Muita coisa mudou na publicidade brasileira em sua história, mas parece haver um consenso de que, neste momento, a indústria atravessa sua maior transformação. Assim como em revoluções passadas, os profissionais do setor estão tentando compreender esse novo cenário e se adaptar às mudanças. Esse debate ganhou novos contornos no evento de comemoração aos 53 anos de PROPMARK, realizado no último dia 7, no auditório da ESPM, em São Paulo, que trouxe profundas reflexões sobre os impactos dessa transformação para o mercado. 

Com mediação de Paulo Macedo, editor do jornal, cinco profissionais com diferentes visões de mercado assumiram a missão de discutir temas que vão pautar o futuro da publicidade. Assuntos como regulamentação do setor, concorrências, publicidade em ano de Copa, eleições e a própria revolução da indústria foram analisados por Caio Barsotti, presidente do Cenp (Conselho Executivo das Normas-Padrão); Fernando Taralli, presidente da VML Brasil; Marcia Esteves, presidente da Grey Brasil; Mário D’Andrea, presidente da Dentsu Creative Group e da Abap (Associação Brasileira de Agências de Publicidade); e João Branco, diretor de marketing do McDonald’s e presidente da ABA (Associação Brasileira de Anunciantes).

Em relação ao tema da transformação do mercado, o tom do debate é de que a publicidade deve se preocupar em refletir o que ocorre na sociedade, como sempre fez. “A propaganda vem a reboque do que ocorre no mundo. Não ditamos tendências, estamos seguindo o que o consumidor dita. E, hoje, o digital é o ar que as pessoas respiram. As relações entre as pessoas mudaram muito. Acho engraçado quando me perguntam as tendências do mercado porque, na verdade, nós é que temos de seguir a sociedade para onde ela seguir”, analisa D’Andrea. “Não temos a missão de adivinhar o que vai acontecer, mas ter o conhecimento sobre o consumidor, colocar o dedo no pulso dele, e sentir o que eles falam nas ruas. É somente a partir dessa percepção que poderemos fazer as nossas mudanças internas”, completa.

Marçal Neto/Divulgação

Reflexão
A indústria da publicidade, lembra D’Andrea, é uma das últimas a entrar em crise, e será uma das últimas a sair. Mesmo assim, este período de baixa serve para reflexão sobre os novos caminhos que devem ser seguidos. Seja qual for o cenário, hão há dúvidas de que a publicidade terá sua importância. “Os profissionais de marketing e de propaganda sempre tiveram a missão de criar riqueza para a economia brasileira. É uma das poucas indústrias no Brasil a fazer isso, e não diminuir ou consumir riquezas. Por isso, é um setor com importância absurdamente grande para o país e que, seguramente, vai continuar trabalhando para criar riqueza para as empresas”, avalia D’Andrea.

O principal componente dessa transformação, sem dúvida, é a tecnologia. Ela impactou desde a comunicação entre as pessoas até os processos internos das empresas. Não há aspecto da vida corporativa das marcas ou da vida das pessoas que não tenha sido transformado pelas novas ferramentas e ecossistemas digitais. “Nos últimos dez anos, a mudança que aconteceu foi por causa da tecnologia, que acelerou as coisas, mas essa mudança ocorre desde lá de trás. Quando a TV deixou de ser em preto e branco e se tornou colorida, por exemplo. A comunicação se adapta conforme a sociedade se transforma. Quanto mais formos abertos e saírmos do mundo de nossas marcas e agências, e entender que o mundo se transforma a passos largos, encontraremos oportunidade de como as pessoas podem se comunicar nesse ecossistema”, reflete Marcia Esteves, presidente da Grey Brasil.

Da mesma forma que D’Andrea, ela avalia que o papel da publicidade é acompanhar as transformações da sociedade e acompanhar as reações das pessoas. “Nosso papel é fazer com que as marcas cheguem de forma efetiva ao lar das pessoas. Estamos, como mercado, abraçando as mudanças e aprendendo sempre. Há uma novidade a cada dia, seja vídeo sob demanda, realidade virtual e tantas outras. Queremos ser melhores todos os dias”, avalia Esteves.

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Agência com DNA digital, a VML é presidida no Brasil por Fernando Taralli, que diz estar animado a trabalhar com o novo cenário de mercado. “Temos um consumidor engajado, que opina instantaneamente sobre a comunicação da marca. Por isso, a agência precisa estar atenta todos os instantes. Antes, se lançava a campanha e o trabalho terminava. Agora, é preciso acompanhar as reações e estar preparado para que a ação seja bem-sucedida”, explica o publicitário. “Vivemos num mundo em que as pessoas expressam as suas opiniões, com senso crítico aguçado, e em um mundo com muitas fake news. O desafio da marca é surfar nesse mundo de opiniões e buscar o engajamento. Na revolução em que vivemos, o consumidor é mais participativo, por isso, nunca foi tão importante sentir o pulso das pessoas e nos prepararmos para continuar respondendo a seus anseios e levar as marcas adiante”, completa.

Representante no debate do lado do anunciante, João Branco, do McDonald’s e ABA, reforça que o desafio do setor é entregar mensagens personalizadas para as pessoas certas na hora mais adequada. A diferença para o passado é que, hoje, as tecnologias e os dados ajudam nesse sentido, e até na medição dos resultados da comunicação. “Agora, sabemos mais sobre quem são as pessoas com quem queremos falar. À medida que saciamos nossas curiosidades sobre as novas tecnologias, mudamos a forma de comunicar. Essa grande transformação da sociedade ocorre em um momento de mudança no modelo de negócios do mercado, em que os anunciantes e agências também estão redefinindo o que vendem e como vendem. Ou seja, há mudanças vindo de todos os lados, e ao mesmo tempo”, analisa.

Regras do jogo
Nesse cenário complexo desenhado por Branco, está mais difícil, caro e trabalhoso entregar resultados para os clientes. Em um mercado com mudanças que se tornaram uma rotina, as regras precisam ser claras e, nesse sentido, o Cenp (Conselho Executivo das Normas-Padrão) está se atualizando à nova conjuntura e reforçando seu papel já relevante no setor. “O que fica claro do posto de observação do Cenp é que é mais difícil atingir resultados para que as contas sejam rentáveis, seja do lado da agência ou dos profissionais de marketing. Isso representa oportunidades, mas com o desafio da resiliência. Temos de continuar no mercado, nos adaptando, usando ferramentas com cada vez mais impacto e disponibilidade, para manter a qualidade e resultado de classe mundial que a publicidade brasileira possui”, explica Caio Barsotti, presidente da entidade.

Nesse sentido, sob o ponto de vista normativo, o Cenp quer acompanhar as mudanças do setor. “Mesmo no direito, as leis são atualizadas apenas após o fato social. Como no caso recente do vazamento de dados do Facebook, que acelerou discussões sobre legislação em relação à privacidade de dados, especialmente na Europa”, contextualiza Barsotti. Claro que, prossegue o profissional, há legislações que podem se tornar muito restritivas ao consumo e é preciso ficar atento a exageros. “Mas, de resto, as normas-padrão vêm sendo discutidas e se atualizando.

Tivemos várias atualizações e teremos novidades em breve, fruto de debate intenso do mercado”, avisa. Recentemente, o Conselho Executivo do Cenp constituiu um comitê técnico de líderes do setor para contribuir com a atualização das normas. O Anexo D, por exemplo, visa criar um ambiente de normatização para a comercialização no ambiente digital. “Nesse anexo, o modelo do mercado está intacto, e procuramos atualizar as regras para que ele se articule com o que ocorre na economia e no ambiente de negócios do país”, conclui Barsotti.

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