Certa vez, escrevi aqui “O SAC morreu! Viva o SAC!”. Tratava da obsolescência dos serviços de atendimento ao consumidor tradicionais. A empresa a que me referia como exemplo de ineficiência na atenção a uma queixa de cliente, reagiu de maneira magnífica, ao entrar em contato para dizer que o artigo virara pauta de reunião e contribuído para aperfeiçoar os procedimentos. Essas coisas me encorajam, como consumidor e como profissional de marketing a continuar apontando problemas crônicos nas relações de grandes empresas com seus clientes. O mais recente a que experimentei pessoalmente foi com a operadora Claro.

A Claro foi minha operadora por quase duas décadas. Não é mais, desde a semana passada. Por uma simples desatenção. O interessante é que o que me levou a procurar o fornecedor não foi nenhum evidente descumprimento de contrato. Provavelmente, ele tenha apenas seguido as regras e eu, por ignorância ou negligência, não tinha me atentado para o risco que corria. Paguei um preço extorsivo por isso. Mas repito, não necessariamente ilegal. E é aí que reside a falta de sensibilidade (ou de inteligência) da empresa. Quando recorri ao portal e enviei uma mensagem, me dizendo surpreso pelo valor absurdo que me cobravam por uso de roaming no exterior, o que recebi de volta foi uma mensagem automática, aborrecida e burocrática. Não é porque você não cometeu um crime formal, ao surpreender o seu cliente com a aplicação de uma cláusula contratual relativa a um serviço normalmente não utilizado, que deva se comportar com indiferença diante da surpresa negativa dele.

A minha percepção foi a de que a Claro apenas ocupou-se de deixar subentendido que o problema era meu e não dela. De fato, o problema era meu, que usei o roaming de maneira inadequada por não dar atenção à possibilidade de uma cobrança tão elevada. Na minha mensagem, no entanto, além da queixa por me sentir extorquido, ainda aventava a possibilidade de trocar de operadora, depois de quase 20 anos. Aparentemente, o sistema está programado apenas para avaliar a razoabilidade da reclamação e a legalidade do que foi aplicado. Para a sua resposta, automática, não pesam, certamente, subjetividades como “quase duas décadas como cliente” e “pensando em trocar de operadora”. Digamos que reage como um juiz que fala a uma mulher cheia de hematomas: “mas você sabia que casou com um homem violento”.

A resposta robótica da Claro me levou à determinação de mudar de operadora. O interessante é que, a partir do exato momento em que fiz a migração, o mesmo robô começou a me fazer juras de amor e prometer o céu. Nada mais ridículo, nada mais impróprio, nada mais antimarketing! Aliás, uma vergonha para o marketing! O que a Claro me oferece agora é melhor do que eu obtive na nova operadora. Mas eu não quero. Aliás, deixei isso bem claro para o robô. Provavelmente, ele ticou e passou para o próximo job. Verdade que o Brasil ainda é um país carente de serviços e em que a quantidade da demanda compensa a economia em qualidade por parte dos fornecedores. Mas é bom estar atento para o futuro. Isso tende a mudar. E a associação das marcas às experiências individuais poderá fazer toda a diferença entre a vida e a morte delas. Afinal, nenhum câncer começa por uma metástase. Mas por um carocinho negligenciado.

Stalimir Vieira é diretor da Base Marketing (stalimircom@gmail.com)

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