uma marca?”, deixa no ar o especialista.
Procuradas pelo propmark, Itaipava e Y&R, agência da marca, não quiseram se manifestar até o fechamento da matéria.