Os grupos globais de comunicação aderiram aos cortes salariais. O WPP, por exemplo, reduziu em 20% as holerites do seu comitê executivo por um período de três meses, que pode ser ampliado. Essa medida serve para orientar suas redes. No Brasil, a executiva Patricia Fuzzo, CPO (chief people officer) da Ogilvy para a América Latina, afirma que está seguindo as diretrizes do WPP de contenção de gastos divulgada em março.
O governo brasileiro publicou a Medida Provisória 936 no início de abril, que traz as regras para a subtração de salários e redução de horas trabalhadas. As agências de publicidade estão atentas. O expediente legal é uma alternativa que está na agenda dos comitês internos formados para acompanhar o desenrolar dos fatos. Algumas, pressionadas pela incerteza, promoveram demissões.
Daniel Queiroz, presidente da Fenapro (Federação Nacional das Agências de Propaganda), explicou que a entidade está encaminhando questionário às associadas para saber o quadro ideal do segmento. Os sindicatos patronais regionais (Sinapros) estão engajados nessa missão.
“Estamos traduzindo para uma linguagem mais clara e objetiva os calhamaços da MP. Também estamos negociando com os sindicatos dos profissionais para normatizar as medidas, caso contrário não seria possível implementar qualquer decisão. Porém, cada agência sabe o tamanho da sua dor e o remédio que deve ser usado. Não existe um padrão. O maior investimento de uma agência é em pessoal. 80% do faturamento é para pagamento dos funcionários. É inevitável que as agências tenham de se adaptar a essa nova realidade. Nem todo anunciante está com a porta aberta e em condição de manter investimentos em comunicação”, explicou Queiroz, que também é CEO do Grupo Duca, controlador da rede de agências Ampla, que tem 140 pessoas na sua folha de pagamento. “Reduzimos em abril 25% de jornada e salário. Vamos tomar decisões a cada 30 dias.”
Na opinião de Luiz Fernando Musa, CEO da Ogilvy Brasil, o controle dos custos está no foco, “mas não podemos quantificar as nossas receitas”, resumiu o executivo.
“Estamos avaliando todas as possibilidades, mas com amparo legal. Seguindo o protocolo global do WPP, o board teve seus honorários reduzidos. A MP pode ser usada, sim, assim como férias, redução de jornada etc. Não é hora de ‘gourmetizar’, mas de ver os impactos ao longo do ano. O momento é turbulento e grave para todos. O que eu prego é que é a hora de o ecossistema formado por agências, veículos e clientes encontrar maneiras para construir pontes para sairmos de maneira saudável para quando tudo isso chegar ao fim”, acrescentou Musa.
O principal impacto nas receitas do mercado publicitário não será no primeiro trimestre. Por exemplo, o Interpublic (FCB, McCann, Mullen Lowe e R/GA) anotou faturamento global de janeitro a março de US$ 1,9 bilhão e US$ 4,7 milhões de receita positiva. A brasileira WMcCann, de acordo com o chairman e CEO Hugo Rodrigues, iniciou quarentena no dia 13 de março e afirma que seu salário foi reduzido em 25% neste mês de abril. Os vice-presidentes terão redução de 15%.
“Não sacrificamos o salário de ninguém em março. A primeira medida em abril foi cortar o salário de 25% da presidência e 15% das vice-presidências. Nosso objetivo é evitar o máximo que conseguirmos que qualquer desconto chegue para as linhas abaixo da diretoria. E ainda estamos na vice-presidência. Ou seja, temos algum espaço. Mesmo sendo impactados com reduções de clientes, estamos assumindo as perdas sem impactar os funcionários. E faremos isso enquanto conseguirmos”, afirmou Rodrigues.
A preservação dos empregos é a intenção da Leo Burnett Tailor Made, como informa o co-CEO e COO Marcio Toscani. “Aderir à MP está no leque de opções. Está em análise, porque ela nos ajuda na preservação dos postos de trabalho. Primeiro estamos renegociando valores de custos fixos, como aluguel, serviços e fornecedores. O custo é certo, mas a receita é volátil. Vamos ver daqui a seis meses como será o chamado novo normal. Eu acho que o comportamento humano vai mudar. Não dá para achar que depois de tantos dias trancados em casa as coisas serão exatamente as mesmas. A pergunta é: como as pessoas vão se relacionar com marcas e produtos após a crise?”, questionou Toscani.
A ID\TBWA não promoveu cortes e redução dos vencimentos do seu time em abril, como esclarece a CEO Camila Costa.
“Contudo, a partir de maio, tomamos a decisão de reduzir por três meses o salário da presidência e da diretoria executiva. Foi uma decisão tomada em conjunto por mim e pelos diretores para preservar até o limite os nossos talentos. Estamos atentos aos movimentos do mercado, dos clientes e temos um grupo estudando a MP 936, preparando cenários que podem ser ativados, caso necessário. Nossa atividade não é tão ‘matemática’, diferentemente de outros setores e tipos de serviços em que talvez reduzir a jornada seja menos complexo. Não temos como garantir uma equalização de demanda em todas as áreas e nem prever em que dias os clientes precisarão mais ou menos de nós. Pelo contrário, em vários casos estamos trabalhando ainda mais para garantir melhores resultados para as marcas que atendemos.”
Apesar de as agências terem optado por demissões, decisão não assumida formalmente, a preservação de empregos é recorrente. Pedro Reiss, CEO da Wunderman Thompson, observa que o custo para reorganizar equipes será maior do que não demitir e fazer uso da MP.
“Não estamos olhando como primeiro recurso”, ponderou Reiss.” Ele diz mais: “o custo da folha é alto. Nosso maior ativo são os profissionais. O que cria valor é o time. Entendo que alguns setores, como restaurantes, que perderam tudo, precisem se utilizar de medidas como cortes e redução. Mas a publicidade tem oportunidades. Temos de rever planos e escopo. Estamos muito ativos com Avon, Netflix, Heineken e Vivo. Temos de rever planos. Mas há novas oportunidaes”, destacou Reiss.
André Gomes, CEO da MullenLowe Brasil, ressalta que toda a indústria está pressionada pela pandemia. “Algumas marcas que atendemos estão bem ativas no momento, outras em stand by. Existem várias campanhas previstas pós-Covid-19, todas só esperando por um sinal verde. Mas toda e qualquer definição está atrelada a um futuro ainda incerto.”