A área de relações públicas – o PR Lions – tornou-se, em Cannes, desde o seu lançamento em 2009, uma das mais concorridas do festival. E onde se encontram alguns dos cases mais inovadores entre todas as áreas. Nesses três anos de disputa o Brasil conquistou seis Leões, sendo dois no ano passado – um de ouro para o trabalho “Skankplay”, da DonTryThis para a banda Skank; e um de prata para o case “Paz social”, assinado pelo braço digital da FSB Comunicações para o Governo do Estado do Rio de Janeiro, o que fez com que a FSB se tornasse a primeira agência de comunicação corporativa do Brasil a receber um Leão em Cannes pelo desenvolvimento de estratégias de comunicação nas mídias sociais. Quem fala sobre suas expectativas em relação á área no Cannes Lions é justamente o jornalista e sócio da empresa, Flávio Castro, representante brasileiro no júri do PR Lions. Ele, que trabalhou na editoria de economia de vários jornais, como O Estado de S.Paulo, Gazeta Mercantil e O Globo – onde foi correspondente em Buenos Aires durante três anos –, está na FSB há 10 anos e tornou-se sócio há cinco. Hoje ele gerencia as operações da empresa no Rio de Janeiro e em Belo Horizonte e atua principalmente em gerenciamento de crises, media training e prospecção. Por ser jornalista e nunca ter trabalhado em publicidade, considera-se um “estranho no ninho” no meio do festival. “Meu background, por ser de jornalista, me torna mesmo um ‘bicho diferente’. Na minha época de redação ainda havia uma rivalidade entre o jornalismo e a publicidade. Isso não existe mais, as áreas se aproximaram para o bem do leitor e do mercado”, observa.
Praia do PR
“A força da área do PR em Cannes é um sinal dos tempos. Qualquer mix de comunicação inclui RP de forma muito profissional. Hoje sabemos que o nosso trabalho faz diferença, principalmente na construção da reputação de marcas, de empresas. Isso faz com que as empresas da área voltem seus olhos mais fortemente para a premiação. Antes, Cannes era considerada território de publicitários, hoje torna-se a praia do PR – o que fará, consequentemente, com que as agências de relações públicas voltem seus olhos para o evento e se preparem para ele de maneira organizada e estruturada, com cases e envio de profissionais. Este ano acho que vamos nos surpreender com essa área pelo fato de termos tido um resultado bom no ano passado e também porque o Estadão (representante do festival no Brasil) está divulgando-a muito bem. O mercado brasileiro vai acordar”.
Olhos para fora
“O lado positivo do crescimento do PR em Cannes é, justamente, a oportunidade deste mercado voltar seus olhos para o que está sendo feito ao redor do mundo. Uma reflexão já feita há tempos pelas agências de publicidade do país. A publicidade está muitos anos à nossa frente, por meio da necessidade de exposição e contato com o mercado internacional. Nosso setor, fora algumas multinacionais presentes aqui, não tem essa troca com o mercado internacional. Agora passaremos pelo mesmo processo que a publicidade passou, nos relacionando mais com empresas estrangeiras. Por sinal, no ano passado, a FSB passou a integrar pela primeira vez o ranking mundial Holmes Report, que aponta anualmente as 250 maiores agências de relações públicas do mundo. Ela ocupa a 24ª posição. Pode parecer estranho um salto deste tamanho, mas na verdade as empresas brasileiras não estavam presentes porque não enviavam seus dados ao Report. Isso mostra que as empresas brasileiras tem capacidade de estar em Cannes e competir de igual para igual com os demais países”.
Inscrições
“Esta é uma área em que os profissionais não possuem o permanente olhar para o que pode ser ‘premiável’. De repente nos damos conta, pelo resultado ou pela estratégia elogiada, de que podemos inscrever algo em um prêmio. Costumamos esquecer até mesmo as premiações nacionais, que estão mais próximas de nós. Por isso que o volume de agências de publicidade premiadas no PR Lions ainda é maior do que as próprias agências de PR, que também necessitam passar pela curva do aprendizado em torno do que e como inscrever. É preciso formatar o case de maneira correta, até porque o investimento é alto. As agências de publicidade tem o know-how de produzir cases e, para nós, esse ainda é um trabalho quase artesanal”.
Troca de experiências
“Tenho conversado com algumas pessoas para ouvir experiências anteriores sobre o festival. Pessoas essas como Ronald Mincheff, presidente da Edelman Brasil e representante do país no júri do PR Lions em 2011. O encontro recente dos jurados e ex-jurados que tivemos em São Paulo também foi muito interessante para ouvir histórias sobre relacionamento interno com outros membros dos júris e também sobre processos”.
Subjetividade
“Como critério para eleger os melhores, eu pretendo usar os resultados das estratégias – que são até mais subjetivos e difíceis de ser mensurados, mas que um olhar especializado é capaz de reconhecer. Ao contrário da publicidade, o benefício concreto do que aquilo trouxe para um cliente acaba sendo mais chave do que a criatividade em um case. Nem sempre o aumento de vendas marcará um trabalho premiado. Às vezes o melhor resultado é evitar que o cliente tenha uma cobertura negativa maior, ou, por exemplo, conseguir um nível de repercussão nas redes sociais em um momento crítico para o Rio de Janeiro, como no case que ganhou Leão de prata ano passado. E o que se consegue evitar sempre é mais dificilmente mensurável. O tal do ROI, na nossa área, é muito fluido”.
Olhar do jurado
“O case que conseguir demonstrar claramente e da maneira mais objetiva possível seu resultado concreto para o cliente em construção e proteção da sua imagem me chamará mais a atenção, por conta de todos os desafios que o segmento enfrenta. Mais do que uma ‘bela sacada’ que não apresente excelentes resultados. Acredito que a área de PR tem, tradicionalmente, a cultura dos resultados. O conceito de criatividade desloca-se da ideia para ser o uso de uma metodologia, da disciplina do processo, do gerenciamento de uma crise. Muitas vezes pedimos para alguém na agência inscrever um case em um prêmio e ela reage espantada, dizendo: mas eu só estava resolvendo um problema do cliente”.
Gerar reputação
“Eu trabalho com reputação e a comunicação é a ferramenta que uso para atingir esse objetivo. Todo o processo de construção, proteção e gerenciamento de uma reputação é o centro do trabalho do RP. E é no gerenciamento desta reputação, na opinião do profissional, que os clientes enxergam os maiores benefícios da área de relações públicas. Trabalho, por sinal, ainda mais complexo no mundo das novas tecnologias, em que ‘cada pessoa é uma mídia’, capaz de espalhar informações com velocidade e competência impressionantes. O gerenciamento de crises tornou-se mais desafiador com isso. Qualquer organização, pessoa pública, partido, empresa, governo ou outro passou a ser permanentemente fiscalizado por pessoas com uma capacidade de repercussão muito grande. O potencial de gerar crise é grande”.
Mídias digitais
“Em relação às redes sociais, até por esse processo de construção da reputação dos clientes, ainda há muito o que aprender na área. As fronteiras estão sendo construídas. As mídias digitais abriram o leque de ferramentas que podemos utilizar nas estratégias dos nossos clientes. Mas não acredito unicamente em estratégias nas redes sociais, e sim de comunicação. Elas possibilitam o contato mais direto com o público-alvo, sem intermediação dos veículos de comunicação. Mas estamos testando limites e vivemos um momento interessante, onde há muito a ser explorado”.
Mercado internacional
“Recentemente, eu e outras duas profissionais da FSB PR Digital (a sócia-diretora Maria Claudia Bacci e a diretora-executiva Risoletta Miranda), estivemos em Nova York para conhecer melhor o cenário das empresas que atuam na área. Nos demos conta de que estamos com os mesmos dilemas e fortalezas do mercado internacional. Em relação às redes sociais, temos a vantagem do brasileiro ser um heavy user, gerando uma matéria-prima espetacular para utilizar de forma até mais agressiva do que outros países. Mas falando de utilização estratégica, estamos no mesmo nível de outras empresas internacionais. O que ocorre é que no mercado norte-americano, por exemplo, há a vantagem de existir mais clientes que conhecem a fundo área digital. Ter um braço especializado ainda faz a diferença”.