Já em 2019, logo após a edição do Cannes Lions daquele ano, publiquei aqui mesmo, nesta coluna, um artigo com o título O marketing do bem está vencendo. O artigo foi escrito logo após a realização de uma edição do Cannes Lions Festival, como faço com este agora.
Ao analisar os cases vencedores do festival daquela época, ficou clara a tendência de as empresas, apoiadas por suas agências, dedicarem mais atenção às causas e propósitos por um mundo melhor.
Não que as vendas e o lucro estivessem num segundo plano: o marketing tinha (e continua tendo) a finalidade de fazer as empresas venderem mais e prosperarem.
Mas a diferença era a sintonia aos anseios de uma sociedade cada vez mais preocupada com a atitude das empresas, no sentido de melhorar o mundo e não só vender mais a qualquer custo.
Era uma constatação inequívoca de que o capitalismo selvagem vem dando lugar ao capitalismo consciente. Pois bem, o tempo passou, veio a pandemia, não tivemos a edição 2020 do festival e, agora, em 2021, o Cannes Lions foi retomado, ainda que virtualmente, sem o evento presencial em Cannes.
E o que vemos? Mais de 90% dos cases vencedores de Leões (principalmente Grand Prix) têm uma pegada social. Cases que ajudam as pessoas a reafirmar sua identidade ou até mesmo obter o registro de uma.
Como o da McCann NY para Mastercard, ganhador de Grand Prix na categoria Brand Experience & Activation, pelo qual as pessoas puderam usar o nome que desejam no seu cartão de crédito; ou o da VMLY&R São Paulo para a Starbucks, que ganhou Grand Prix na categoria Glass: Lions for Change, que facilitou pessoas (principalmente trans) a processarem alteração no registro do seu nome, passando a adotar o nome escolhido agora; e o da Ogilvy Paquistan para a Telenor, que ajudou milhões de carentes do interior do Paquistão a obterem seu registro de nascimento e passarem a “existir”.
Outros cases, voltados a ajudar produtores rurais a processar a custosa transição da cultura convencional para orgânicos, como o da FCB (Chicago e NYC) para a cerveja Michelob Ultra Pure Gold (AB Inbev), ganhador de Grand Prix em PR, fazendo contratos com produtores, pagando até 25% a mais por insumos orgânicos, estimulando-os a fazer a transição das suas plantações; ou o do Carrefour, que já tinha peitado as leis francesas para vender orgânicos de sementes não registradas em suas lojas (case ganhador de Grand Prix em 2019), e agora cria o Act for Good, inscrito pela agência Marcel, de Paris, também com a promessa de apoiar produtores dispostos a fornecer produtos orgânicos.
Case que ganhou Grand Prix na nova categoria Creative Business Transformation. São cases que mudam a vida das pessoas (físicas ou jurídicas). Como aqueles em apoio a comerciantes que tiveram seus negócios quase destruídos pela pandemia.
É o caso da Publicis Itália para a Heineken, ganhador de Grand Prix em Outdoor, transformando as portas fechadas dos bares em mídia, garantindo um precioso recurso extra para a sobrevivência dos comerciantes; ou aquele da Draftline, da Colômbia, para a AB Inbev, ajudando a criar um sistema de ecommerce de vizinhança para bares. Case que ganhou Grand Prix na categoria Creative eCommerce.
Na área da saúde e bem-estar, então, foram diversos cases destacados, como o premiadíssimo Womstories, da AMV BBDO de Londres para Bodyform/Libresse, o qual desmistifica e promove maior conhecimento do útero, ajudando as mulheres a evitar doenças.
A mesma marca já havia sido destaque no Cannes Lions 2019 com o fantástico case Viva la Vulva, desmitificando a vagina. Este ano foi Grand Prix em quatro categorias! E há ainda muitos cases que retratam ações de empresas em benefício da sociedade, como um todo, e não só dos seus clientes. Este é um novo momento para o marketing em tempos de valorização dos princípios ESG. Um momento que devemos comemorar e abraçar.
Alexis Thuller Pagliarini é presidente-executivo da Ampro (Associação de Marketing Promocional) (alexis@ampro.com.br)