Presidente da entidade, Daniel Queiroz afirma que as marcas entenderam que não dá para esperar mais, esperar o que vai acontecer
Qual o balanço que a Fenapro faz do mercado publicitário em 2021?
Foi um ano de retomada. A última VanPro que fizemos mostrou que 40% das agências iam fechar o ano recuperando o que estavam em 2019. Ou seja, não é um ano de crescimento continuado, mas é um ano de recuperação ao estágio pré-pandemia. Eu acho que isso já é um grande sucesso, do ponto de vista da movimentação do mercado. Vejo marcas fazendo concorrências, anunciantes buscando novas alternativas, agências fazendo suas mudanças, reestruturações, novas ofertas de serviços, novos rumos também para o negócio, sendo melhor delineado.
E quais são as expectativas para este ano?
Apesar de ser um ano eleitoral e de muita criticidade, vai ser um ano difícil, de maneira geral, economicamente e politicamente falando, não acho que vamos sofrer em 2022. Essa retomada das agências, que ainda não é na totalidade, deixa um gap grande para a gente buscar resultado. Então, mesmo num cenário crítico, ainda tem espaço de crescimento a ser percorrido. Acredito que a recuperação das agências será continuada. Acho que as marcas entenderam que não dá para esperar mais, esperar o que vai acontecer. Boa parte dessa recuperação que vivemos em 2021 tem a ver com isso. Não dá para esperar a pandemia passar, a economia melhorar ou a definição eleitoral. A gente está no jogo e tem de continuar nele. Quando você sai dele, outro entra. A VanPro apontou que nos dois anos de pandemia 10% das agências cresceram suas receitas. É preciso olhar para o mix de clientes, por exemplo, marcas de consumo, setor financeiro e setor público anunciaram muito.
E como está a questão da inovação dentro das agências?
A inovação sempre foi parte da nossa entrega, da nossa indústria, e da nossa forma de pensar e modus operandi. A inovação faz parte da nossa capacidade, nossas competências e sempre fez parte da nossa forma de agir e produzir. Apesar de termos perdido a oportunidade de nos apropriarmos dessa palavra que está na moda agora, nós sempre fomos e continuaremos sendo inovadores. A menção da não apropriação da palavra inovação é no sentido de valorizar ainda mais a capacidade da indústria da comunicação.
Qual a sua opinião sobre a movimentação recente dentro do Cenp (Conselho Executivo das Normas-Padrão)?
Eu acho que o maior desafio das agências não é sobre a entrega de digital, mas sim sobre o modelo de negócio que foi impactado pelo digital. E nesse contexto, o Cenp, como emulador regulatório que integra nessa mesa todos os interessados, lidera essa discussão sobre o conflito de modelo de negócios que o digital mexeu. Essa é a grande questão que precisa ser observada. E é por essa e outras razões que o Cenp neste momento está revisando a sua governança, o seu papel, as cadeiras que precisam ser ocupadas, fazendo um esforço para retomar escutas com todos os players. Como o Lara disse em seu discurso (Luiz Lara assumiu a presidência do Cenp em dezembro), não existe mais comunicação on e off, tudo é on com off, e tudo é off com on. O maior exemplo é: por que um Google está no Jornal Nacional e desde quando a TV é off? Você assiste a TV no celular, lê a notícia do jornal no Twitter, está tudo junto e misturado.
No discurso de posse, Luiz Lara disse que o Cenp deixará de ser fiscalizador. O que significa isso exatamente para o mercado?
Eu acho que na cabeça das pessoas existem vários Cenps. Tem o Cenp regulador, fiscalizador; tem o Cenp regulador, emulador; e acho que tem o Cenp que cria uma base mínima de qualificação técnica para as agências. E acredito que essa questão da qualificação serve muito para o setor público, que é um segmento contratante muito importante para o nosso negócio, que precisa ter de alguma forma garantia técnica de sua entrega, porque o processo de contratação é difícil, longo e burocrático. Já no setor privado, o Cenp emulador é fundamental porque existe um contexto de integração dos players que discute modelo de negócios, alternativas, melhores práticas. Na minha opinião, o Cenp que não funciona mais é o Cenp fiscalizador no sentido de punidor, de poder de polícia, porque essa é uma percepção equivocada. O Cenp tem de ser um ente que vai ajudar o mercado interagir, é por isso que nesse novo momento a gente precisa de uma mesa mais larga, com mais cadeiras e vozes ativas para que o setor interaja no todo e não só uma parte. Como a autorregulamentação funcionou muito bem, levando garantias para o setor público, ao longo do tempo isso acabou se destacando mais em relação às outras demandas.
Outra discussão é sobre a contratação de agências especializadas em mídia no país, como defende o novo guia de boas práticas da ABA (Associação Brasileira de Anunciantes). O que você acha disso?
O mundo inteiro aplaude o nosso modelo de agência integrada (com criação e mídia). E como é que a gente que está aqui quer acabar com ele? Tentaram fazer isso no passado e perceberam que não é positivo. Por que então temos de abrir essa discussão aqui e não observar a experiência vivida em outros lugares para
entender que não é o melhor? Infelizmente, acho que a ABA, até por ter decidido sair do Cenp, dessa mesa onde todos conversam juntos, se distanciou do objetivo comum. Mas ainda há tempo para a gente voltar a conversar junto e acho que isso é o que vai acontecer. Nós não conseguimos ver vantagem em concentrar o poder econômico num único player, de mídia, e pagar por fora a criação, o planejamento, a estratégia. O anunciante vai pagar duas vezes? Qual é a inteligência disso? Hoje temos competência para pensar o todo.
O que você acha sobre o etarismo no mercado?
Eu acho que em um time não existe cabeça preta (profissional mais jovem) sem cabeça branca. Qualquer negócio exige complementaridade e zona de permanente conflito de ideias para encontrar o melhor caminho. Na pandemia, por exemplo, saiu de cena aquela demanda mais sistemática dentro das agências e entrou em cena a experiência, o background, a vivência dos profissionais. Os clientes exigiram durante esse processo todo domínio, conhecimento, visão de negócio. E os profissionais tão juniores não entregam isso, naturalmente pela pouca experiência.
Quantas agências de publicidade existem no Brasil?
Na Fenapro, passamos a adotar como critério CNPJs com CNAE de agência que, no Ministério do Trabalho, tenham pelo menos um funcionário CLT. Estabelecemos esse critério porque mostra que aquele CNPJ é ativo. Diante disso, consideramos que existem 3.187 agências no país. Essa é uma referência mais real de uma dimensão de mercado. No Cenp, há 1.184 agências certificadas. E os 18 Sinapros no Brasil têm 812 agências associadas. Consideramos que desse universo de 3 mil, apenas 1%, ou seja, 30, são agências gigantes; 5% grandes; 20% as médias; e os 65%, 70% são pequenas empresas, que faturam até R$ 500 mil ou no máximo R$ 1 milhão por ano.
Quais são hoje as maiores dores das agências no mercado regional?
Os problemas são os mesmos, o que mudam são os números e a dimensão dos desafios. Mas um grande problema que estamos vivendo hoje é o apagão de mão de obra qualificada, por exemplo, os bons mídias sumiram. Eles estão migrando para anunciantes, veículos, startups, e entenderam que não estão presos a ninguém. Isso gerou uma grande carência do profissional qualificado. Com os criativos, essa falta já era mais comum, mas agora a gente vê isso em várias áreas. E ela piorou por causa da competição dos outsiders. Outro fator é que não tem mais barreira física no nosso negócio. E esse é um problema gravíssimo nos mercados regionais, que estão perdendo profissionais para as agências de maior poder econômico, porque agora a pessoa está em Belém e pode trabalhar para uma multinacional em São Paulo. Com a pandemia, essa cultura foi estabelecida.
E quais serão os maiores desafios das agências neste ano?
O maior desafio é ocupar o espaço de relevância que as agências precisam ter para valorizar uma qualidade de remuneração que foram perdendo ao longo do tempo por conta de toda essa mudança no modelo de negócio. Em contrapartida, acho que a gente está no melhor momento para ocupar esse lugar, voltando ao ponto da questão consultiva, da questão da inteligência, de trazer experiência para a mesa e contribuir para o negócio do cliente. E o que é ser relevante? É ser capaz de entregar inteligência, além da criatividade. A criatividade, com inteligência, dados, informação, métricas, é fundamental. É dar uma segurança maior para o retorno do investimento, porque o nosso negócio não é 1 + 1 igual a 2. E o recheio disso tudo é a criatividade. A nossa indústria ajuda as outras indústrias a crescerem, se desenvolverem, as empresas valem mais por causa da construção de marca. Isso ajuda no contexto de desafio de mercado, mas é preciso mostrar prática real e positiva. E não tem fórmula de bolo. Tem muita gente testando muita coisa. Mas, de maneira geral, estamos no rumo certo.
A Fenapro tem dados sobre o fechamento de agências na pandemia?
Não temos, mas sim, algumas agências fecharam. Foi uma menor parte, o holofote não está aí, a grande maioria está encontrando o seu caminho.