GAD’ desenvolveu projeto de rebranding dos postos Petrobras, da estratégia ao design, para entregar experiência (Divulgação)

Design é arte. E negócios. Pelo aspecto artístico, o Brasil tem nomes inspiradores entre os quais especialistas em
mobiliário como José Zanini Caldas, os Irmãos Campana e Sérgio Rodrigues.
Mas, pelo lado empresarial, essa disciplina passou a integrar a pauta do C’levels devido à sua importância estratégica, não mais apenas com o valor estético da embalagem dos produtos. Mas como algo que o executivo Luciano Deos, CEO e fundador do GAD’, uma branding design consulting, define como interface de user experience, serviços, tecnologia, branding, entrega e, sobretudo, “colocar o usuário no centro para soluções geradoras de conexão com as marcas”.
As principais transformações, como enfatiza Deos, têm influência direta de marcas que apostaram em novas formas de ver o design para além do umbigo e das limitações das plantas industriais. Ele cita a Nike como a mais disruptiva nesse sentido.

O executivo Luciano Deos comanda a consultoria de branding design GAD’ (Divulgação)


“Eles chegaram à conclusão de que não precisavam ter fábricas. Esse atributo poderia ser terceirizado. O mercado definiu como ‘fenômeno Nike’ essa quebra de visão de negócios ao concentrar suas energias em gestão de marca. É o olhar estratégico do design”, argumenta Deos, que cita Apple como “outro ótimo exemplo” disruptivo. Assim como Coca-Cola, Procter & Gamble, Ikea, Natura, Itaú e Nubank. “Estão entre as protagonistas do chamado design thinking, contraponto ao ideário do design industrial que permeou tanto as escolas artísticas e comerciais”, prossegue Deos.
Essa linha de pensamento ganhou corpo com a empresa norte-americana Ideo por meio de Tom Kelley, formado em design pela Stanford University, que foi contemporâneo de Steve Jobs, autor da frase “Design não é apenas o que parece e o que se sente. Design é como funciona”. Deos fala que Kelley foi revolucionário porque percebeu que a metodologia de pensamento era a solução de problemas e inovação com base em observação permanente do ecossistema global de produtos e aderência ao consumidor.
“Há duas décadas Kelley percebeu que com o efeito China os produtos ficaram muito parecidos e comoditizados. Como estabelecer diferenciação? Considerando o design como ativo e, como tal, entender que a prestação de serviço e valor agregado deveriam ser as prioridades das marcas. É nessa hora que os principais executivos começam a abraçar a causa do design como estratégica e fundamental para o sucesso da gestão de negócios. Não se limita mais ao universo estético. É a transformação do insumo em design de serviços. Primeiro vem a farinha, o bolo e só depois a confeitaria. Isso significa deixar a ótica da engenharia e da operação. Com o pensamento de design busca soluções para agregar valor aos serviços”, observa Deos, que presidiu a Abedesign, foi jurado e presidente do júri da competição de Design do Cannes Lions.
Os vários steps da evolução do design permitem que temas como sustentabilidade marcassem presença na sua essência. A busca por materiais reaproveitáveis tornou-se tônica para muitas marcas, especialmente as de alumínio. E assumir compromissos e causas. Na era digital, as grandes empresas de tecnologia, como Google e Facebook, nas palavras de Deos, têm no seu discurso o conceito de user experience.
“Apesar de todo o aparato da tecnologia e seus apelos, como os aplicativos de mobilidade e delivery, não se pode negar os legados. Design é uma trajetória de longo prazo. As embalagens estão sempre se remodelando. O que não tem mais aderência é promessa não cumprida. O Nubank não é só o roxinho, assim como o Itaú não é só a cor laranja. O Nubank promete uma experiência com serviços ágeis e muito fáceis. Já o Itaú iniciou o olhar para o design para ser mais digital. Ou seja, não é mais desenhar agências e talões de cheque. Muitas empresas formalizaram vice-presidências de design nos últimos anos”, pondera Deos.
A construção de valor de marcas icônicas requer a ideia de “faz e faça”, como explica Ana Couto, nome referencial na indústria de design de embalagem no país. Hoje sua agência propõe comunicação omnichannel como a campanha Filme é só o começo, para o Telecine.
“O design evoluiu para ser um instrumento de gestão. O consumidor questiona esse negócio de usar e jogar fora. A pergunta-chave é: o que uma marca oferece como proposta de valor? Estamos vivendo um momento de revisão de marcas. Posso citar UOL, Via e Ultragaz, essa última feita por nós. Tínhamos de considerar os 83 anos da marca para mostrar sua evolução para o mercado de energia. A tagline Somando energias resume a ressignificação da Ultragaz”, disse Ana.

Ana Couto destaca que “o design evoluiu para ser um instrumento de gestão.” (Divulgação)


Consideração, diferenciação, fidelização, território, experiência, propósito e serviços são algumas expressões que Ana usa para a transformação que o design busca. Que não pode ignorar redes sociais como o YouTube e as plataformas de e-commerce. Na opinião da CEO da agência, Ana Couto, o design estratégico entra “no funil inteiro”.
“Se alguém está fazendo uma compra online e sua experiência não é relevante, simplesmente não realiza o negócio. Design está na pauta dos CEOs porque é estratégico e não uma categoria. A Apple faz o quê? Computador? Celular? Relógio? Ela vende experiência. Não estamos mais falando de atualização de marca por um período. Mas impulsionar suas fortalezas. Quem não se reinventar, se manter relevante e não se mexer, vai dançar”, argumenta Ana, que em 2020 ganhou Ouro no Prêmio Abre com o case Guaraná Antarctica Natu, cujo plano era criar um novo mercado usando “códigos naturais e orgânicos” e linguagem “com elementos de brasilidade, que é um pé antropológico”.
Segundo Ana, as garagens da Apple, HP e Microsoft são bem conhecidas. “Elas são marcas icônicas porque estão sempre ressignificando seu futuro. Elas fazem e falam”, atesta Ana.
Outro profissional de destaque do design brasileiro que, assim como Ana e Deos, foi jurado do Design Lions, é Mario Narita, fundador e CEO da Narita Strategic Design. Em setembro de 2020 ele apresentou a pesquisa Hábitos de consumo e a relação com a embalagens durante a pandemia com oito insights “sobre qual será o protagonismo das embalagens, além de oportunidades em inovações em packaging design”.

Mario Narita: “Embalagem precisa gritar e dar posicionamento” para as marcas. (Divulgação)


Os indicadores são: 1) O logo e as cores são elementos mais importantes na hora da compra; 2) Imagens que ajudam a ilustrar o produto são bem-vindas; 3) Identificação de variantes de produto é ponto de atenção no e-commerce; 4) Redução de interação com as embalagens no PDV exige boa leitura de curta distância; 5) Informações sobre Covid-19 nas embalagens não são procuradas; 6) Formatos práticos e ergonômicos em produtos de limpeza; 7) Procura por embalagens que reforçam a segurança dos produtos; 8) Materiais de embalagem mais seguros para os consumidores.
“A conclusão é que embalagens brancas perdem visibilidade. Outro ponto é que o nome do produto e o que ele faz ajudam o consumidor a entender e a identificar o que precisa. Com as embalagens reduzidas no e-commerce, a identificação das variantes do produto exigem mais atenção. A compra pelo celular é, portanto, um desafio, porque a marca está exposta em uma tela de poucos centímetros. E plana. A embalagem precisa gritar e dar posicionamento. Por isso, a redução da interação das embalagens no PDV exige clareza e leitura em curta distância”, esmiúça o estudo de Narita.
Os vários aprendizados durante a pandemia permitem às empresas iniciativas ponderadas sobre a linguagem, color code e como posicionar produtos nas gôndolas. “O ideal é que seja fácil a identificação junto com os demais concorrentes. Estamos atendendo projetos para atender esse tipo de necessidade”, esclarece Narita, que ganhou na área Mercado o Prêmio Abre com o case Veja especialista relaunch, para seu cliente Reckitt Benckiser. O resultado foi que o market share de Veja teve incremento de nove pontos percentuais no segmento ‘cozinha’ e 10 em ‘banheiro’, em relação a 2019. Narita lembra que a agência também desenvolveu a ação Doe com Amor, para Veja, que reverteu parte de lucros a trabalhadoras domésticas.
Não é só nas agências especializadas que o design é fonte para destacar marcas. A BETC Havas teve destaque no Prêmio Abre de 2020 com o case HerShe, para a Hersheys, criado para o Dia Internacional da Mulher. A campanha deu ênfase aos pronomes ingleses Her (dela) e She (ela), percepção semiótica com elementos da marca.

Andrea Siqueira valoriza na BETC Havas profissionais de design. (Divulgação)


“A embalagem passou a ser mais um canal de comunicação entre a marca e o consumidor, principalmente em momentos de crise e restrições orçamentárias. A partir do momento em que enxergamos isso, a embalagem se transforma em um grande asset que pode ser mídia, PR e realidade aumentada e ocupar um espaço fundamental de uma comunicação direta com o seu público. Talvez essa história tenha começado lá nos anos 1980, quando embalagens de leite nos EUA traziam fotos de crianças desaparecidas. Mas foi nessa última década que esse protagonismo do design de embalagem ganhou mais expressão, trazendo causas e abrindo espaços para novas conversas. Lembro-me bem da primeira vez que fui ao Festival de Cannes e fui impactado pela campanha do chocolate romeno ROM, que através de uma interferência visual em sua embalagem conseguiu mobilizar um país”, observa André Batista, diretor de criação da BETC Havas.
“Design e respeito pelo craft estão no nosso DNA. E a melhor maneira de inspirar a equipe é trazer designers e perfis diferentes para ajudar no posicionamento das marcas, pois todos os pontos de contato são importantes: seja a embalagem, o tagline ou o site, tudo conta e diz muito sobre a marca”, finaliza Andrea Siqueira, VP de criação da BETC Havas.