Presente no mercado de propaganda há 30 anos, Guga Valente tem papel importante na história da publicidade. Ao lado de Nizan Guanaes criou um dos mais importantes conglomerados de empresas brasileiras de comunicação – o grupo ABC.

Um dos fundadores da holding, executivo faz balanço sobre os quase 20 anos na companhia
Valente: “Sou analógico com uma caixa de conversão digital”; FOTO: Alê Oliveira

Com seu sócio também ajudou a popularizar o esquema de duplas na liderança de suas agências, trazendo mais equilíbrio entre criatividade e negócios. É assim na Africa e SunsetDDB, por exemplo. Na entrevista a seguir, Valente fala sobre as transformações do negócio da comunicação, cultura organizacional e o papel da criatividade em tempos de eficiência e resultados.

Novos olhares
Eu não estarei mais na execução do grupo, essa tarefa ficará a cargo do Cristiano. Aliás, os últimos dois meses já foram conduzidos por ele. São 30 anos que estou nessa atividade. No ABC, desde 2002, então, são 17 anos aqui. Deu para acumular um pouco de conhecimento. Mas esse olhar agora de fora é até mais interessante porque, quando você está distante, observa por ângulos diferentes. No conselho, consigo ajudar mais ainda do que apenas como CEO. Ajudar, no sentido de olhar sob outra perspectiva para qual lado vai o negócio. E sem estar contaminado com o dia a dia.

Transformação
Por mais que eu saiba para onde vai o negócio, o digital não é uma linguagem nativa. Não sou um native speaker. Quando eu falo do mercado digital, eu sei o que fazer, mas eu preciso de uma caixa de conversão. Sou analógico com uma caixa de conversão digital. Eu preciso dela para transformar a mensagem e conseguir entendê-la. Então, se perde um pouco da agilidade na execução. Quando você tem essa geração que já nasceu nesse novo contexto, é tudo mais ágil. Todas as nossas empresas estão preparadas para o mundo de transformação que ninguém sabe ao certo para onde vai. Como um dos pilares de valor do ABC, somos always beta.

Tendências
A comunicação, como construir uma imagem, uma mensagem, sempre terá seu valor. Claro que essa é uma grande área cinzenta para saber quem faz o quê. Porque, no fim das contas, as agências estão fazendo um pouco de tudo. A TracyLocke, por exemplo, é uma agência de shopper marketing que conquistou a conta da JHSF. O cliente faz ponto de venda, mas faz propaganda também. Todas as agências têm o domínio, mas é preciso ter o conhecimento complementar de tudo que está à sua volta. É difícil apontar tendências, mas é preciso buscar ideias, fazer com que isso marque as pessoas. O que não vai mudar, e isso a gente reforça o tempo inteiro, é a criatividade.

Boa ideia
A criatividade é muito boa, mas se ela não gerar negócios, o cliente vai guardar e pronto. Ela precisa ser eficiente. Se for para ser só bonito, que não agrega nada, não fica em pé. Esse é nosso desafio. A gente precisa ter o criativo puro, o Sergio Gordilho, mas precisa ter um Marcio Santoro do lado dele. Alguém para dar um foco para a criatividade, porque senão, a mente criativa dele roda para tudo quanto é lado. Mas quando há foco, saem trabalhos brilhantes.

Concorrência
O Cristiano teve uma experiência na Accenture, e muita gente fica preocupada com as consultorias de modo geral, mas são modelos de negócios diferentes. Os profissionais [de consultorias] nunca terão a liberdade de criar o que se faz numa agência de propaganda. É a criatividade que vai fazer com que o projeto seja diferenciado.

Cultura
Esse lado de cultura que a gente faz impregnar aqui dentro é algo presente o tempo todo. Tanto que premiamos o funcionário que mais representa a cultura da companhia. E quem elege são as próprias pessoas que fazem parte da equipe. O Pipo [Calazans, copresidente da SunsetDDB] é um desses exemplos.

Quando ele foi para a TracyLocke, vi esse menino fazendo parte da nossa cultura quando trouxemos nosso presidente para a América Latina, o Juan Carlos Ortíz. Pipo estava fora, na Alemanha, mas colocou o time para fazer funcionar. A companhia estava rodando com os nossos valores. Foi quando percebemos que a empresa estava pronta para funcionar sem o Pipo. O que mantém nossa cultura forte e nossa união é esse processo de preparação de pessoas. Além da permanência delas no grupo e a sua liderança, porque contaminam essa cultura entre os seus liderados.

Sentimento de dono
Se olhar nos pilares da cultura do grupo ABC, o sentimento de pertencimento e de dono deve ser compartilhado por todas as pessoas. Elas se comportam como dono e isso faz toda a diferença. Alguém que se comporta como dono é completamente diferente de um executivo. O executivo está lá, quando dá certo ele faz, quando não dá, ele vai embora. O cara que tem sentimento de dono não faz isso. Ele está absolutamente comprometido.