Sergio Gordilho, copresidente e CCO da agência Africa, não pode reclamar de 2019. O profissional foi eleito um dos mais inspiradores em marketing, mídia e cultura do mundo pela Adweek. Sua agência obteve o melhor desempenho no festival El Ojo de Iberoamerica 2019, além de ser a mais premiada do Brasil no One Show; e da América Latina, no D&AD; além de celebrar a chegada de contas como a do Grupo Duratex. Durante encontro com a redação do PROPMARK, Gordilho relembrou momentos marcantes da carreira, aprendizados com Nizan Guanaes e a importância do marketing político, entre outros temas.

Questionado sobre o seu início de carreira pela editora-chefe do jornal, Kelly Dores, Gordilho, que nasceu na Bahia, explica que seu pai e seu avô eram arquitetos, portanto, esse era o caminho mais natural. “Comecei trabalhando com isso, mas percebi que não era a minha, pois eu sou supercompetitivo, como qualquer publicitário”, explica.

Obviamente, ele optou por abandonar de vez a arquitetura, mas ainda traz consigo ensinamentos da área. “Minha formação não é de comunicação, e para mim foi muito importante”, explica, dizendo que sua profissão de origem traz questões antropológicas para entender o ser humano. “Você tem de conseguir decifrar uma pessoa e transformar tijolo e cimento no sonho dela”, analisa.

Questionado pela editora Neusa Spaulucci sobre seu início na comunicação, o executivo comenta que tudo começou com um estágio na baiana Propeg. Gordilho percebeu uma certa “desvantagem” da região. “O mercado nordestino é muito complicado. […] Basicamente, lá você só faz três coisas: marketing político, varejo e imobiliário”, resume.

A convite de Duda Mendonça, ele começou a expandir seus horizontes e foi trabalhar com marketing político em São Paulo, algo “superimportante” para sua carreira. “A gente vive muito no ar-condicionado em São Paulo”, explica, dizendo que político é sobre entender o Brasil. “Campanha política tira a frescura. Porque você chega lá dentro e você precisa fazer as coisas, você tem de fazer uma marca que possa imprimir e pintar com pincel no muro”, recorda.

Indagado pelo editor Paulo Macedo acerca das particularidades do período, Gordilho fala que aprendeu bastante. “O marketing político dá essa sensação dessa verdade, hoje o que mais vale na comunicação é a verdade. A gente passou a vida criando mitos e vendendo. Hoje precisamos criar verdades, compartilhá-las e fazer com que as pessoas entendam. O marketing político te dá isso. Você precisa buscar a verdade do candidato”, explica Gordilho.

Era um outro momento, como bem ressalta o executivo. A política não estava dividida como hoje e o brasileiro ainda estava aprendendo a viver em sua democracia plena. O profissional conseguiu juntar um bom dinheiro trabalhando para Mendonça e resolveu se especializar fora do Brasil, indo para Royal College of Art, em Londres, onde estudou design.

Quando voltou, Nizan ouviu que “tinha um baiano que trabalhou com o Duda muito tempo” e se interessou, e Gordilho iniciou sua caminhada na DM9, especificamente na estrutura de varejo da agência. Um período singular da publicidade brasileira. “Chegava sexta-feira e alguém falava: ‘vamos para Nova York?’”, relembra. A parceria culminou na abertura da Africa em 2005, agência que Gordilho copreside nos dias de hoje, ao lado de Marcio Santoro.

Gordilho classifica Nizan como um grande “formador de equipe”. Hoje, o executivo busca pontos específicos nos profissionais que vai contratar. “Eu busco no olho do cara a ambição. Nossa indústria é ambiciosa”, diz. “As pessoas aprendem na Africa a ter foco no resultado, porque eu acho que o criativo ingênuo não vai para frente, é aquele artista que não tem dinheiro para comprar tela”, compara.

Questionado pela repórter Marina Oliveira sobre a real função da profissão, Gordilho fala que é preciso que publicitários tenham em mente o objetivo das ações: “a gente precisa entender que nosso negócio é fazer dinheiro, é uma economia pulsante, a gente no final está ali para vender, no final é essa a intenção”.

Perguntado pelo editor do site Leonardo Araujo sobre quais outros pontos são essenciais para o profissional da área, Gordilho menciona o entusiasmo. “Na publicidade você precisa ter paixão pelo que está fazendo”, afirma. “Falava-se que nossa indústria era 20% inspiração e 80% transpiração. […] A máquina tem de fazer o trabalho da transpiração e não da inspiração”, ressalta.

Na Africa, a criatividade é o mindset da agência como um todo, “não é de um departamento”. Mas o copresidente alerta: “tão importante quanto ser criativo é ser rápido”. O executivo define o período atual como “um momento Washington Olivetto” que, para ele, é um dos maiores gênios da profissão. “Ele era um cara de conteúdo. […] Ele sempre foi muito bom de storytelling”, relembra.

No futuro, Gordilho crê na existência de dois tipos de negócio: “a gente vai ter as grandes consultorias e vai ter os grandes centros de criatividade”. Na Africa, a intenção é não apenas avaliar, mas oferecer a solução. “Não posso ser um cara que só está no diagnóstico, eu tenho de trazer a cura”.

Nossa grande próxima fronteira, na opinião de Gordilho, será a voz. “Eu tenho uma equipe dentro da Africa só pensando em como explorar Alexa, Google Assistant… Porque eu tenho marcas lá dentro como Sadia que eu quero perguntar: ‘Alexa, como eu faço o Peru Sadia?’, e ela tem de me responder. Vou deixar isso para outros? Não vou, isso é criatividade”, revela.

Na Africa, segue o criativo, tudo é focado em negócio. “Eu não faço nada que não seja pensando em negócio. Agora, pensando que somos da indústria da criatividade, toda a criatividade que gere negócio. Temos de parar de pensar um pouco do negócio da publicidade e pensar de negócios na publicidade. […] Meu maior prospect está dentro dos meus clientes, porque eles já estão em casa, são grandes e têm muitas possibilidades”, ensina.

“A gente construiu uma agência onde as coisas acontecem […]. Passamos muito tempo criando para formatos e agora a gente precisa criar formatos para as nossas ideias”, comenta. Para completar, ela afirma: “não adianta você ter ideias em gavetas”.

Sair do país não é opção para o criativo. “Eu quero ser o Alex Atalla, eu quero ter um dos melhores restaurantes no Brasil. É um país cheio de oportunidades”, ressalta. Mas é preciso equilíbrio nos desejos: “a agência que só pensa em números vira uma merda, e a que só pensa em criatividade fecha […]. Durante muito tempo a gente viveu na briga entre chegar nos números e soltar a criatividade. Aí fica essa disputa. A gente juntou as duas coisas. Assumimos o seguinte: a criatividade rende negócios”.

Em 2019, a agência contratou Camila Fidélis como gerente de gestão de pessoas para fortalecer a diversidade na empresa. “Nunca as diferenças fizeram tanta diferença”, afirma Gordilho. “A gente hoje vive problemas que não estávamos acostumados. Esse problema traz soluções que a gente não tem repertório para isso. Então, só vai ter repertório para isso quando tiver uma combinação de pessoas completamente diferentes dentro da mesma estrutura. E é isso que a gente está buscando na Africa”, explica Gordilho.

A Africa, que durante muito tempo abdicou de premiações, hoje tem uma visão aliada ao objetivo de negócio do cliente. “A gente conhece bem as marcas que a gente trabalha, então a gente precisa procurar um briefing dentro das marcas e não procurar esperar o briefing da marca. Cannes e as premiações dão essa possibilidade pra gente. Mas para isso precisa ter um critério: eu crio para os meus clientes, que daí eu consigo dinheiro”, explica. “É muito fácil o cara que não ganha Cannes dizer que Cannes é uma merda”, complementa.

Perguntado se concorda que hoje há menos Nizans, Olivettos e Dudas no mercado e mais equipes competentes, Gordilho diz o seguinte: “hoje o nosso trabalho é muito mais complexo e isso faz com que a equipe seja mais importante. Mas sempre vai precisar ter um líder”.