“Senhores senadores, senhores deputados. Está mais do que na hora de eu dar um fim à sua permanência neste lugar, o qual vocês desonram com seu desrespeito pela virtude e maculam praticando todos os vícios. Vocês são um bando inimigo do bom governo. Vocês são um bando de miseráveis mercenários e, como Esaú, venderiam seus pais por uma gororoba e, como Judas, trairiam seu Deus em troca de algumas moedas.
Ainda sobrou sequer uma virtude entre vocês? Há algum vício que vocês não tenham? Vocês são tão religiosos quanto meu cavalo. O ouro é seu Deus. Qual de vocês ainda não foi subornado? Há alguém entre vocês que tenha um mínimo de zelo pelo país? Não foram vocês que macularam este lugar e o transformaram num covil de ladrões por suas práticas iníquas?
Vocês se tornaram odiosos para a Nação. Vocês foram colocados aqui pelo povo e se tornaram a maior razão para desgostos. Seu país apelou para mim para limpar neste estábulo de Águias, colocando um ponto-final em seus procedimentos iníquos e, com a ajuda de Deus e a força que Ele me deu, é isso que vou fazer.
Eu lhes ordeno que saiam imediatamente deste lugar. Saiam! Se apressem! Seus venais, deem o fora. Tirem essas porcarias cintilantes que vocês usam, saiam e fechem as portas. Em nome de Deus! Retirem-se”
Esse discurso, que parece inventado agora por mim, destinado aos frequentadores de uma determinada casa de leis neste país e nesta época, não tem uma única palavra de ficção. É o discurso de Oliver Cromwell, nascido em quando dissolveu, no grito, a Câmara dos Comuns do Império Britânico, em 1653. Na verdade, ele se sentia falando em nome do povo britânico, que já não suportava mais os falsos religiosos, os mercadores de leis, os demagogos populistas, os corruptos de várias espécies que se acastelaram na Câmara e falavam em nome da Pátria e de Deus. O parlamento foi efetivamente dissolvido e Cromwell montou um Conselho chamado de Parlamento dos “Santos”, constituído de oficiais militares e heróis da pátria. A si mesmo reservou, modestamente, o título de Lorde Protetor Perpétuo da Inglaterra, País de Gales, Escócia e Irlanda.
Declarou nessa ocasião não acreditar que pudesse haver na Comunidade Britânica alguém mais temente a Deus e voltado para os interesses do povo do que ele. Morreu em 1658, não se sabe direito se de malária ou envenenado, pois à época não havia tecnologia confiável para as autópsias. Seu filho o sucedeu, mas não tinha o mesmo carisma e acabou deposto sete meses depois de eleito. O novo parlamento resolveu restaurar a monarquia e Carlos II assumiu o trono. Em 1660, por ordem do rei, o corpo de Cromwell foi retirado da sepultura e enforcado. A cabeça ficou um dia em exposição, como parte das comemorações do 12º aniversário da morte de Carlos I, até que um guarda levou-a para casa. Em 1814 a cabeça foi vendida como objeto de decoração e só em 1960 recebeu novamente um túmulo. Uma das iniciativas mais polêmicas de Cromwell foi criar o Novo Modelo de Exército (New ModelArmy) que – ao contrário dos antigos exércitos medievais – possuía comitês para que todos os militares pudessem participar das decisões, inclusive os soldados rasos. Fica fácil entender por que, com a restauração do reinado, foi preciso enforcá-lo outra vez.
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O Instituto Moreira Sales edita a revista Serrote (“Para abrir cabeças”), dirigida pelo brilhante Paulo Roberto Pires. Durante a Flip fez circular um número especial dedicado a Ana Cristina Cesar, a homenageada deste ano. Foi na Serrote que eu li um poema de Emily Dickinson, traduzido pela Ana Cristina, que é tudo que eu queria, se tivesse talento, ter escrito sobre o que é um livro. “Não há fragata igual a um livro, que daqui/Nos distancie./Nem Corcel que galope mais que um Verso/De poesia./ Não custa Pedágio ao pobre/Essa Travessia./Frugal é o Carro que nos leva/Nesta Via”.
Lula Vieira é publicitário, diretor da Mesa Consultoria de Comunicação, radialista, escritor, editor e professor