Paulo, que acumula lá em casa as funções de filho residente e beletrista militante, casou no mês passado. Evidentemente as primeiras ideias surgidas na mente do jovem casal foi uma cerimônia menos careta, mais antenada com os novos tempos, sabe como é, mais solta. O evento no final faltou só tocar “Pompa e Circunstância” para se parecer com um rito matrimonial da Idade Média.

E é assim, sempre será assim, no seio das famílias grandes. De concessão em concessão, a modernidade quase que se limita ao direito da noiva de não casar virgem. E a trilha sonora, claro, que agora inclui algumas bandas de rock e “Eu Sei Que Vou Te Amar” nas rodinhas mais intelectuais, “Emoções” nas mais populares, e Cézar Menotti e Fabiano em… sei lá onde se toca Cézar Menotti e Fabiano na entrada da noiva.

Pois bem, a propósito de casamentos mais, digamos, “mudernos”, menos caretas, eu soube de uma edificante história que  ocorreu na cidade de Amaral Ferrador, na província do Rio Grande.

Não é que Tavinho, filho do Coronel Guedes, conheceu uma prenda de Porto Alegre e se enrabichou a ponto de querer casar na igreja, com apenas quatro meses de noivado? Pois foi. Prima Deolinda, alçada à gloriosa função de mestre de cerimônias, chamou o melhor e mais reconhecido buffet de Capão das Canoas para caprichar nos comes e bebes e convocou um padre de Porto Alegre, conhecidíssimo pelos sermões emocionados que fazia.

Duzentas pessoas compareceram à capela local para ver o casório e conhecer a noiva, uma loura deslumbrante, que após uma hora de atraso brindou os circunstantes com um vestido branco perolado, ousadamente tomara que caia. O padre, vestindo uma batina colorida, de tênis e rabo de cavalo, começou o aguardado sermão: “Dois filhos de Deus vão se unir pra sempre, sob as bênçãos da igreja. Eu queria lembrar a vocês a necessidade do amor, da compreensão, da cumplicidade num casal. Mas também recomendar que não esqueçam do bom e velho sexo, sem o qual não há matrimônio que resista”. Os convidados se entreolharam. Era inusitada a abordagem. Mas, afinal, são coisas da capital, pensaram. O padre tomou um gole do vinho da missa, pigarreou e foi adiante.

“Mas nessa área, o sexo, eu queria lembrar que não basta um papai e mamãe burocrático, aos sábados à noite, só para cumprir tabela. O sexo precisa ser bem feito, criativo, caprichado, garantindo a satisfação do homem e, por que não, a fidelidade da mulher. Aliás, a mulher de hoje gosta da coisa quase tanto quanto o homem. E quem não tem em casa procura na rua, já diziam nossas avós.” A mãe do noivo apertou a mão do marido. O que poderia vir a seguir?

“Minha filha – voltou o padre e, dirigindo-se à noiva – tu não deves vir com frescuras de dor de cabeça. E tu – disse ao noivo – vai ter que também ir com calma e respeitar as vezes em que ela não estiver afim. Quando for o caso, nada de porrada, e muito menos ir às putas por vingança.” A essa hora a igreja já estava indócil. As mulheres se abanavam, com palpitações.

E o padre ia se entusiasmando com a própria eloquência: “Outra coisa, não permita que vocês fiquem só no papai e mamãe. Experimente de tudo, que tudo é permitido. Dentro do sagrado matrimônio não há sagrados e nem profanos. Quem faz gostosinho e com alegria está de certa forma louvando. E isso é bom para os ouvidos do Senhor!”.

Algumas mulheres ameaçaram desmaiar. Os mais jovens começaram a rir. O padre continuou: “Para preliminares e mesmo pra sexo anal, eu recomendo o Creme Virgem Again, que é testado dermatologicamente e não contém silicone. E, prosseguindo, falarei do sexo oral”.

A igreja já era um pandemônio. O padre pega a vela e mostra para a congregação. “Comecemos pelo papel da mulher. Imaginem isso aqui sendo o pau do marido…” A esta altura alguns fiéis estavam dispostos a cobrir o padre de porrada. O padre gritou: “Esperem aí! Eu não sou padre! Sou ator. Fui contratado pelo Estevão, padrinho do Eduardo, para fazer essa brincadeira no casamento do Edu com a Tatiana!”.

Foi a vez do Coronel, pai da noiva, se espantar: “Eduardo? Tatiana? Ficaste louco, bagual?”. Ao que o falso padre olha espantando para a congregação, ou melhor, para a zona armada, e tenta se explicar: “Porra, desculpem. Me enganei de igreja. Mas os conselhos que eu dei continuam servindo, ainda mais pra vocês, que moram nesse cu de mundo”. E saiu correndo.

Pode ser mentira. Nem sei se existe a cidade de Amaral Ferrador. Mas um bom cronista não confere os casos que ouve contar. Passa adiante, se possível com alguns retoques. Segundo a velha tradição jornalística, comprovada diariamente na maioria de nossos órgãos de imprensa, a verdade é um detalhe que não tem o direito de interferir numa boa história.