O Dia dos Pais abre o calendário de datas importantes do varejo nacional no segundo semestre. Se por um lado está longe de possuir a dimensão de eventos como o Natal e o Dia das Mães, a sazonalidade tem bom impacto nas vendas de produtos e serviços.

De acordo com a Associação Brasileira de Comércio Eletrônico (ABComm), apenas no meio digital o período deve movimentar algo em torno de R$ 2,2 bilhões, um crescimento de 8% quando comparado com o mesmo evento do ano passado. Não à toa, o mercado publicitário estimula o momento com as mais diversas campanhas. Segundo profissionais do meio, sob o ponto de vista de estratégia de comunicação, dois parecem ser os desafios mais evidentes: o primeiro, e mais óbvio, é fugir do lugar-comum das peças temáticas; o segundo é, depois, alinhar o diálogo com o público baseado na figura que se projeta do pai atual, mais participativo do que fora no passado. 

Mariangela Silvani, diretora-executiva de criação da Grey, enxerga os pais na propaganda atual de uma forma mais humana, plural e verdadeira. Para ela, o mercado tem conseguido sair dos clichês e está caminhando para um retrato mais próximo do consumidor e da sociedade. Em sua visão, a figura paterna com participação, deveres e responsabilidades na criação de seus filhos é um caminho sem volta. Isso, entretanto, não significa que conhecer as tendências é o único requisito para dar um tiro certeiro em termos de comunicação para a data.

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“A oportunidade é clara: a maioria das pessoas tentará expressar um sentimento através de um presente. Ao mesmo tempo, a tarefa é uma das mais desafiadoras. Trabalhar para datas específicas significa que você terá de brilhar muito para se destacar. E aí entra em jogo uma série de coisas importantíssimas, além da criatividade: o diferencial ou inovação do produto, o preço, a mídia escolhida, o investimento na campanha, o momento econômico e político do país e por aí vamos”, acredita.

Para ela, a abordagem mais assertiva é focar nos sentimentos e valores que movem todas as relações entre pais e filhos. E encontrar uma maneira de passar a relevância e os benefícios do produto nessa história. Esse é o tom, por exemplo, da campanha que a agência criou para o Dia dos Pais de Hinode. “Nela mostramos um pai mais jovem brincando com um filho pequeno e um pai mais velho no dia do casamento da filha. Dois mundos, duas histórias, vidas conectadas pelos mesmos sentimentos: amor, reconhecimento e alegrias”. Para ela, as propagandas que marcam são aquelas que não soam oportunistas, e sim as que têm um discurso consistente. “Uma campanha para uma data específica é uma oportunidade maravilhosa para a marca expor sua forma de ver e entender os sentimentos do consumidor. Se esse olhar não for genuíno, tchau. Feliz de quem soube fazer direito”, acredita.

Target certeiro
Andrea Siqueira, diretora-executiva de criação da BETC/Havas, também concorda que os pais de hoje são mais atuantes na criação dos filhos e na divisão de tarefas, dentro e fora das propagandas. Outra coisa que a publicitária destaca é a atenção das marcas para os assuntos de diversidade e gênero. “É importante essa responsabilidade. É um dever da nossa indústria estar atenta às mudanças da sociedade”, afirma. Para Andrea, o maior desafio para a data é não virar paisagem no meio de tantas marcas comunicando ao mesmo tempo. “Por isso, o posicionamento e a personalidade de cada marca são tão importantes na hora de criar algo para o calendário de datas especiais de varejo”, avisa.

E se não raro os profissionais de marketing se questionam qual é o target que se busca atingir, o período traz de certa maneira um aspecto curioso, já que quem ganha os presentes são os pais, mas quem faz a compra efetivamente são seus filhos e cônjuges. A pergunta que ressoa é: o foco deve ser sempre e somente no shopper? Para Andrea, não existe apenas um jeito de se pensar e produzir tal comunicação. “A campanha pode falar com os próprios pais e celebrá-los, e isso gera um resultado de engajamento emocional que atinge também as mulheres e filhos. Ou pode ser algo bem-humorado e segmentado apenas para mulheres e filhos, como se fosse uma surpresa para o pai”, argumenta. Neste ano a BETC/Havas criou campanhas de Dia dos Pais para TrendFoods (China in Box e Gendai), Hering, Pão de Açúcar e Minuto Pão de Açúcar.

Mudança cultural
Com a mesma e clara percepção de pais mais participativos retratados na propaganda, Christina Carvalho Pinto, presidente do Grupo Full Jazz, traz ainda mais embasamento para reafirmar a tendência das campanhas. Para ela, essa presença paterna mais próxima, retratada através da comunicação, tem influência positiva em todos os públicos atingidos por meio das peças publicitárias. “Uma pesquisa feita pela Fundação Vale em vários países, anos atrás, mostrou que a mídia é considerada a maior fonte de educação da sociedade. Uma anomalia, já que a grande fonte de educação deve vir da família, seguida pela escola. Mas já que a anomalia é fato, todos nós, criadores de mensagens midiáticas, temos de assumir a nossa parte, levando referenciais e inspirações para a construção de seres humanos mais humanos”, relembra.

A publicitário também acredita que a oportunidade das marcas para a data está na criação de espelhos de relações de família mais saudáveis. “Na Full Jazz, acreditamos que a melhor forma de envolver o shopper é fazer com que ele ou ela se sinta parte da história, se identifique. As pessoas andam sedentas de comunicação que faça real sentido para suas vidas”, defende. Essa busca por relações mais afetivas está alinhada com a campanha para o Dia dos Pais que a agência criou para a Natura e o lançamento do deo parfum Natura Homem Verum. “Do ponto de vista criativo, optamos por inverter a narrativa habitual das campanhas para essa data, em que sempre vemos filhos homenageando os pais. No lançamento de Natura Homem Verum, o pai é quem faz uma grande declaração de amor ao filho adolescente”, conta.

Diversidade e desafio
E se a figura paterna ganhou uma leitura atual, alinhada a um pensamento mais evoluído de participação, deveres e responsabilidades, por outro, a sociedade brasileira mostra que ainda precisa avançar em outros aspectos, sobretudo quando o tema é diversidade. Maior prova disso é o ataque sofrido pela campanha Pais, criada pela AlmapBBDO para O Boticário. O “motivo”? O comercial simplesmente mostra a relação entre um pai e seus filhos, todos negros, nada mais natural, já que a etnia representa mais da metade do país de acordo com dados do IBGE.

Em poucas horas o vídeo postado no YouTube recebeu cerca de 16 mil “dislikes” e comentários do tipo: “Pouco criativo e racista. Vamos misturar essa família aí” e “Por que não tem nenhuma pessoa branca no comercial?”. Para Luiz Sanches, sócio e diretor-geral de criação da AlmapBBDO, o que a reação negativa de parte do público diz sobre a sociedade brasileira é que ainda há um longo caminho a se percorrer.

“Gostaríamos que essas questões fossem tão naturais que não precisassem ser debatidas”, afirma. A diversidade não é o tema das nossas campanhas, mas sim a forma como retratamos com naturalidade a sociedade brasileira. O Boticário é uma marca brasileira, para todos. Por isso, todos devem se sentir representados”, afirma. Para o publicitário, a propaganda é um espelho da sociedade e tem de evoluir junto com ela. “Isso é o que sempre nos inspirou”, finaliza.

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