Com quatro projetos em pré-produção, 10 em produção e mais dois lançados em salas de cinema ainda este ano, a Giros, produtora de audiovisual dos sócios Belisario Franca, Maria Carneiro, Bianca Lenti, João Alberto Santos e Mauricio Magalhães, se propõe a revelar histórias únicas de forma impactante. O carro-chefe da produtora são as séries de TV documentais — mais recentemente, entrou no mercado de ficção para TV e cinema. Possui ainda um núcleo de “filmes-causa” que tem no seu portfólio os longas-documentários Estratégia Xavante e Amazônia Eterna, por exemplo. Em junho, lançou Menino 23. “O filme tem a vocação de ser um dispositivo de discussão contínuo sobre as raízes do racismo no Brasil e da exploração do trabalho na infância”, diz Franca. De acordo com ele, o foco da Giros é contar histórias que precisam ser contadas — o documentário Menino 23 é uma delas, um relato dos 50 meninos órfãos e negros que foram levados a uma fazenda no interior de SP, longe da cidade e escravizados por 10 anos, adotados por um único tutor, de uma família da elite brasileira nazista e integralista, tudo aceito pela sociedade da época. “Evoluímos muito pouco como sociedade na garantia de direitos para as minorias, principalmente em relação à igualdade racial. Foi por esse propósito que decidimos realizar o filme”, explica Franca, que há mais de duas décadas se dedica a inventariar a cultura material e imaterial brasileira munido de um olhar investigativo e crítico. Íntimo da realidade das populações do Brasil, teve seus inventários audiovisuais em forma de séries e documentários premiados nacional e internacionalmente. Entre alguns dos prêmios, destacam-se: Além Mar, como melhor série para televisão segundo o IDA – International Documentary Association; Estratégia Xavante, agraciado pela ONU com o título de melhor criação de arte e mídia referente à paz; Música do Brasil, contemplado com o título de melhor produção cultural para TV pelo Grande Prêmio do Cinema Brasil; e Amazônia Eterna, que teve estreia mundial no Rio+20 e recebeu o prêmio de Melhor Documentário no Festival de Cinema Brasileiro em Toronto – BRAFFTV.

 

Por que apostar em filmes deste tipo, considerando que não são campeões de bilheteria?

A proposta da Giros é descobrir e revelar ao público histórias únicas de forma instigante e visualmente impactante. Universos, personagens, narrativas e temas ricos, sejam eles reais ou ficcionais, são a matéria-prima de um acervo focado na relevância, no entretenimento e na disseminação de conhecimento. O nosso foco é contar histórias que precisam ser contadas e a história dos 50 meninos órfãos e negros que foram levados para uma fazenda no interior de SP, longe da cidade, longe da comunidade e escravizados por 10 anos, adotados por um único tutor, de uma família da elite brasileira, que era nazista e integralista e tudo isso foi aceito por aquela sociedade e traduzido como normal, era uma história que precisava ser contada.

Documentários como esse informam e instigam a plateia. Tem o seu valor e espaço no mercado audiovisual. Sabemos que o Menino 23 não seria um blockbuster comercial.  O Menino 23 tem outra vocação, apesar de estar indo muito bem nos cinemas, o filme tem a vocação de ser um dispositivo de discussão contínuo sobre as raízes do racismo no Brasil e da exploração do trabalho na infância. Revela um período da história do Brasil que está esquecido, trazendo à tona fatos concretos relacionados ao período mais racista da história do país, quando a prática da eugenia fazia parte de um projeto de nação na Constituição de 1934. E esse grande incômodo está em constatar que essa péssima herança ainda é reproduzida, mesmo que velada. Evoluímos muito pouco como sociedade na garantia de direitos para as minorias, principalmente em relação à igualdade racial. Foi por esse propósito que decidimos realizar o filme.  

 

Qual a expectativa em relação ao filme?

A nossa expectativa é que o filme seja capaz de estabelecer um canal emocional com as pessoas e fazê-las se engajarem nas causas levantadas pelo filme: a negação do racismo estrutural no Brasil e a exploração da infância desassistida. Para que de fato haja uma mudança de comportamento e mentalidade na sociedade. E que, a partir dessa história, possa dar voz a outras histórias tão invisíveis quanto essa era.

Para garantir que o filme pudesse ser uma ferramenta de cidadania e gerar reflexões e debates a partir dele, elaboramos um plano de impacto para o Menino 23 – Infâncias Perdidas no Brasil. Trata-se de uma estratégia de comunicação com engajamento social, na qual usamos como ferramenta de construção de rede e fomentadora de discussão os canais digitais do filme (site, Facebook e Twitter) e as exibições seguidas de debates com grupos estratégicos. A estratégia de impacto tem foco na difusão e acesso do filme junto às diversas camadas da sociedade (ONGs, comunidades, ativistas, formadores de opinião, movimentos sociais, universidades, entre outros) e na construção de relacionamento com esse público antes e depois do lançamento comercial do filme.

A nossa ideia com a campanha de impacto foi aumentar o alcance do filme para além das telas do cinema, aumentando o seu período de exposição e diversificando as janelas de exibição do filme. Já realizamos mais de 30 exibições seguidas de debate para públicos específicos em todo o Brasil, no período de outubro do ano passado a este mês (agosto), com o objetivo de despertar o ativismo e o envolvimento dessas pessoas nas causas do filme. Com essa ação específica atingimos mais de 3,5 mil pessoas, além do engajamento dos usuários nos canais digitais do filme, onde temos diálogo contínuo com o público do filme. No Facebook, atualmente temos mais 32 mil seguidores engajados, no Twitter temos 574 seguidores e no site temos em média 1,5 mil pessoas que acessam diariamente. O público impactado é bem variado, desde os pesquisadores do Ibase e IPEA, acadêmicos, universitários, alunos do ensino médio público e privado, militantes e ativistas do movimento negro, ONGs ligadas aos direitos humanos e minorias de direito e moradores de favelas.

 

Qual a importância à Giros de um filme como
Menino 23?

Um filme como o Menino 23 reforça ainda mais o posicionamento da Giros de produzir conteúdos audiovisuais relevantes para a sociedade, que possam ser uma ferramenta de mobilização e transformação de cultura, levando para discussão causas importantes da atualidade. Nesse segmento de filmes-causa a Giros tem no seu portfólio os longas-documentários Estratégia Xavante e Amazônia Eterna.

 

A Giros tem outros projetos parecidos?

Sim, a Giros possui um acervo de projetos preparados para ganhar o mundo do “Filme-Causa”. Entre eles destacamos três longas-documentários: Epidemia da Pressa que busca identificar os principais motivos por trás da alta incidência de acidentes de trânsito no Brasil; Paraíso em Chamas que acompanha a ação de voluntários no combate às queimadas na Chapada Diamantina e Nazinha que fala sobre a realidade de presidiários no Pará.

 

As marcas têm patrocinado, como poderiam, o audiovisual brasileiro?

O investimento é tímido das marcas frente ao potencial que o mercado audiovisual pode oferecer. Apesar do crescimento no investimento em projetos de conteúdo audiovisual customizados para internet, com a intenção de se aproximar de um novo público, mais conectado e menos aberto aos anúncios tradicionais, as marcas ainda trabalham de forma conservadora com as produtoras. 

 

Qual a oportunidade no audiovisual para as marcas?

Estamos vivendo novos tempos, com novos desafios, novos comportamentos, e isso se reflete na nossa comunicação. Estamos mais interativos e colaborativos com conteúdo que nos interessam e que dão significado às nossas vidas. Um bom conteúdo audiovisual, entre longas e séries documentais, e séries de ficção, além de materiais especiais institucionais, são ferramentas poderosas de comunicação, uma vez que além de conferir visibilidade para a marca, e ter incentivos fiscais que otimizam seus investimentos, ainda estabelecem envolvimento abrangente com diversos públicos e tratam de temas universais e contemporâneos da nossa sociedade. Com os avanços tecnológicos e o fácil acesso aos conteúdos audiovisuais nas diversas plataformas digitais, ampliou ainda mais o alcance desse conteúdo.

 

Alguma novidade na Giros neste ano?

Nossa equipe fixa é bem enxuta, e trabalhamos de acordo com o volume de projetos. Hoje temos em torno de quatro projetos em pré-produção, 10 em produção e mais dois lançados em salas de cinema ainda este ano. O nosso carro-chefe são as séries de TV documentais, e mais recentemente entramos no mercado das séries de ficção para TV e longas de ficção para o cinema. Além disso, temos um núcleo que chamamos de “filmes-causa”.

 

 

Qual foi a participação dos envolvidos na obra
(Menino 23): da Giros, da Globo Filmes, da
 GloboNews e da TV Brasil?

Contar com esses parceiros permitiu não só aportes financeiros bem como assegurar que a estratégia de dar o maior alcance possível para Menino 23 tivesse êxito. Matérias jornalísticas na GloboNews, spots na TV Globo e na GloboNews garantiram uma excelente divulgação quando do lançamento em cinema. A partir de outubro o filme será exibido no Canal Brasil e na GloboNews para um público potencial de 12 milhões de assinantes. Além disso, será disponibilizado na plataforma Now durante um ano. 

 

Segundo a Ancine, o audiovisual cresceu 38%
no ano passado. Os negócios da Giros seguiram
nessa linha, houve crescimento?

No biênio 2014/2015 crescemos 70% o volume de horas produzidas de programação para TV e ampliamos em 150% a diversidade de parceiros com que trabalhamos. As relações entre os agentes de mercado estão amadurecendo e o público brasileiro tem crescido bem como a demanda por conteúdos brasileiros de qualidade. O momento pode ser mantido e ainda tem espaço para acelerar.

 

Quais os entraves do setor?

O debate sobre propriedade intelectual é a próxima grande questão que envolve o ambiente audiovisual com canais de TV, produtoras independentes e organismos regulatórios. Propriedade intelectual monetizável significa um mercado mais sadio e com bases mais sustentáveis no médio e longo prazos.

 

Mantém parcerias?

Talvez a parceria mais importante que temos agora é com a Tambellini Filmes para o desenvolvimento do departamento de ficção de TV da Giros. Juntos desenvolvemos as séries JunglePilot para o Universal Channel e Corumbá.