Há duas semanas, a entrevista de Marcos Facó, especialista em marketing digital pela Universidade de Harvard, ao Estadão, foi um dos assuntos mais comentados no Brasil. O diretor de comunicação e marketing da FGV defendeu a ideia de que as redes sociais não teriam poder para eleger candidatos.
De fato, é preciso muito mais que um punhado de notícias falsas que circulam pela rede ou discursos polarizados, em boa parte, dirigidos para já convertidos, para que as redes sociais alcancem papel determinante nas urnas. Mas o cenário avança rápido no sentido oposto. Nesta semana, o debate atingiu em cheio o Facebook depois de denúncia feita pelos jornais The New York Times, The Observer e The Guardian sobre a obtenção de dados de mais de 50 milhões de usuários da rede de Mark Zuckerberg em 2014.
As informações privadas sobre preferências dos usuários bem como a de seus amigos foram cruzadas a fim de determinar padrões de comportamento, perfil eleitoral e possíveis preferências das pessoas. O esquema foi feito pela empresa de análise de dados Cambridge Analytica e teve como objetivo destinar propaganda política personalizada para aqueles determinados perfis psicológicos, beneficiando assim a campanha eleitoral de Donald Trump à presidência.
Christopher Wylie, um cientista da computação canadense de 28 anos, detalhou ao Guardian como a Cambridge Analytica conseguiu uma brecha de segurança para extrair do Facebook os perfis dos usuários. A mesma técnica também foi utilizada na campanha que tirou o Reino Unido da União Europeia — o Brexit.
Wylie explicou aos jornais que o esquema foi totalmente legal, ou seja, não se tratou de roubo ou vazamento de informações. Foi ideia dele a criação de um aplicativo de perguntas e respostas no Facebook em que os usuários respondiam sobre seus hábitos e em troca, recebiam uma imagem de acordo com seu perfil digital. No final do quizz, chamado “This is Your Digital Life”, as pessoas precisavam autorizar que a Cambridge Analytica tivesse acesso aos seus dados. Havia também a possibilidade de os usuários autorizarem que a empresa tivesse acesso às informações de seus amigos.
Entre os dados coletados, destaque para os likes, os posts, idade, estado civil, local de residência etc informações que foram cruzadas a fim de determinados certos padrões de comportamento. Foi descoberto, por exemplo, que pessoas que odeiam Israel costumam gostar de chocolates KitKat ou consumir calçados Nike. Ao cruzar o vasto volume de dados, a consultoria traçou perfis detalhados de eleitores que poderiam se inclinar pelo Brexit e por Trump.
No mês passado, o diretor de política do Facebook no Reino Unido, Simon Milner, disse ao Ministério Público local que a rede social não contribuiu com informações de seus usuários. “Eles podem ter um monte de dados, mas não são dados que fornecemos. Podem ser informações sobre pessoas que estão no Facebook, mas reunidas por terceiros. Não é um conteúdo que nós fornecemos”.
No começo de março, Alexander Nix, CEO da Cambridge Analytica também se manifestou, negando ter obtido qualquer informação oriunda do Faceboook de forma ilegal.
Segundo informações da Folha de S.Paulo, a campanha de Trump contratou a Cambridge Analytica em junho de 2016 pelo valor de 6,2 milhões de dólares, de acordo com os registros da Comissão Eleitoral Federal. Como reação direta ao saber do caso, o Facebook suspendeu as contas da Cambridge Analytica, de Wylie e de Aleksandr Kogan, professor da Universidade de Cambridge que ajudou na construção do app.
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