Meus amigos costumam dizer que eu só tenho 12 histórias, 12 causos que eu conto e reconto incessantemente. Tipo os trabalhos de Hércules, que são ótimos, mas que não chegam ao décimo terceiro. Pilha da galera. Essas histórias são passagens da minha vida, principalmente da vida profissional.

Bem, estava no começo da minha carreira, aquela dificuldade em me firmar na profissão e as dúvidas comuns dessa época. Fazia faculdade de comunicação social, especialização em publicidade e propaganda. Carreira meio abstrata para o entendimento do meu pai, médico, que vivia confundindo minha profissão com a de propagandista de remédio e dizia que ia me ajudar na área, já que conhecia vários que iam sempre no seu consultório.

Cheguei a fazer estágio em comunicação na SMTU (Superintendência Municipal de Transportes Urbanos). Aquele tipo de estágio que aceita quem está fazendo comunicação, direito, filosofia, engenharia, música ou teologia.

Não sei se vocês já viram que dentro dos ônibus, pelo menos no Rio é assim, tem sempre uma plaquinha que diz “Em caso de reclamação, ligue para a SMTU”. Pois é. Eu era da SMTU. Resumindo a minha função no estágio: quando alguém reclamava que o ônibus da linha tal estava demorando a passar, eu ia lá conferir. Eu tinha de estar em algum lugar no trajeto e anotar o primeiro ônibus que passasse, geralmente umas 5 da manhã, esperar ele ir até o destino, voltar e passar de novo por onde eu estava, para ver a quantidade de carros na linha. Enfim, era superexcitante esse meu estágio.

Ah, eu também fazia blitz em pontos de táxi. Lacrei muito taxímetro. Delicinha.

Nessas idas e vindas, eu consegui um estágio na Artplan, com o filho da prima da tia de uma amiga da tia da minha mãe. Quase isso, né, Marcos Silveira?

Eu seria redator publicitário, finalmente. Nessa época, eu fazia comunicação de manhã, estágio na Artplan à tarde e comecei a fazer direito à noite, afinal, nunca se sabe, alguma coisa tinha de dar certo. E duas linhas n’água têm mais chance de fisgar um peixe que uma só.

E não é que a propaganda deu certo. Fui contratado. Comecei a receber um salariozinho razoável. E a primeira coisa que fiz foi comprar uma moto, pra facilitar o batidão. Não sei se era coisa de quem morava no subúrbio, mas eu tinha fixação em ter moto, ter carro. Os dois, então, seria um sonho!

Eu me senti o máximo comprando, em 1988, uma DT 180 82. Aliás, tenho ela até hoje, meu primeiro veículo. Tá reformada, zero bala. Tal qual Vital, era Rodolfo e sua moto, mas que união feliz!

O tempo passou, os trabalhos fluindo, um prêmio aqui, outro ali, rolou um aumento. Não pensei duas vezes: agora é um carro. E logo me vi proprietário de uma Variant II 78 verde-musgo, comprada da namorada do meu irmão. Comprei sem precisar vender a moto, o que era realmente uma façanha. A Variant veio até com rack para prancha de surfe, embora eu nunca tenha conseguido ficar em pé numa. Deixei. E pulava a terceira marcha, mas isso é detalhe.

Então, aos 23 anos, eu chegava em casa, em Campo Grande, a 60 km de distância da Artplan, lá pelas 10, 11 da noite, me servia um whisky em copo de boca larga, ligava o CD player, tecnologia recém-lançada, e coloca o CD do Elton John (só tinha esse!). Ritual dos bem-sucedidos, aprendi nas novelas.

Ia para a varanda, diante da qual, estrategicamente parados, lado a lado, inclusive com as rodas apontando na mesma direção, estavam minha DT 180 82 e minha Variant II 78 verde-musgo. Era 1990.

Olhando para o infinito, eu falava para mim mesmo: É, eu cheguei lá.

Rodolfo Sampaio é sócio e CCO da Moma (rodolfo@momapro.com.br)