Alê Oliveira

O Brasil acaba de sair de um processo eleitoral muito difícil, com as pesquisas apontando em direção oposta ao PT, embora sob pequenas margens de diferenças.

De há muito não víamos um quadro parecido, o que reforçava a ideia de derrota do Partido dos Trabalhadores, que para os seus eleitores tinha como causa a manutenção do líder Lula da Silva na prisão, cumprindo longa pena.

Houve outros fatos que podem justificar a derrota de Haddad e para nós um dos mais fortes foi a decisão de tirar o vermelho no segundo turno, desnaturando o ideário ideológico do partido.

Mudanças drásticas como essa, em meio a uma eleição, costumam surtir efeito contrário, reforçando a tese de combate da oposição.

Mas, é claro que a ausência de Lula nas ruas e a retirada da cor vermelha da propaganda eleitoral de Haddad poderiam não atrapalhar o candidato Haddad – por si só um bom quadro para o partido.

Houve para nós uma insistência ideológica contrária aos valores democráticos, tornando a repetição da palavra democracia na campanha de Haddad uma contradição.

Boa parte do eleitorado jovem preferiu ficar com Haddad, mas eleitores que já passaram dos 35 anos guardam lembranças de regimes autoritários e fechados, como a extinta URSS, que na sua disputa ombro a ombro com os Estados Unidos, nas primazias científicas e nas humanas em geral perdeu no médio prazo, embora tendo saído à frente em alguns segmentos de importância científica e publicitária, como o lançamento do primeiro satélite artificial, o Sputnik.

Para a juventude da época, contrária ao fantástico apelo do rock and roll, o gol da Academia Soviética de Ciências seria o precursor da vitória do socialismo no planeta.

Os norte-americanos perceberam a vantagem adversária e lançaram-se a fundo no mesmo campo da conquista espacial, com dolorosas derrotas no início, mas finalmente alcançando a dianteira em curto espaço de tempo.

Mesmo o Sputnik 2, com a cadelinha Laika e mais tarde o feito com o astronauta diplomata Yuri Gagarin não conseguiram manter por muito tempo a supremacia soviética.

Quando surgiu Gorbatchev, entendendo que o bloco soviético estava prestes a se esfacelar por se constituir em várias nações cooptadas pela Rússia para formar a URSS, aproveitando a derrota de Hitler na Segunda Guerra Mundial, o campo esquerdista do planeta passou a raciocinar mais à direita, entendendo que o capitalismo estava mais próximo das aspirações humanas.

Não foi fácil para Gorbatchev convencer parceiros fortes como a China comunista e os pequenos órfãos adotados e rebeldes como Cuba, onde reinava o sonho igualitário, com seus custos debitados à pátria-mãe.

Com a glasnost (“transparência”), o então líder soviético procurou impor uma renovação na vida pública soviética, enfraquecendo os rebeldes internos e externos que desejavam pôr fogo no mundo capitalista. Aos poucos, porém, foram entendendo que o caminho, longe de ser belicoso, deveria seguir em direção à paz e ao entendimento entre as nações e seus habitantes, abandonando a política armamentista que poderia explodir o planeta.

Tanto um lado como o outro gostavam de repetir a contabilidade da Segunda Guerra Mundial, que, se possibilitou a queda de Hitler, causou por outro lado a perda mais gigantesca de vidas da história da humanidade.

Trazendo o pensamento de esquerda para o Brasil e outros países em desenvolvimento ou ainda menos que isso, alguns líderes carismáticos apoiaram-se nesse canto da sereia e conseguiram com isso convencer boa parte das suas populações de que o relógio do tempo deveria novamente ser atrasado.

Sem dúvida, havia um pouco de sinceridade deles nisso, mas muito da vontade de se apropriar por longo tempo desses países, tornando-os prisioneiros de um futuro que não chegaria nunca.

Um a um foram caindo os que haviam se perfilado à esquerda, sem deixar de servir de exemplo (que um dia daria certo) para outros em situações de desenvolvimento ainda difíceis.

O Brasil caiu nessa armadilha, mais por falta de uma forte decisão dos militares que tomaram o poder em 1964, do que propriamente pela vontade do seu povo, que nunca formou maioria a favor das esquerdas.

Tivessem os dois primeiros presidentes militares, após 64, celebrado entre eles e com o maior número possível de oficiais superiores, que não vieram para ficar e que a missão de evitar a vitória do socialismo em nosso país (era essa a bandeira propagada pelas esquerdas) estava exaurida, muito provavelmente não teríamos tantos abalos até a conciliação final entre militares e civis.

Mas a História não é o que a gente deseja que fosse, mas o que é (foi) realmente. E uma das suas lições permanentes é a de que regimes de força não resistem por largo tempo em nosso país, nem mesmo os que não têm tanta força assim, mas fingem o contrário.

Estamos agora verificando uma vez mais que não se impõem, de cima para baixo, políticas públicas engendradas por minorias, que na verdade usam alguns fanáticos ingênuos para distribuir suas ideias que na verdade não têm. O que mais querem por detrás desse biombo é o poder, nele permanecer o maior tempo possível, o tempo suficiente para arrebentar o erário e a contabilidade de grandes empreendimentos empresariais, que sabem descarregar esses prejuízos sobre a população.

Até que um dia abrem-se as urnas e aqueles milhões de vontades que elas revelam têm a força de um colossal BASTA, que levado a sério mudará uma vez mais o decurso da História.

 

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Este Editorial é em homenagem ao povo brasileiro, que, em sua maioria absoluta, pressionou o botão do basta nas urnas eletrônicas do segundo turno espalhadas pelo país.

Aos que não o fizeram, e também foram milhões, que procurem entender mais com a razão do que com a paixão as determinantes desse resultado final.

Também é uma homenagem a todos os que gritam por democracia, sabendo o seu significado.

Armando Ferrentini é presidente da Editora Referência, que publica o PROPMARK e as revistas Marketing e Propaganda (aferrentini@editorareferencia.com.br).