Muita coisa mudou na publicidade, mas o intervalo comercial de 2021 do Jornal Nacional é exatamente o mesmo de décadas atrás: um espaço em que as marcas buscam sustentar a atenção de telespectadores, através de uma combinação de som e imagem que seja surpreendente, agradável e mobilizadora. Por isso, essa combinação costumava ser, primordialmente, criativa.

Razão pela qual, antigamente, se pagava muito bem a redatores e diretores de arte para que, em divertidos brainstorms, estimulassem, uns nos outros, insights que derivavam num roteiro, ao mesmo tempo, pertinente, original e emocionante. Foi assim que as mais importantes marcas foram construídas, através de campanhas memoráveis que mereceram a simpatia e a admiração dos consumidores.

Não por acaso, marcas consagradas pela mídia offline costumam ter as melhores performances na mídia online. Faço essa observação por conta de uma constatação preocupante: a falta de traquejo dos novos criativos na lida com a mídia convencional.

Não diria que isso me surpreende. Afinal, a formação do novo profissional de criação está focada, essencialmente, em como otimizar o desempenho de algoritmos. É um outro negócio. Só que, de vez em quando, essa cidadã ou esse cidadão é incumbido de uma tarefa dinossáurica: criar um comercial de televisão. Não é difícil imaginar o pânico: como assim, não é melhor criar um game?

Pode ocorrer de o cliente achar que não e insistir num roteiro para inserir no meio de um telejornal. E agora? Ok, também não é nenhuma coisa do outro mundo escrever uma historinha, com o produto no meio. E é mais ou menos isso o que é feito: uma historinha com o produto no meio. Que acaba sendo aprovada, pelo tanto que não põe em risco o emprego de ninguém, da criação da agência ao marketing do cliente. Lamentável que uma profissão que já foi tão glamorosa pela ousadia, hoje, se conforme em se livrar do abacaxi de criar, resolvendo o job do jeito mais fácil.

Eu tive o privilégio de ter chefes implacáveis em suas expectativas do que entendiam como um produto criativo. E posso assegurar que quase tudo o que vai para o ar, hoje, nos intervalos comerciais da televisão, não passaria pelo crivo dessa gente.

A culpa não é do novo criativo. Ele foi empurrado para isso, desde a faculdade, onde foi advertido de que as referências que o levaram a optar por aquele curso estavam todas superadas, que seus ídolos não passavam de um bando de velhos saudosistas. Só que de vez em quando cai na mesa dos coitados um job pedindo aquilo que aqueles caras faziam de melhor: criar narrativas capazes de surpreender pela originalidade e, assim, emocionar o espectador.

Poderia ser uma crueldade com esses jovens tamanha exigência se a expectativa de quem pede não fosse rasa o suficiente para que qualquer roteirinho mequetrefe atenda a essa mesma expectativa.

O resultado é vermos marcas consagradas por um trabalho criativo, reconhecido pelas mais importantes premiações da publicidade, hoje vagando ao sabor da mais inexpressiva mediocridade, independentemente da agência que as esteja atendendo.

Stalimir Vieira é diretor da Base Marketing (stalimircom@gmail.com).