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 O ser humano é um eterno insatisfeito. Quem é mais novo talvez nem saiba, mas, no início da internet em meados dos 90, o grande poder de armazenamento móvel que tínhamos era um disco flexível (que, na verdade, ficava dentro de uma embalagem bem rígida) de incríveis 1.44 megabytes de capacidade. Sim, não cabe nem um mp3 do Ramones nesse espaço. Era o que tínhamos para transportar dados de um lado para outro. Se faziam malabarismos para transportar, por exemplo, os dados de instalação de um software. Copiavam-se os dados espalhados entre 10, 20 disquetes para atender ao espaço dos arquivos de instalação. E, geralmente, lá pelo penúltimo disquete (era o nome popular do bicho), os dados estavam corrompidos e era preciso começar tudo de novo. Num processo tão rápido como a internet da época. 

Os anos passaram e a capacidade de armazenamento móvel foi aumentando. Começamos gravando CDs. Quem aqui não teve aquela caixinha de 50 CDs virgens em casa? Zip drives, pen drives, hd externos. O início da “revolução digital” foi pautado em acumular. Começamos a tirar fotos digitais de tudo e jogar esses arquivos em backups. E que seguem guardados, esquecidos em alguma gaveta. Nossas bibliotecas de mp3 eram maiores que o acervo de rádios. Ficou fácil e barato guardar. Passamos, então, a guardar esses momentos em Fotologs, Flickr, Orkut, Youtube, Facebook, Instagram. Passamos a hiperdocumentar memórias e arquivos em quantidades muito maiores do que nossa memória (a cerebral mesmo) se encarrega de fazer.  

E quando fica muito barato termos todo esse potencial de armazenamento e processamento em nossas mãos, o que fazemos? Desapegamos. Os softwares estão na nuvem. As músicas estão no Spotify. Os filmes estão no Netflix. As informações na Wikipedia. Não precisamos mais acumular. O que importa é acessar. Uma conexão rápida com a internet é mais útil que um HD de 100 petabytes. 

Beleza, mas e o registro de nossas vidas, como faz? O mesmo: desapega. Quem vem nos ensinando isso é o Snapchat. O aplicativo de troca de mensagens em foto e vídeo mantém os conteúdos disponíveis por, no máximo, 24 horas. Vai de encontro ao movimento da hiperdocumentação e propõe um approach de conversa.  Uma conversa mais de botequim. Sem pretensões, já que ninguém precisa aprovar com uma curtida ou comentário. Despida de filtros (que não os de zoeira). Despida de roupa até, já que o que está ali é pra ser armazenado em definitivo em apenas um único lugar: nossa memória.

O Snapchat cresce em popularidade não só por essa proposta descompromissada, mas porque demanda um dos bens mais escassos hoje em dia: nossa atenção. Como tudo ali é efêmero, precisamos estar 100% focados em assistir ao que vai ser dito, o que vai ser mostrado. Trocamos o movimento mecânico dos dedos “rolagem-joinha”, por olhos e ouvidos atentos e curiosos no que está por vir. Uma relação mais genuína, pra quem já cansou da idealização das redes sociais. Vai substituir o Facebook? Impossível saber. Ou alguém se arrisca a querer entender esses eternos insatisfeitos?

*Tiago Ritter é CEO da W3haus