Na paisagem das cidades brasileiras acostumamo-nos com os catadores. Catadores de papel, catadores de lixo, catadores de latinhas de alumínio de refrigerantes e cervejas, e num passado mais distante os compradores e catadores de jornais velhos. Hoje uma espécie em franca decadência diante do debacle dos jornais.

Agora, e nas noites das principais cidades do Brasil, com denominação pomposa, os chargers. Isso mesmo, os catadores dos patinetes largados pelas ruas, que, a soldo dos aplicativos, dão um trato nos patinetes, recarregam nas tomadas, e os devolvem nos pontos de retirada.

Os chargers ganham, dependendo do aplicativo, entre R$ 5 e R$ 7 por patinete resgatado. O aplicativo Grin, por exemplo, paga R$ 7. Já a Yellow paga R$ 3 pelo resgate e R$ 2 pela entrega nas bases desde que e devidamente recarregados. Da mesma maneira como aconteceu com o negócio de papel, latinhas, jornais, a briga está instalada e organizações se formando. Disputando pelo resgate dos patinetes.

Em matéria recente de O Globo, um dos caça-patinetes, Mario Queiros, disse “às vezes acontecem até algumas discussões porque chegamos antes e tem gente que tenta pegar os patinetes que já reservamos…”. Cenas definitivas de um mundo novo?

Não existe nada definitivo daqui para frente. Cenas da transição de um mundo velho para o novo, onde se formam novos costumes, que mais adiante passarão despercebidos. Farão parte da paisagem. Mas que ganham uma dimensão extraordinária no Brasil de hoje, diante da crise econômica. Na matéria de O Globo a constatação de que muitos desempregados encontraram na atividade de charger uma chance de atenuarem a secura de suas carteiras, enquanto outros, a possibilidade de descolarem uma renda extra para completar o orçamento. Como já comentei com vocês, e agora reitero uma vez mais, dentre todas as novidades, a dos patinetes é uma megatolice. Bobagem monumental! Que não resistirá mais que dois ou três verões. Mas, enquanto isso, o assunto segue nas pautas das plataformas de comunicação, e nos possibilitando reflexões e aprendizados do que é, ou são, negócios de verdade.

Estava terminando este artigo quando chega a notícia: “Seis meses após ser lançada, operadora de patinetes Lime encerra atividades no Brasil. (Reuters, 9 jan, 2020)… a Lime deixará de atuar em São Paulo nas próximas semanas e no Rio nos próximos meses. As operações em Buenos Aires, Bogotá, Montevideo, Lima e Puerto Vallarta também estão sendo encerradas…”.

Da alegria e diversão da criançada do passado à quebração provisória de galho de profissionais desempregados. Catadores de patinetes. Jornais, revistas, papel velho, latinha, e, por um curto espaço de tempo, patinetes…

Muito brevemente, espero e confio, os chargers, catadores de patinetes, voltarão a se empregar, e encontrar uma utilização compatível com o capital de seus conhecimentos. Não é indigno catar latinhas, comprar jornal velho, resgatar patinetes.

Mas não foi exatamente para isso que viemos ao mundo. Por outro lado, os patinetes de verdade, aqueles de madeira e rodinha, voltarão para as mãos das pessoas de onde jamais deveriam ter saído. E pondo fim a essa estupidez e tolice que é fazê-los elétricos. Voltarão a ser brinquedos, e motivos de alegria, felicidade e pequenos tombos das crianças. Já como transporte, os patinetes elétricos são uma temeridade. E como negócio, repito, anotem, cobrem de mim daqui a 2 ou 3 anos, uma bobagem.

Francisco Alberto Madia de Souza é consultor de marketing (famadia@madiamm.com.br)