Todas as manifestações da natureza e dos homens carregam o tal de vício inerente. Pode até não se manifestar. Pode ser até que não consigamos nominar ou identificar. Mas estão lá. Vidros quebram, correntes caem, pessoas desabam, criaturas morrem. O vício inerente à vida é a morte. Todos somos mortais. Todos, sem exceção. Inclusive os acadêmicos. Mesmo tendo sido feitas para durar, as empresas também nascem carregadas de vícios inerentes. E um dia não resistem e partem. Mas até lá é preciso mantê-las vivas. E a única maneira é garantindo sustentabilidade. Um movimento ascendente e equilibrado em todos os sentidos e forças.

A expressão volta à tona pelo brilhante livro que virou filme – melhor ainda que o livro – e tem essa denominação. E por referências ao tema no correr da história como a de Winston Churchill: “O vício inerente ao capitalismo é a distribuição desigual de benesse; o do socialismo é a distribuição por igual das misérias”.
Nos 60 anos do marketing, completados em novembro de 2014, muitas outras “patologias” conviveram de forma permanente com o vício inerente.
A primeira delas e, na pré-história do marketing, produtos que não morressem jamais. E assim foi fabricada e acesa, em 1901, uma lâmpada que jamais se apagou. Está na cidade de Livermore, na Califórnia, e comemorou seus primeiros 110 anos de vida iluminada em 2011. Foi feita para não morrer, num momento do mundo em que se acreditava que produtos deveriam durar para sempre. Mas veio a primeira guerra e nos acordos de paz a consciência de que produtos precisavam morrer para que novos produtos fossem fabricados, empregos garantidos e a economia girasse. E fizesse o tal do movimento ascendente e equilibrado. Nascia aí a obsolescência planejada. Motivo de indignação de muitos, seguramente não informados de sua necessidade existencial – nossa.
Depois da Segunda Guerra, o mundo alcança um desenvolvimento espetacular em todos os sentidos. As inovações ocupam a cena e as pessoas começaram a viver a síndrome da superação e param de comprar. Vivem o medo e a vergonha de comprar a última novidade de hoje que virava tranqueira no dia seguinte. De novo as indústrias se reuniram e decidiram administrar melhor as inovações criando o chamado novo prolongado.
E aí nasce o microchip e coloca tudo por terra. A inovação, que se limitava ao horizontal – mudança de comportamento das pessoas – ou ao vertical – inovação nos produtos –, passou a colocar em risco todas as posições supostamente inabaláveis com uma espécie de inovação transversal. Que junta produtos e comportamentos e relê os negócios de uma forma diferente. Que contempla toda a floresta e não exclusivamente a árvore. Os tais negócios inabaláveis derretem como gelo. Que o digam as redes de hotéis colocadas em corner por um simples aplicativo.
Assim, e agora, todos de olho e reconhecendo que o vício inerente permanece vivo como nunca. Lembrando a todos nós, empresas, produtos e pessoas, que, mais cedo ou mais tarde, vamos partir. É o tal do ciclo da vida. Mais ou menos como nos ensinou Vinicius sobre o amor – “Que não seja imortal, posto que é chama. Mas que seja infinito enquanto dure”.
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