Maria Eugenia: “Não podemos nos dar ao luxo  que algumas marcas já construídas  fazem e sair da mídia por um tempo”

Pertencente ao portfólio do Grupo JBS, a Friboi é um dos exemplos mais bem-sucedidos na comunicação brasileira de um produto que deixa o status de commodity – no caso, a carne – para se tornar uma marca conhecida. O trabalho para isso, iniciado lá atrás pela Fischer e hoje feito com competência pela Lew’LaraTBWA, envolve também algumas personalidades – caso do ator Tony Ramos, cujo carisma é reconhecido por meio de pesquisas; e outro que, apesar da Friboi negar que foi uma estratégia que não deu tão certo, causou polêmica: o cantor Roberto Carlos, cujo contrato com a marca foi rompido na semana passada. Maior nome do show business brasileiro, Roberto não convenceu tanto como ator, mas deu recall para a Friboi. Nesta entrevista ao propmark, a gerente de marketing da JBS, Maria Eugenia Rocha, aborda estes e outros assuntos em relação à marca.

Como você vê a Friboi antes e depois da propaganda na TV?

A campanha com o Tony Ramos (criada pela Lew’LaraTBWA) estreou na TV em março do ano passado. Mas já faz três anos e meio que estamos trabalhando em consolidar uma marca em uma categoria de mercado que não existia. Friboi era o nome de um frigorífico que, depois da JBS fazer seu IPO, em 2007, e comprar algumas empresas – entre elas a americana Swift –, virou também uma marca. Mas que não tinha posicionamento, essência. Então, começamos um processo de entender como agregar valor a uma commodity, que era a carne. Nossa primeira campanha foi em 2011, criada pela Fischer, e contava a história do fundador da companhia, o Zé Mineiro. Logo depois vieram os Miniastros Sertanejos, também com a Fischer, em que o consumidor podia colecionar miniaturas de alguns artistas do gênero. E a partir daí notamos que poderíamos fazer algo pioneiro, com o publico interno, clientes e consumidores, e mudar o cenário da carne bovina. É o que temos feito hoje com a Lew’Lara.

Vocês não são o primeiro caso de um produto que tenta dar este salto do commodity para criar uma marca forte. Mas é o caso mais emblemático dos últimos anos. Como tem sido a relação com o consumidor?

Existem coisas curiosas – primeiro com o próprio público interno, e depois com o consumidor. Internamente, nossos funcionários passaram a ter muito orgulho do ponto de vista da marca. É nítida a mudança de comportamento por parte deles, e isso se estendeu para os consumidores. Antes, eles iam ao açougue e pediam um quilo de patinho. Hoje, existem outras questões que entram na hora da decisão sobre a compra da carne, eles passaram a ter uma relação diferente com a categoria. De onde vem a carne? Qual a origem dela? Nós realmente conseguimos plantar a questão da confiança, que além de ser o nosso conceito é algo que está mexendo de forma geral com o setor. Os consumidores, mesmo se não compram Friboi, passaram a buscar uma carne que possui selo de inspeção federal. O que realmente é muito importante.

A TV ainda parece ser o grande ponto da campanha. Há intenção de se intensificar para outras mídias, como o digital?

A propaganda na televisão é sim nosso grande meio de atuação na comunicação. Mas também temos feito um trabalho intenso em jornais e revistas, meios que acreditamos ser complementares, e também no digital. Mas não podemos negar que se o digital é um meio no qual todo mundo já está, para nós ainda é um aprendizado, em que olhamos como oportunidade de ampliar o que falamos do conteúdo da marca. Afinal, somos especialistas em carnes e viramos autoridade no assunto. Assim sabemos que temos também que exercer um papel de formação para a categoria. O digital é um lugar ideal para isso e estamos tratando-o como um dos pilares para 2015, quando iremos ampliar a nossa presença dentro dele. Estamos com um novo site quase pronto para ser lançado, um aplicativo para smartphones e outros projetos para mapear diversos pontos de contato com o meio.

Por outro lado, vocês formando o mercado devem atrair mais concorrência, com marcas vindo na mesma onda. O que pensam sobre isto?

É um fato que sabemos que vai ocorrer e também podemos tirar proveito. Existem dois pontos aí: o primeiro é que precisamos estar sempre à frente, e se não estivermos preparados podemos cair ou até ser confundidos. O segundo é que somos lideres do mercado e temos a missão de puxar o desenvolvimento da categoria, algo que dificilmente algum outro player faria, pelo tamanho e capilaridade que temos.

Quanto representa esta liderança?

Temos 25% de share no mercado e o segundo colocado menos de 10%.

Em uma matéria recente publicada pelo propmark, o consultor Jaime Troiano, falando sobre a Friboi, questionou o quanto este volume de investimento que a marca tem feito em mídia de massa realmente está criando uma marca que vai se sustentar, ou se os resultados não estão sendo simplesmente inflados pela comunicação. Como vocês estão se preparando para uma pós-fase desta campanha?

Somos muito novos para tomarmos uma decisão concreta em relação a estes investimentos. Nenhuma marca vai se sustentar com um trabalho de comunicação de um ano e meio, mas sim com consistência. Temos consciência disso, que precisamos de um trabalho a médio e longo prazo. Não podemos nos dar ao luxo que algumas marcas já construídas fazem e sair da mídia por um tempo. Mesmo as grandes marcas continuam fazendo um trabalho de comunicação forte – algumas com direcionamentos diferentes –, pois precisam estar na mente do consumidor. Fora isso, como já disse em relação ao digital, precisamos crescer em outras plataformas. Já demos um primeiro passo muito importante, e vamos manter, para lá na frente olhar para trás e ver que deixamos um legado. Fora que temos submarcas da Friboi que poderemos lançar no futuro, como acabamos de fazer com o Beef Burger, um produto diferenciado na categoria de hambúrgueres.

A parceria entre vocês e a Lew’Lara, apesar do pouco tempo, destaca-se pela consistência. Como você avalia o trabalho da agência?

É uma verdadeira extensão do marketing da JBS. Temos muito carinho pelos profissionais de lá e eles realmente entendem muito de nosso negócio. Isso não é algo tão comum no mercado, pois trata-se de uma das maiores agências do mercado, que tem outros grandes clientes na carteira e precisam faturar. Fora isso, no nosso caso, temos um negócio específico, complexo, em que não adianta replicar modelos de sucessos do mercado. Nossa indústria é muito peculiar, exige projetos tailor made, e a Lew’Lara tem conseguido realizá-los.

Quais são essas peculiaridades?

Nós desmontamos um boi, não montamos um produto. Já é algo bem diferente.

O Roberto Carlos foi uma decepção?

Não. Fizemos várias ativações com ele, de jantares com os consumidores a shows, que foram os pontos mais importantes para nós [a entrevista foi realizada antes da notícia do rompimento de contrato entre a marca e o cantor]. A própria propaganda na TV trouxe um conhecimento para a marca, independente de seus pontos positivos ou negativos. Foi algo bastante disruptivo dentro do mercado da comunicação e nos ajudou a chegar a um índice de conhecimento de público de 19% para 63%. Número que vai quase a 100% quando em pesquisa estimulada.

Quais os principais investimentos da marca além da campanha?

O capital humano. O desenvolvimento de pessoas é vital para a nossa companhia. São elas que irão mover seus produtos e fazê-los crescer. Além da comunicação nos diversos meios, também temos investido muito em trade marketing e no ponto de venda, em um mercado que representa cerca de 10% do varejo como um todo. Fazemos um programa de relacionamento em cerca de 400 lojas pelo país; treinamos os açougueiros; acabamos de lançar também, além do Beef Burger, o Friboi Reserva, um produto mais premium, com garantia de origem e a qualidade que uma marca com cortes selecionados deve ter; somos um dos patrocinadores do “Cozinha Sob Pressão”, reality show do SBT, em que também trabalhamos a ideia da formação do consumidor por meio de provas que façam as pessoas entenderem um pouco mais do universos da carne; e estamos presentes com força em todos os eventos do trade.

E em relação às exportações, como vocês estão posicionados?

Hoje a nossa prioridade total é o mercado brasileiro. Sabemos do desafio que temos de construir nossa marca em território nacional, e pode até ser que no futuro nós tenhamos uma política grande de exportações. Mas isso ainda não existe. Até estamos em alguns mercados no exterior, fazemos ações de marketing para o trade no Chile, um país que tem um mercado forte e onde temos uma presença legal, mas também não temos ações maiores de comunicação por lá.

Como vocês lidam com temas como sustentabilidade? Afinal, vocês lidam diretamente com animais e outros elementos da natureza.

Temos o sistema mais moderno de sustentabilidade do país. Falamos pouco dele porque é algo que estamos construindo e não dá para falar de tudo. Fazemos monitoramento via satélite dos fornecedores, que é algo necessário, já que trabalhamos com 36 mil diferentes por mês. Temos um trabalho pesado para conferir se estes fornecedores agem de acordo com as leis, se não possuem funcionários em ritmo de trabalho escravo. Compramos produtos apenas de origem sustentável, não desmatamos em nossas unidades fabris e nos preocupamos com itens como segurança alimentar, para minimizar impactos no aquecimento global. Inclusive já fomos fonte em evento global de sustentabilidade e inspiramos algumas práticas no mercado. Fora do viés da sustentabilidade, mas que também é importante, temos um trabalho bem bacana com jovens com Síndrome de Down. Somos um dos investidores do Chefs Especiais, programa de inclusão pela gastronomia, que iremos continuar apoiando em 2015.

Quais os principais planos para 2015?

“Abrir as nossas portas”, como fizemos em umapropaganda recente, pois nada melhor do que dar voz a nossos funcionários, como fizemos, para mostrar credibilidade; e intensificar o mote “confiança”. A cada fase subimos um degrau da escada. Percebemos que os consumidores confiam nas marcas quando elas mostram suas verdades.