Aos 13 anos, Eduardo Lorenzi talvez não soubesse, mas em vez dos quatro famosos Ps do marketing, ele seguiria nesse caminho por cinco: produto, preço, praça e promoção e… pai. “Ele disse: ‘Meu trabalho é gerir essas quatro variáveis’. E eu fiquei fascinado”, lembra.
A explicação ouvida no início da adolescência nunca mais saiu de sua cabeça. No entanto, sua ideia de trabalhar com publicidade era concentrada na criação e ele direcionou seus estudos para isso até encontrar o primeiro estágio.
“E aí me dei conta que não gostava de criação. Queria ficar sabendo tanta coisa, perguntava tudo, queria saber a lógica. Em vez de criar, ficava fazendo perguntas. No último ano de faculdade me caiu a ficha que eu poderia trabalhar em planejamento. Envolve toda a parte estratégica, mas também a criativa”, conta.
Pesquisando sobre onde começar em planejamento ele chegou à Talent Marcel e seu Julio Ribeiro. “‘Você entende algo de planejamento?’ Não. ‘E de pesquisas?’ Não. ‘Tá contratado, quero alguém sem vícios’”, lembra sobre a entrevista com o fundador da agência.
Hoje, aos 45 anos, Lorenzi tem mais da metade de sua vida na área de planejamento em agências. Foram nove anos na Talent Marcel, dez na Neogama/BBH e cinco na Publicis.
Os dois últimos foram na liderança da casa: primeiro como copresidente ao lado de Miriam Shirley, e o segundo como CEO. O novo marco completa um ano dia 4 de fevereiro, e comporta uma série de transformações. “Nesse último ano promovemos mudanças. Analisamos uma série de coisas que precisávamos fazer para continuar crescendo e evoluindo, e isso nos levou a trocar três lideranças: trouxemos Maurício Almeida para a mídia, que tem uma postura mais digital; em tecnologia trouxemos Márcio Bueno como diretor da área, com postura mais próxima e proativa para ajudar na transformação; e em RTV trouxemos Roberta Sayão, com uma visão de produção mais abrangente.”
Entre os desafios, o executivo destaca trabalhar em um processo diferente e cuidar da produtividade e organização. “Colocamos a disciplina de gerência de projetos, que era só para produção de peças digitais, na coordenação dos processos da agência como um todo. Fundimos isso com o atendimento. O atendimento hoje na Publicis é de forma crescente mais de gerência de projetos”, exemplifica.
Lorenzi afirma que é difícil mexer em modelo de negócios e afirma que na Publicis Brasil está havendo uma transformação profunda.
De acordo com ele, nos últimos anos, a agência tem crescido muito com a diversificação de projetos, com intensificação da atuação de digital, e que um ranking como o do Ibope (que considera a compra de mídia) não reflete a realidade do que é a Publicis atualmente. “Chegamos a ser 3º e de um ano para o outro caímos para 8º. Só que, ao mesmo tempo que aconteceu isso, a agência cresceu. Mas como? Em outros projetos que não necessariamente têm a ver com compra de mídia. O pensamento de mídia é muito maior. No fundo, quanto mais a gente continuar nessa estrada, mais a gente vai cair no ranking. É uma escolha consciente”, diz.
Ainda assim a agência segue entre as 10 maiores e forte na compra de mídia offline. Entre os outros trabalhos desenvolvidos recentemente a agência realizou uma consultoria de branding, evento de Carnaval, campanhas apenas para redes sociais e troféu para a Fórmula 1, por exemplo.
O executivo defende a necessidade de buscar outros modelos de receita para continuar crescendo. “Basear-se só em compra de mídia não é algo sustentável. A necessidade do cliente passa por outras coisas. Requer mais skills. A visão criativa é de criar histórias, experiências e inovação, é mais abrangente. Pode ser um comercial, um conteúdo, um serviço, um app. Agência boa é a que compra muita mídia? Isso está mudando.”
Outra coisa que tem acontecido na agência é o crescimento de profissionais com background e expertise no digital. “Temos feito um movimento silencioso. Há um turnover relativamente alto nas agências. Temos aproveitado para contratar pessoas que vêm de agências ou empresas digitais. Cerca de 40% da Publicis já foi de algum local digital.”
Além das mudanças do dia a a dia, o profissional é enfático ao dizer que não há mais espaço para práticas que eram até glamourizadas, como virar a noite trabalhando. “Eu não tenho orgulho nenhum nisso. Há processos para resolver tudo no horário. Em algum grau pode haver emergências, mas temos trabalhado para dar qualidade de vida para todos”, diz.
CRIATIVIDADE COMO RAZÃO
Lorenzi avalia que, por mais que dados e tecnologia sejam muito valorizados e estejam presentes no trabalho das agências, o pilar de cratividade não perdeu importância. “A Publicis sempre falou muito de criatividade e agora tem destacado a consolidação do braço tecnológico. Da mesma forma que a Accenture, por exemplo, comprou a Droga5. Nada disso significa que a criatividade perdeu a importância. Ela é nossa razão de ser.”
Um dos destaques de 2019 foi a campanha Brilhe do Seu Jeito, para o Bradesco. A animação em 3D produzida pela Zombie Studios tem protagonista com síndrome de Down e emocionou internautas em todo
o Brasil.
O filme continua a fábula iniciada em 2018, mas com foco maior na diversidade. A estreia teve como estratégia uma veiculação simultânea na TV aberta e fechada, além de digital. “Por exemplo, a mídia que historicamente entrava no fim do processo, hoje é a primeira. Ela que define o que a criação vai criar, ela que define canais e formatos, tudo isso com uma visão estratégica o tempo todo”, comenta.
Ele conta que agência e banco receberam muitas mensagens positivas, especialmente de pais que gostaram da campanha. “Houve uma reação muito forte e positiva pelo lado da inclusão, que é a bandeira do Bradesco desde sempre. Não podemos esquecer que o Bradesco foi o banco que abria a conta para os trabalhadores das fazendas, não só para os fazendeiros, e para os japoneses que vinham para o Brasil e não falavam português. Isso expressa um valor muito forte da organização”, diz.
Outro trabalho destacado no ano foi a campanha de Leite Ninho para o Dia das Mães. Crianças cantam os versos da música Because You Loved Me, famosa na voz da cantora Celine Dion.
Para ele, a repercussão da campanha tem muito a ver com a inspiração dela: relatos cotidianos, mas extremamente poderosos. “Essa campanha foi bem não só porque é bonita e emociona, mas ela toca em questões da maternidade contemporânea. Ela falou com tanta gente porque muitas mães passam por esse tipo de situação ou conhecem alguém”, conta.
OTIMISMO
Otimista com 2020, ele conta que o ano começou mais aquecido do que 2019. A agência está envolvida em algumas concorrências grandes. Mesmo sem abrir números ele é categórico: vai crescer. “Para este ano muito do discurso de cautela está dando lugar a um discurso mais otimista. Existia um certo otimismo sobre renovação política, mas acabou gerando insegurança, o que trava investimentos. Mas sinto que a visão este ano é a de que é esse governo que vamos ter, então temos de nos mexer. Vamos fazer o nosso”, diz.
OS PS DA PROFISSÃO
Buscando acompanhar as mudanças da sociedade, há alguns anos a agência tem feito iniciativas para promover diversidade. O primeiro movimento foi para buscar igualdade de gênero. Os esforços também miram aumentar a diversidade de racial. “Temos consciência de que falta muito, mas estamos trabalhando firme para isso.”
Se hoje Lorenzi tivesse de responder à mesma pergunta que fez ao seu pai lá atrás, a resposta teria outro “P” e muitas outras letrinhas. Para ele, a resposta naquela época era muito mais objetiva.
Embora as variáveis ainda estejam presentes, ele avalia que hoje a questão de orientar a carreira de alguém é muito mais profunda, porque há uma discussão muito grande sobre outra importante palavra que começa com P: propósito. “Por que venho até aqui o dia inteiro? Por que fazer isso? Trabalhar para ganhar dinheiro não convence ninguém”, diz.
Ele conta que hoje falaria mais sobre a questão filosófica de trabalhar em uma agência: aprender sobre a cultura e comportamento das pessoas, entender de gente. “Falaria sobre criar projetos que mudam a história de uma marca e ajudam as pessoas. Se a pessoa gostar dessa parte, vamos aprender a parte prática, que é bem mais complexa.”