Divulgação

Não sei por que pensei em arrumar as autorizações que estavam espalhadas pela mesa. Realmente a bagunça com os documentos era só um detalhe entre os meus problemas daquela hora. Mas as manchas vermelhas de sangue poderiam prejudicar a validade delas. Meu diretor-financeiro poderia reclamar, me dizendo que autorizações com sangue só no sentido figurado. Sei que é uma burrice esse tipo de raciocínio com tanta coisa mais importante para se preocupar, mas descobri que presidente da República e gente que acorda numa sala com uma cliente morta e nua tendem a tentar esquecer os seus problemas principais com pensamentos paralelos. Bem, não sei se todos são assim. Com certeza a nossa presidenta e eu somos parecidos. Daí toca meu celular.

– Alô!

– Lula, aqui é a Graça do jornal 3p (Publicidade, Propaganda, Promoções), eu sei que você está apresentando uma campanha e queria saber qual é a verba e quando entra no ar.

– Meu amor, não sei te dizer. A cliente está morta e nua na sala e eu estou achando que isso muda um pouco a situação.

– Lula, deixa de gracinha e me diz logo a verba, porque os editores lá em São Paulo querem saber qual é a verba da campanha.

– Meu anjo, eu não estou brincando. Acabo de acordar num sofá da sala da cliente, ela está nua, morta e escorrendo sangue pela cabeça, tem um busto de Napoleão…

– O quê?

– Busto de Napoleão!

– Eu tinha entendido outra coisa. Posso colocar que a verba é de dez milhões? Preciso fechar a matéria e só depende disso.
– Pode. E diga que a cliente está morta e nua.

– Você é uma graça. Adeus!

Bem, já tinha dois problemas. Iam dizer que eu revelei a verba do cliente. A agência de divulgação do cliente ia reclamar. Podia ter ficado com a porra da boca fechada e só contar que a diretora de marketing estava morta (e nua). Não precisava ficar me aproveitando e revelar a merda da verba.

Agora sim, eu estava encrencado. Mas pela lei de Murphy o telefone deveria tocar de novo. Celular só toca quando não deve. Não precisei esperar muito. Foi só o tempo de me ajeitar no sofá de couro e a campainha do celular tocou “Clair e Lune” (preciso trocar este toque de telefone, nada mais veado do que esta musiquinha com som de aporrinhola de churrascaria).

– Alô!

– Lula, aqui é Paulo Castro (meu diretor de criação). Que tal a apresentação?

– Paulo, a cliente está morta

– Legal! Eu sabia. Essa campanha era matadora!

– Paulo, me ouça pelo amor de Deus. Ela está morta e nua!

– Tu é foda, né, mermão! Me conta depois.

Mais um problema na cabeça. Estou numa sala com uma cliente morta e nua, falei demais para a chamada imprensa especializada e descobri que ninguém acredita no que eu falo.

Continua na próxima semana. Se é que eu vou ter saco.

*lulavieira@grupomesa.com.br