Zeitgeist é um termo alemão, cuja tradução pode ser “espírito da época, espírito do tempo ou sinal dos tempos”. O Zeitgeist significa, portanto, as características genéricas de um determinado período de tempo, que são expressadas pelas manifestações intelectuais e culturais do mundo, numa certa época.
O termo foi cunhado por filósofos alemães muito tempo atrás, lá pelo século 18, como tradução de Genius Saeculli (do Latim: Espírito guardião do século). Séculos depois, o termo foi resgatado e entrou em moda, sendo tema de filme, livros e estudos.
O que me faz resgatar essa expressão e usá-la como tema deste artigo é a observação da busca desesperada de colegas do mercado de marketing e comunicação em tentar identificar e decodificar os sinais marcantes desses nossos tempos.
Mais de 1.300 brasileiros estiveram (ou ainda estão) em Austin, Texas, EUA, para acompanhar mais uma edição do SXSW (South by Southwest). A presença brasileira vem crescendo no evento. No ano passado, foram mais de 1.200 (o dobro dos presentes ano anterior).
Este ano, curiosamente, o Brasil disputa, com os alemães e os japoneses, a posição de maior delegação estrangeira do SXSW. Ainda não estive por lá, mas acompanho atentamente o relato dos que já participaram. De uma maneira geral, o que se percebe é um mix de deslumbramento e frustração. Em dez dias de evento acontecem mais de 6 mil “coisas” em Austin. De palestras a mostras, de shows a workshops, a busca pelo que há de mais relevante no festival é inglória.
Teve gente que voltou de lá muito frustrado por não conseguir observar um conjunto de manifestações minimamente organizado para gerar insights produtivos. “É um monte de coisa, que você esbarra por todos os lados, explicitando uma ausência de curadoria mais apurada”, me disse um desses marinheiros de primeira viagem por lá.
Mas a questão é: será que, para que possamos captar o “espírito do tempo”, não é necessário esse caos mesmo? Uma curadoria mais severa, por mais que fosse feita por um time liberal, descondicionado e competente, talvez estabelecesse um filtro que refletiria a visão de um tempo sob a ótica de alguns, não de todos.
Esse é o problema das filter bubbles, bolhas geradas por algoritmos que insistem em agrupar pessoas por interesses previamente identificados.
Como vamos conseguir visibilidade do novo, do inusitado, do diferente do meu universo, se existem mecanismos empenhados em “esconder” essas manifestações de nós?
Tem muita gente tirando conclusões precipitadas pela mera observação do “seu” universo, ignorando outros “mundos”, talvez mais relevantes e significativos.
Eu me lembro do tempo em que fui sócio de agência e me deparava com clientes que insistiam em ver refletido o “seu” mundo em campanhas dirigidas a um público pertencente a um ambiente totalmente diferente.
Houve uma situação em que a minha agência estava propondo uma degustação de bebida em restaurantes, na hora do aperitivo do almoço de fim de semana, entre 12h e 13h. A resposta do cliente: “Mas essa hora está todo mundo jogando golfe!”. Pois é… para ele essa era uma verdade absoluta.
Temos de lidar com o paradoxo dos nossos tempos: por um lado, temos condições de vislumbrar um conjunto amplo de manifestações artísticas e culturais por intermédio das redes sociais, o que poderia facilitar a percepção do Zeitgeist da sociedade contemporânea.
Por outro lado, porém, os filtros dessas mesmas redes sociais insistem em só nos entregar mais do mesmo, daquele nosso mundinho preso numa bolha, nos privando de manifestações disruptivas, que afrontem nossos preceitos e valores preestabelecidos.
E o pior é que a identificação assertiva do nosso Zeitgeist é condição básica para a criação de conceitos e caminhos de comunicação que façam sentido para nossos públicos-alvo. Que coisa difícil, não?
Alexis Thuller Pagliarini é superintendente da Fenapro (Federação Nacional de Agências de Propaganda) alexis@fenapro.org.br
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