A jornalista Kiki Moretti, fundadora e CEO do Grupo In Press – holding de agências de relações públicas e serviços especializados formada por In Press Porter Novelli, FleishmanHillard, In Press Media Guide, In Press Oficina, .MAP e Vbrand –, não é rata de júris, nem de Cannes. Vai, de peito aberto e com muito entusiasmo, participar pela primeira vez do júri de PR no Cannes Lions 2015, em busca de trabalhos que impactem as pessoas, se relacionem com a vida delas e mudem comportamentos. Kiki – que lidera um grupo de 500 pessoas em São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília – revela o que pensa do mercado e confessa que seu case favorito, até hoje, é “Dumb Ways to Die”, a campanha mais premiada na história do festival. Veja a seguir os principais temas abordados por ela.
História
“A minha história com Cannes começa quando PR passa a ser uma categoria premiada, alguns anos atrás (2008). Mas fui pela primeira vez ao festival em 2013. No ano passado, por conta da Copa, outros profissionais da In Press nos representaram.”
Leões
“Infelizmente nunca ganhamos um Leão. Já inscrevemos dois cases, em anos diferentes, mas percebi que estávamos usando uma linguagem muito linear, valorizando mais a execução do que a ‘big idea’. Ao participar de Cannes pela primeira vez, me dei conta de que teríamos grandes cases para serem inscritos – ideias muito simples, mas brilhantes. Este ano acho que temos um bom case.”
O Festival
“Adoro o clima de festival, de gente criativa do mundo todo, do astral. O networking é muito bacana, especialmente o internacional. Acho que a programação é essencial para sinalizar as tendências, mas, infelizmente, os debates não são muito profundos. Também gosto das festas.”
Ser jurada
“Fiquei extasiada com a notícia de que seria jurada. Comecei a gritar pela casa, meu marido achou que eu estava passando mal. É um reconhecimento e tanto. Representa que estou no caminho certo, que estou fazendo coisas relevantes nesse mercado tão competitivo, que a In Press tem uma notoriedade na indústria. No ano passado formalizamos nossa associação com o Grupo Omnicom e trouxemos para o Brasil duas grandes
networks de PR: a Porter Novelli, que já representávamos há 15 anos, e a FleishmanHillard, maior rede de PR do grupo. É um movimento inédito na indústria de PR ter, num país relevante como o Brasil, duas grandes marcas internacionais competindo entre si debaixo do mesmo guarda-chuva. O mercado viu com bons olhos. Acho que esse fato contribuiu para eu ser escolhida para o júri de Cannes.”
Prêmios
“Prêmios em festivais no mercado de PR são um movimento recente. São importantes para que a indústria seja mais valorizada e os melhores trabalhos conhecidos. Prêmios chamam a atenção do mercado e do cliente.”
Júris
“Você tem a possibilidade de aprender, em poucos dias, o que levaria um ano ou mais. É uma imersão em trabalhos estratégicos, criativos, loucos. Vale mais do que uma faculdade de comunicação inteira. Como jurada, sou emocional. A ideia tem de me conquistar. Depois que fui fisgada pela genialidade, aí vejo se a ideia se desenvolve com fluidez, gera ações de impacto que trazem resultados concretos. Gosto de soluções simples, daquelas que você fica irritada e se pergunta: ‘Como eu nunca pensei nisso?’”
Fantasmas
“Sou contra. Temos de premiar trabalhos que mudaram percepções, impactaram pessoas, mexeram com a sociedade. Não faz sentido premiar apenas ideias geniais. O mundo exige coerência.”
Expectativa
“Quero ser surpreendida. Vou usar os critérios que relatei acima. Para minha experiência pessoal, espero ver cases geniais, abrir meus horizontes, me inspirar. Espero conhecer profissionais brilhantes e ter debates de altíssimo nível sobre comunicação.”
PR em Cannes
“Acho que ainda é uma categoria muito dominada por agências de propaganda. Entendo que o critério é criatividade, por se tratar de um prêmio de criatividade. Talvez cases bem robustos de PR clássico – crise, por exemplo – fiquem de fora. Difícil ter ideia criativa demais em crises corporativas. Mais fácil é usar a criatividade para reverter os estragos de uma crise de imagem.”
O que vale Leão
“Vale o que muda percepção, muda comportamento, influencia pensamento. Isso é PR. Alguma ideia que engaje as pessoas num movimento, numa causa, que mude a percepção sobre determinado tema, que mude comportamento.”
Criatividade
“É ter uma ideia simples, fácil e que as pessoas comuns digam ‘Wow, quero participar desse programa, quero fazer parte desse movimento, me identifico com essa marca.’”
Publicidade x PR
“Acho que as agências de publicidade sabem contar as histórias e seus cases de uma forma menos linear, com uma linguagem bem mais criativa. As campanhas que se originam numa agência de publicidade normalmente são mais robustas e englobam ações em todas as disciplinas. É natural que, ao se enquadrarem também na categoria PR, venham com uma pegada criativa desde a ideia que gerou o filme. Tá na essência. As campanhas de PR não são, necessariamente, feitas por ideias criativas.”
O PR brasileiro
“O Brasil é uma estrela em Cannes. Nosso desafio agora é para PR. Temos de conquistar a notoriedade da propaganda brasileira, uma das melhores e mais reconhecidas do mundo. Temos muito a aprender. Na forma de contar nossas histórias, na abrangência de nossas campanhas. Mas o festival está ajudando o mercado a evoluir. Somos muito criativos, fazemos PR como os melhores do mundo, mas temos dificuldade de nos vender bem.”
Identidade
“No Brasil o termo PR é completamente descaracterizado. Promoter se intitula PR, a profissão de Relações Públicas é regulamentada e restritiva, jornalistas invadiram a comunicação corporativa. A Associação das Agências de PR preferiu intitular ‘agências de comunicação corporativa’. Mas esse termo não consegue definir mais o que as agências são. Há uma crise de identidade. Somos muito mais que agências de comunicação corporativa. Acho que o termo Public Relations precisa ganhar no Brasil um significado à altura do que representa. Nos Estados Unidos está claríssimo.”
Desafio do PR
“Ser verdadeiro e transparente. As empresas precisam entender que o discurso e a prática devem andar juntos. Reputação hoje é a soma disso. Os stakeholders de uma marca são produtores de conteúdo, têm onde publicar suas opiniões. Todo mundo é mídia. As empresas e suas marcas precisam ter coerência no que anunciam.”
Preparo
“Acompanhei as últimas premiações e procurei entender os critérios que levaram determinados cases a serem premiados. Conversei em 2014 com dois dos brasileiros presentes nos júris passados e com profissionais da Porter Novelli que já estiveram no júri. Vou também dar uma olhada nos cases premiados no ano passado. Quero ter elementos de comparação.”
Melhor case
“Até hoje meu case preferido é ‘Dumb Ways to Die’. Se enquadra em tudo que eu considero a mais pura essência de PR – impacta as pessoas, se relaciona com a vida delas, muda comportamento. E acharam uma forma genial, leve, criativa, de tratar um tema tão difícil.”