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Em 1974, Washington Olivetto e Francesc Petit criaram um clássico que ganhou o primeiro Leão de ouro brasileiro no Festival de Cannes. O filme O homem com mais de 40 anos, feito para o Conselho Nacional de Propaganda, exaltava os profissionais mais velhos. De lá para cá, a expectativa de vida aumentou e a idade dos bons profissionais também.

Uma pesquisa da Ipsos, mencionada num estudo da área de data e estratégia da Leo Burnett Tailor Made, mostra que, globalmente, há muito pessimismo com relação ao avanço etário, com preocupações financeiras e com a saúde principalmente. Metade da população global está apreensiva com a velhice. O Brasil lidera o ranking, com 72% dos entrevistados se declarando preocupados. Mesmo assim, os profissionais de agências nacionais se mostram animados ao elencarem os principais desafios de ser um publicitário com mais de 50.

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“Há pessoas que quando chegam perto dos 50 já estão meio cansadas de querer aprender. Eu adoro, não tenho a menor vergonha. Uma questão importante é não desistir de aprender”, diz Claudia Almeida, PMO da Africa Corporate e Varejo. Sua colega de agência, Sibely Silveira, diretora de criação, afirma que um dos segredos para longevidade é manter a curiosidade. “Estou sempre querendo saber o que está acontecendo, qual livro mais legal, série que está rolando, filmes do cinema, grupo que está bombando… A curiosidade é o que move a nossa profissão”, afirma.

“Existe o preconceito no Brasil que com mais de 50 anos você está obsoleto. Isso muito impulsionado pela pressão da nossa economia. Para o mercado, esse profissional é caro. Talvez meu pai com 50 anos estivesse velho. Nossa geração está mudando isso. A publicidade sempre foi um lugar de novidades e é extremamente atraente para os jovens e um dos principais desafios para qualquer um é acompanhar as novidades, a linguagem e as tendências. Manter-se sempre informado e motivado. Esse é o maior desafio”, afirma Ricardo Papp, diretor de criação da SunsetDDB. Seu colega de agência, Osvaldo Speratti, redator de 58 anos, afirma que o principal é não deixar que as ideias sejam velhas. “Manter-se atualizado é fundamental, claro. E não pensar que você é tão velho. Os outros é que são”, comenta.

E os jovens?
Não é fácil ter 50 quando o colega de área tem 21, certo? Nem sempre. “A vida é um eterno aprendizado. Os mais jovens aprendem comigo e eu com eles. Quando se tem experiências, você deve passar para frente, não existe motivos para reter conhecimento, e quando fazemos isso expandimos a nossa visão de mundo e aprendemos novas formas de exercer o nosso trabalho. Se guardamos o conhecimento para nós mesmos, ele acaba perdendo valor”, explica Israel Quirino, RTV da Y&R que tem 57 anos de idade.

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Para Fabiana Maia, diretora de grupo de mídia da Talent Marcel, que acabou de fazer 50 anos, a relação com os jovens é de troca. “Eu acho que a gente tem um valor que é imensurável nesse sentido da experiência porque, por mais que essa juventude seja superativa e antenada, a maturidade, a experiência que a gente traz para salvar determinadas situações e resolver determinados problemas é uma coisa que só o tempo dá. É uma troca no sentido de que a gente está sempre tentando fazer isso. Uma troca da experiência versus um novo aprendizado, um novo olhar”, afirma.

Saber ouvir é tão importante quanto falar, conforme opina Fernanda Moura, diretora de produção integrada da Leo Burnett. “É sempre uma troca. Precisamos estar sempre atentos ao novo, a escutar o outro. Os jovens têm ideias diferenciadas, loucas, ousadas; e a gente tem a experiência e boas ideias também. O equilíbrio é tentar juntar as duas pontas e fazer funcionar”, analisa.

Claudia, da Africa, é enfática: “os jovens não têm mais vínculos”, diz. “A propaganda precisa de pessoas apaixonadas pelo trabalho, pelo job que elas estão fazendo. No meu caso, que sou atendimento, apaixonadas por pessoas, e eu acho que essa é uma construção difícil para os jovens de hoje. O que eu tento ensinar é que se você não estabelecer vínculo, você não vai persistir em nada. Você não vai resistir a nada. Não existe uma vida sem vínculo, o ser humano foi feito para ter vínculos. Uma geração que não quer gerar vínculos é uma geração sem relações. Na minha área, sinto muito essa dificuldade. Eu brinco que eu sou apaixonada por gente, as pessoas falam: ‘ah, mas cliente é tão difícil’. Todo mundo é difícil, se relacionar é difícil. Então, na verdade você tem de construir vínculo, construir parceria”, analisa a profissional.

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Vantagens e desvantagens
O tempo passa, o tempo voa e os publicitários mais velhos seguem trabalhando. Mas quais serão as maiores vantagens e desvantagens de ter cinco décadas de vida e trabalhar com propaganda? “A maior vantagem é justamente a sabedoria. Os tempos vividos e os ensinamentos acumulados que tornam muito mais fáceis o meu dia a dia. A maior desvantagem é não ter nascido na era do conhecimento digital. Se adaptar a novos códigos que não são tão naturais da minha geração. No fim do dia, é tudo meio parecido. A experiência te ajuda a entender coisas novas”, opina Claudia, da Africa.

“Sem dúvida, uma das principais vantagens é o conhecimento e principalmente o autoconhecimento. Aos 50, é possível que você já tenha refletido sobre o significado do seu trabalho e como quer viver essa experiência, ainda com tempo e energia para novas possibilidades”, explica Fernanda Moura, da Leo Burnet.

“A desvantagem é que, queira ou não, você sabe que já viveu mais do que tem para viver e se dá conta que poderá não ter tempo para ler tudo o que gostaria, fazer as viagens que ainda gostaria, viver mais ao lado do seu amor e por aí vai. A vantagem é que a maturidade te deixa consciente disso. Você percebe que não tem tempo a perder com picuinhas e procura viver intensamente todos os momentos”, analisa Speratti, da SunsetDDB.

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Quando parar?
Empresas como a Unilever buscam estagiários sêniores para suas equipes. O mercado dos mais experientes anda aquecido. Mas se há paixão pela profissão, também há o momento de descansar. Afinal, o ser humano não é uma máquina acrônica. Quando parar? “O que vai definir o quanto mais tempo é o corpo e a mente. Ou seja, enquanto estiver bem em ambos, pretendo me manter ativo profissionalmente”, explica Quirino, da Y&R.

“Eu tenho a sorte de trabalhar com o que gosto. Acho isso um privilégio. Eu não fico pensando numa questão de data e sim se estou feliz. Não é apenas sobre motivação econômica, enquanto tiver desafio, alegria, prazer em produzir, pretendo continuar. Quando cansar, vou achar algum outro desafio diferente, por enquanto ainda sinto que tenho muito o que aprender na minha área. As pessoas estão vivendo mais e melhor e isso traz uma nova necessidade, uma vontade de continuar sendo produtiva por períodos mais longos”, explica Fernanda, da Leo.

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“Vinha de um emprego de exatos 15 anos numa agência líder de mercado. Saí em outubro de 2018. Achei que aquele teria sido o meu último emprego numa agência. No início do ano recebi um convite da SunsetDDB e aceitei. Enquanto estiver feliz e o meu trabalho gerar resultado para os clientes, continuarei”, finaliza Speratti, redator da SunsetDDB. Seu colega de agência, Ricardo Papp, fala que pretende trabalhar “até morrer”. “Ou até ter saúde pra isso. Não pretendo parar. Eu gosto muito de trabalhar, de produzir. Se não for na publicidade será em outra área. Dá para ser criativo em qualquer segmento e em qualquer idade”, afirma.

“Se você me perguntar: o que te move? Eu vou responder: paixão. Eu acho que um monte de jovem que trabalha aqui é velho. […] Nem toda pessoa que é jovem tem espírito jovem. Eu acho o jovem de hoje bem cansado. Às vezes eu me acho muito menos cansada para aprender, para fazer, para entender do que o jovem. Isso é tão relativo. Agora, se você me perguntar se eu tenho o mesmo pique aos 50, não, claro que não. É diferente”, confessa Claudia.

Se levarmos em conta as opiniões aqui expressadas, talvez Olivetto devesse refazer seu clássico filme dos anos 1970, mas com um novo título e conceito, alinhados ao século 21: Homens e Mulheres com mais de 50 anos.

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