O Zé Roberto Orsi e eu estávamos fazendo prospecção para a Thompson e fomos apresentar as credenciais da agência para um cliente multinacional quadradíssimo, um verdadeiro convento.
O próprio Zé, com a candura que o fazia conhecido, deu instruções:
– Arrebento o rabo do filho da puta que falar bobagem.
Claro que boa parte da peroração foi dirigida a mim, injustamente identificado como um sujeito propenso a – digamos – maiores liberdades de linguagem.
– O veado do Lula vai levar um pé no saco no primeiro ‘porra’. Piadinha então eu mato lá mesmo, garantiu nosso querido vice-presidente, entrando no velho Maverick da Thompson.
E encerrou desta vez falando para o motorista:
– Ô pocapica, se manda pra porra do prospect.
E lá fomos nós, com aquelas milhares de coisas que as agências gostam de mostrar nessas horas.
Corta e passa direto para a sala de reunião do cliente, no centro da cidade, um prédio de escritórios mais ortodoxo que caixa de Maisena, como diria Luís Fernando Veríssimo.
A própria sala de reuniões era um exemplo da cabeça da casa: toda em mogno escuro, mesa de mármore, fotos dos presidentes nas paredes.
Comportamo-nos magnificamente. Tratamos o gringo com cordialidade, mas com todo respeito. Falamos todos os lugares comuns dessas horas, caprichando no inglês.
The book was on the table, pois só se ouviam frases de puro business english.
Um show de aculturamento.
Tudo ia bem demais. O prelúdio do desastre.
Às horas tantas, entra na sala a moça do café empurrando um carrinho de chá, com delicados petit-fours, anunciando um coffee break.
Falei moça do café? Desculpem. Entrou um monumento luxuriento. Um aperfeiçoamento da raça.
Ela tinha tudo em cima, desde pernas magníficas a olhos que soltavam faíscas.
E os peitos? Não falo deles para não fazer injustiça à bunda. Como diria Gustavo Dias Leite, mulher para a gente seguir só com a roupa do corpo.
Mais ainda: mostrar para a família e receber aplausos dos filhos.
Ficou aquele silêncio pesado, ouvindo-se ao longe apenas alguns suspiros.
– Aceita chá?
– Chá, depois, quando você quiser.
– Como?
– Eu como, meu amor!
E assim foi, embora todo mundo estivesse conseguindo disfarçar. Até que o Zé, escarrapachado numa poltrona, olhou a mulher logo na hora em que ela se abaixava para pegar uma xícara e disse com uma voz alta para ser ouvido do outro lado da rua:
– Lula, um rabo destes bem administrado rende mais do que uma paróquia!
O cliente? Está na Thompson até hoje, já totalmente inserido no contexto da modernidade.
A moça? Casou-se com um outro presidente de multinacional e saiu há dois ou três meses na revista Caras, ainda um monumento.
Mostrava aos leitores suas casas de campo, seus cavalos e o helicóptero que a leva a Angra.
O Zé sabia das coisas.