O primeiro capítulo do “Fenapro Transforma” – paper da Fenapro (Federação Nacional das Agências de Propaganda) sobre as transformações do mercado e os desafios das agências em se adaptar a nova realidade abordou a grande mudança que o setor de publicidade e propaganda sofreu desde que o digital avançou sobre as mídias tradicionais, alterando totalmente a rotina das agências, e impactando a capacidade de sobrevivência de muitas agências brasileiras.

Apresentado nesta quarta-feira (10) durante o programa Chacoalha, o encontro contou com a participação de Daniel Queiroz, presidente da Fenapro, Dudu Godoy, presidente do Sinapro-SP e vice presidente da Fenapro e Fernando Silveira, presidente do Sinapro-RS.

Denominado Transformações em curso no mercado, este primeiro capítulo do documento destaca que se foi o tempo em que grandes agências criavam campanhas que marcavam época e influenciavam até mesmo a cultura de um país. Hoje, são as entregas de curto prazo que fazem parte do cotidiano, e não há espaço para campanhas memoráveis como antes ou para se realizar três ou quatro grandes campanhas por ano para um cliente. O digital é o campo de batalha, e a busca por resultado é diária.

“Houve uma grande mudança relacionada ao consumidor de mídia que transformou todo o mercado. Antes, o consumo era mais passivo e, por consequência, os contratos publicitários eram mais longos, com campanhas massificadas e de longo alcance . A partir do momento em que o consumidor de mídia passou a ter escolha via redes sociais, e a velocidade do consumo de informação e propaganda aumentou exponencialmente, resultado direto da popularização das redes sociais, o mercado teve que se adaptar a contratos mais curtos, com budgets menores e com demanda para resultados imediatos”, afirmou Dudu Godoy.

“Outro resultado dessa mudança é que a criação, antes isolada nas agências, invadiu todas as áreas. Se existiam barreiras antigamente entre os departamentos das agências, com funções distintas, hoje o formato tem que ser muito mais horizontal, mais ágil, com soluções que têm que vir de todos os profissionais. Hoje, os criativos não só precisam ter uma ideia sensacional, mas já têm que pensar em como essa ideia vai impactar um consumidor de mídia cada vez mais exigente e que dá milésimos de segundos para o impacto de uma propaganda”, salientou Fernando.

Digital absorve os investimentos

A mudança na alocação de investimentos em comunicação, que intensifica as demandas digitais, é o propulsor desta grande transformação no setor. As grandes plataformas de tecnologia (Google e Facebook) tornaram-se grandes competidores pelas verbas de anunciantes, enquanto plataformas de streaming, como a Netflix, propiciam conteúdo sem anúncios, e grandes anunciantes começaram a criar agências in-house, retirando o trabalho dos especialistas.

Além disso, profissionais demitidos em decorrência do impacto da COVID-19 estão oferecendo serviços de forma mais informal, o que elevou, como nunca, a concorrência no mercado, e segue pressionando a entrega de resultados rápidos, com a exigência de métricas detalhadas para aferir o desempenho das campanhas.

“As plataformas digitais concentram e retém a atenção dos consumidores e, por não se assumirem como veículos de mídia que verdadeiramente são, escondendo-se sobre o mote de serem empresas de tecnologia, não se submetem às consagradas regras do mercado publicitário brasileiro. Este poder das redes sociais tem desequilibrado a publicidade nacional e mudado profundamente as gestões das agências, além de criar um mercado anunciante que está demandando cada vez mais soluções rápidas das agências, às vezes sem nem mesmo terem real noção daquilo que a marca quer em campanhas digitais. Creio que o nosso mercado não pode aceitar que as plataformas digitais ditem suas regras em detrimento do nosso sistema de regras já consolidado”, afirmou Dudu Godoy.

“Essa questão de as plataformas não se assumirem como veículos me incomoda muito. O Facebook, por exemplo, chegou a transmitir partidas da Copa Libertadores da América. Parece que as plataformas querem transmitir conteúdo, não querem se assumir como veículos e até censuram alguns conteúdos dos próprios consumidores. Se você tem esse poder, como as redes têm hoje, você é um veículo. E esse poder, sem regras, é bastante perigoso”, salienta Silveira.

Consumidores estão sendo afetados

A nova realidade também está afetando negativamente o principal alvo do setor, que são os consumidores. Cada vez mais sobrecarregados de informação, com maior acesso a canais de comunicação diversificados, e tendo suas atenções disputadas a cada segundo pelas ações publicitárias, a maioria dos consumidores está cansada e sobrecarregada de propagandas, com um bom número de pessoas se dispondo até a pagar para apenas se livrar dos anúncios em serviços de streaming e aplicativos, e com gigantes como o YouTube e Spotify oferecendo serviços de assinatura Premium sem propaganda.

Estas são as transformações em curso, apontadas neste primeiro capítulo do documento:

• Realocação imediata de boa parte dos investimentos em mídias de massa para mídias em plataformas digitais;

• A alocação dos investimentos, em muitos casos, tem diminuído, ao passo que as demandas têm se intensificado;

• Os consumidores estão cansados e sobrecarregados de propagandas, muitas vezes pagando para se livrar delas em serviços e aplicativos;

• Grandes empresas estão internalizando o trabalho que seria feito pelas agências, e empresas de outros setores têm desenvolvido serviços concorrentes;

• Profissionais demitidos durante a pandemia se uniram e criaram sua própria oferta de serviços, em caráter mais informal.