Os chatos sempre existiram, desde os primórdios da humanidade. Mas agora, na era da Santa Inquisição Digital, eles foram empoderados com teclados e câmeras, ganhando espaço infinito no universo paralelo das redes sociais.

E o pior é que esses “Torquemadas modernos”, que incendeiam a internet com agressões de todos os calões, são sustentados por uma legião de seguidores, que alimentam o discurso de ódio com curtidas e comentários de apoio sempre que a vítima é um herege distraído, navegando pelo lado oposto de seus credos. E o mesmo acontece na contramão. Se há uma lição que aprendemos nestes tempos de extrema polarização política, é que a intolerância é ambidestra.

Com as marcas, não é diferente. Estão sujeitas a toda sorte de linchamento virtual a qualquer momento, por qualquer deslize de conduta ou da comunicação. Se considerarmos que sites e fanpages são as sedes das empresas na internet, nada justificaria o comportamento de alguns consumidores que, frustrados com o desempenho de produtos ou com a atitude de diretores, invadem seus espaços digitais para ofender e difamar. Difícil imaginar o mesmo na sede física da empresa.

Particularmente, acho positiva essa manifestação do lado negro da força no ambiente mercadológico. Sempre achei, desde quando caminhava pelo mais longínquo território do offline, onde nasci e me criei como profissional. Acredito que a “polêmica” é o quinto “P” do marketing, quando bem administrada pode render uma exposição enorme para a mensagem, de forma espontânea e gratuita. Aprendi isso fazendo campanhas de prevenção à aids para o Ministério da Saúde, nos idos de FHC. A questão era (e é) dogmática. Mesmo se fizéssemos um comercial apenas com a frase “Neste Carnaval, use camisinha” sobre fundo branco, haveria contestação de setores mais conservadores da sociedade. Já que esse tipo de reação era inevitável, fazíamos campanhas ainda mais ousadas e polêmicas, com filmes de grande impacto.

Dependendo da região do país, esse tipo de reação é mais ou menos intensa. Aqui no Paraná, já enfrentei algumas situações de conflito, mas o bom senso sempre prevaleceu e os ataques acabaram sendo defendidos pelos apoiadores das campanhas, que a defenderam espontaneamente. Ao final dessas experiências, ficou um grande aprendizado, que passei a compartilhar com minhas equipes e alunos:

1 – Não assumir a culpa se tiver a convicção de não a possuir (e o contrário é ainda mais verdadeiro);
2 – Ser rápido nas respostas e não fugir de nenhuma questão;
3 – Embasar os argumentos com critérios técnicos ou estatísticos;
4 – Nunca apoiar quem estiver defendendo seu ponto de vista (passa a ideia de que ele ou ela é inteligente e os outros não);
5 – Jamais perder a paciência e a educação.

Grandes empresas já descobriram a força de uma boa polêmica para sua imagem de marca e utilizam isso em suas estratégias. O segredo é avaliar antes todas as possíveis reações e se preparar para elas, com respostas previamente estudadas e definidas. Mas algumas corporações ainda possuem um protocolo digital evasivo. Em caso de qualquer problema nas redes sociais, a orientação é pedir desculpas e retirar o post do ar. Além de ser uma postura escapista, essa estratégia abre mão de todas as vantagens de uma discussão saudável sobre o tema, que pode ampliar a visibilidade da marca e a manifestação de seus defensores. Muitas vezes, renunciam à razão ou a um ponto de vista defensável apenas para fugir da briga. Não me parece uma atitude sensata. Nem na internet, nem na vida.

Renato Cavalher é head of creative strategy do Grupo OM – Marketing & Comunicação (cavalher@grupoom.com.br)