Ferrentini: "E a Sabesp, aqui em São Paulo, que descarta a arma poderosa da propaganda para manter a população em alerta para a economia da água"

1. O próprio governo, que na economia deu uma guinada à direita, reclama da queda na sua arrecadação. Como arrecadar mais se o ajuste desajustou o setor produtivo do país?

Pior é que, apesar da “surpresa” manifestada por algumas autoridades diante do fato, o garrote vil prossegue apertando empreendedores e trabalhadores, livrando-se do torniquete apenas o próprio governo, que ingenuamente – para dizermos o mínimo – se queixa da diminuição de recursos.

Talvez não saibam, mas a falta de atitude para diminuir o custo da máquina estatal tornará as coisas ainda piores. O aumento em meio ponto percentual da taxa Selic, anunciado no último dia 29, só vai contribuir para o aumento do arrocho.

O que mais nos surpreende é a pressa na aplicação do ajuste, com medidas de economia de guerra adotadas seguidamente sobre a população brasileira, sempre com o cuidado de se preservar as hostes do governo.

Já dissemos aqui – e reafirmamos – que o Brasil, provavelmente mais cedo do que imaginamos, sairá dessa crise monumental em que foi jogado por uma série de irresponsabilidades oficiais. Porém, o que se vê é que isso pouco ocorrerá devido a decisões de governo e sim porque a população continuará trabalhando e consumindo e os empresários produzindo e investindo, embora todos com enormes sacrifícios.

2. Castigado pela recente decisão da Caixa Econômica Federal de reduzir a 50% do valor dos imóveis usados o financiamento para compra, o setor da construção civil e dos negócios imobiliários em geral encontrou forças na última semana para protestar contra a decisão do Governo do Estado de Minas Gerais, outorgando a Medalha da Inconfidência a João Pedro Stédile, do MST.

O setor fez publicar anúncio de meia página em jornais, repudiando a decisão de Fernando Pimentel, que lembra muito, embora em outro contexto, a condecoração de Che Guevara pelo então presidente da República, Jânio Quadros, em 1961.

Este já antigo episódio em muito contribuiu para a renúncia de Quadros. Se a História não se repete senão como farsa, é provável que no Brasil, onde não raro a lógica é contrariada, a cerimônia mineira do 21 de abril vá se juntar a tantas outras contradições, criando-se um caldo de contracultura avesso às tradições do país e ao pensamento da maioria dos seus habitantes.

3. O que se depreende de tudo isso é que nossos governos, em seus diversos escalões, estão agindo mais na superfície da política, criando seguidamente factóides para ocuparem os espaços mais valiosos da mídia, deixando de lado ações de profundidade que possam contribuir para a melhoria de vida do povo brasileiro.

Houvesse mais consideração por esse povo lutador e sofrido e, por certo, estaríamos todos desfrutando de uma condição de vida sempre prometida e muito pouco alcançada.

4. E a Sabesp, aqui em São Paulo, que descarta a arma poderosa da propaganda para manter a população em alerta para a economia da água, limitando-se a comparecer em espaços concedidos pelo jornalismo da mídia e dar um recado inconveniente sobre a gravidade da situação?

Estamos nos aproximando de mais um período de ausência de chuvas na região Sudeste do país e a Sabesp finge acreditar que nossos reservatórios darão conta do recado até a próxima estação das águas, que começa em outubro.

A empresa não pode ser culpada pela falta de chuvas no Sudeste, mas tem a obrigação de prosseguir sinalizando para a população que é possível viver consumindo bem menos água do que em épocas de fartura.

E isso tem de ser feito por meio da comunicação, com campanhas de peças publicitárias lembrando a todos que, ao contrário do que se pensa, o pior ainda não passou e até pode estar para chegar.

Mas, assim como dissemos na abertura deste editorial, seus responsáveis preferem se queixar da queda de receita, algo extremamente previsível quando o produto que se oferece à população escasseia.

A companhia já recorreu ao tradicional aumento das tarifas, o que não deve ter resultado no saneamento das suas finanças, pois até uma criança minimamente instruída é capaz de deduzir que não se faz churrasco sem carne.

Este é mais um exemplo da ilógica oficial brasileira.

Falemos agora de coisas boas:

5. A noite de sábado, 25/4, foi especial para os brasileiros, que puderam assistir a um “revival” de duas horas contendo em sequência fragmentos da programação da emissora líder da mídia brasileira.

Tratou-se de um grande show de lembranças e emoções, mas sobretudo de uma admirável competência para atravessar o futuro inovando, com uma qualidade cada vez melhor em todos os sentidos.

A TV Globo é um exemplo vivo de como o Brasil pode funcionar bem quando se tem vontade, talento e competência.

6. Vem aí mais um Festival de Gramado, o 20º da série que reúne no Sul do país boa parte da sua população publicitária em meio a centenas de estudantes de comunicação que acreditam nesse ideal da humanidade.

A abertura do Festival de Publicidade de Gramado deste ano será na manhã de 11 de junho, com palestra de Roberto Duailibi, sócio-fundador da DPZ, sobre o sempre instigante tema da Liberdade de Expressão, que não se esgota nunca, pois sempre haverá interessados em cerceá-la em proveito próprio, embora jamais confessem.

Ainda no cardápio de abertura, uma homenagem especial do Festival aos 50 anos do propmark.

*Título do livro de Emil Farhat, que presidiu a McCann brasileira nos anos 1970/1980, editado por T.A. Queiroz. O autor abre a obra com uma explicação: “O vira-bosta assume o palco. Em flagrantes individualizados, outros autores e críticos sociais já haviam entrevisto o perfil do vira-bosta, numa ou noutra personalidade da nossa vida pública. Concomitantemente, em incessantes análises dos fatos do cotidiano, vínhamos percebendo que se torna galopante, e cada vez mais atrevida, a expansão nacional do parasitismo – exatamente o comportamento que, na escala ornitológica, caracteriza o vira-bosta, também conhecido como chupim. Essa acelerada dimensão da presença do vira-bosta extrapola os anátemas individuais e isolados, para tornar-se símbolo de grave preocupação nacional”.

Nota do propmark: o livro foi lançado em 1986.

*Presidente da Editora Referência, que edita o jornal propmark e as revistas Propaganda e Marketing