Dor no peito forte. Bem forte, mas que se confunde inicialmente com uma dor no estômago, alguma má digestão. Será? Dormência no braço esquerdo. Ah, estou somatizando! Coisa da minha cabeça. Estou em casa, domingo, voltando das férias. Dor contínua, piorando.
Paro e penso: “é melhor tirar isso a limpo, ir ao hospital. Não, não é nada. Mas prefiro não ter esta dúvida”.
Bom, meu nome é Marcio. Muito prazer. Tenho 43 anos. Sou casado e tenho dois filhos. Casado com a mesma “maravilhosa” pessoa há 22 anos. Sim, tenho um casal de pequenos. Uma menina, que chamo de Migalha, de nove anos, que adora música, teatro e é fã do Tim Burton. E um menino, que chamo de Farelo, de três anos, que adora futebol e bicicleta.
A sensação de ser pai é uma sensação que, contada, não consegue traduzir a dimensão exata do que é exercer a paternidade. Ninguém que ainda não é pai, ou não será por opção, vai conseguir realmente entender.
Voltando ao começo, há exatos seis meses eu enfartei. Enfartei em casa, num domingo à tarde, sem querer acreditar que estava enfartando. Mas no fundo, bem lá no fundo, acreditava realmente que eu ia morrer. No entanto, não morri.
Por uma anomalia benéfica do meu organismo, eu reagi – na verdade, meu corpo reagiu. Eu sou dois por cento das pessoas que se salvam para contar esta história. Para quem não precisa de explicações racionais, foi um milagre.
Opa! Mas por que tudo isso num artigo sobre inspiração? Então, sabe a sensação que não se explica sobre ser pai? É mais ou menos a mesma coisa de quase morrer. Não se explica. Mas vou tentar falar sobre o que me inspira a partir daí.
A sensação de quase morrer e entender com clareza, aos 43 anos, o quão frágeis somos (sim, eu estava bem até o momento do enfarte e não imaginava, nem no mais remoto dos meus pensamentos, que isso pudesse acontecer) me fez reclassificar todas as coisas da vida.
Aquela ordem de importância das coisas que teimamos em classificar de forma errada o tempo inteiro, ou pelo menos a maioria de nós.
O que de fato é urgente e o que de fato é importante? Esta é a reflexão que me fez passar a trabalhar melhor. Fez eu me relacionar melhor. Fez, inclusive, eu parar de discutir o que nem deveria ser motivo de discussão. Esta clareza, em quem tem, sempre fez a diferença. Nos tempos atuais, ela é ouro.
O que me inspira hoje não é pautado mais em urgências e, sim, no que é importante. Estou reaprendendo a viver. Tomando o café da manhã e não engolindo o pão. Almoçando e não engolindo a comida.
Aproveitando as pausas que temos de nos dar. Estou me inspirando nos gestos tomados do cotidiano, nos exemplos.
No estudar, no voltar atrás, no debater e no errar. Assumir riscos. Muitos riscos. Fazer tentando acertar, ainda que se possa errar. Inspira-me poder contar tudo isso. Tempo não é dinheiro. Tempo é uma fração da vida.
Somos super-heróis porque podemos fazer tudo isso na nossa condição de frágeis humanos.