Gilberto Corazza, vice-presidente de adsales da Turner, está otimista com o mercado de TV paga no Brasil. Uma das suas bandeiras é defender que a participação de pay TV no bolo publicitário está aquém da relevância do meio e acha que parte do investimento das marcas em digital deve ser direcionado para os canais fechados. “Existe um mundo digital importante aqui e tem algo que os players digitais não têm, que é o conteúdo”, diz ele. Segundo Corazza, as principais marcas da Turner, como TNT, Warner, Esporte Interativo e Cartoon Network, de alguma forma, já têm uma extensão no TV Everywhere. Confira a seguir a entrevista do executivo.

Marçal Neto/Divulgação

Quais são as suas expectativas para o ano?

Tem um otimismo declarado por todos, com a expectativa de uma recuperação importante da economia, senão rapidamente, já uma aceleração a partir de agora com um crescimento de PIB razoável, e uma visão mais otimista ainda a partir de 2019. Mas tem uma retomada importante a partir de 2018 para a economia. Acho que isso vai afetar todas as indústrias. Tem o sentimento positivo de que as coisas vão melhorar, o que já é muito importante. Quando a gente insere o mercado de comunicação, isso vai impactar positivamente. Pay TV vem num crescimento de resultado nos últimos anos muito forte, com dois dígitos em todas as áreas, quer seja em audiência, assinaturas ou investimento publicitário. Em 2017, a gente deixou de crescer como vinha crescendo, em função clara da desaceleração da economia. Houve uma desaceleração de investimento em todos os players e pay TV acabou sentindo. 2017 não foi um ano ruim, mas não foi como a gente imaginava. Mas aqui, na Turner, o último trimestre foi muito bom. Em dezembro, a gente teve uma performance absurda, foi nosso recorde de faturamento, de resultado, de venda de propriedades. Dezembro foi um marco para nós, que ajudou a recuperar o último trimestre. Isso mostra o olhar do mercado para as oportunidades e já amarrando bons negócios para 2018.

E que oportunidades são essas?

É um ano de Copa do Mundo, com um investimento forte canalizado em esporte. No caso do Esporte Interativo, nós não temos os direitos de transmissão, mas isso não nos deixa numa posição desfavorável. Isso porque nós temos um plano de Copa do Mundo. Esse projeto é basicamente digital. Se olharmos para os dois últimos grandes eventos esportivos, Copa do Mundo e Olimpíadas, em que não tivemos os direitos oficiais de transmissão, mesmo assim a gente conseguiu gerar uma conversa muito grande nas redes sociais, capitaneada pelo Esporte Interativo, o que nos colocou numa visibilidade, performance muito maior e diferente em relação a quem tinha os direitos. Historicamente, nas Copas de 2010 e 2014, a gente também teve aumento de audiência dos canais de entretenimento. Há um foco grande de um público que tem interesse nesses eventos, mas tem um público que quer assistir outras coisas também. Também temos toda uma entrega de Copa do Nordeste no início do ano, que é bastante importante. Além de um projeto desenvolvido para esquentar o Campeonato Brasileiro de 2019, que é quando nós teremos os direitos de transmissão em pay TV. Começamos também com a tradicional da temporada de premiações. Começou com Golden Globe, passando pelo Oscar em março, depois a temporada continua. A cada ano a gente aprimora, principalmente a entrega digital. São 13 premiações, basicamente 11 premiações ao vivo, exclusivas, e quanto mais relevantes elas forem, melhor para gerar a discussão nas redes sociais e fazer com que as marcas que estão patrocinando os projetos também se beneficiem disso. Também é um ano especial para o Cartoon Network. A gente começa o ano com uma notícia fantástica, de que o canal foi o mais assistido da TV paga no Brasil em 2017. O que nos dá uma posição de liderança, desbancando o nosso principal concorrente. Era uma coisa que a gente vinha perseguindo há muito tempo. Também em 2018 comemoramos os 25 anos do Cartoon, uma marca bastante importante.

E como é a atuação no digital?

A gente pode falar em três marcas muito fortes e bem posicionadas no digital hoje: o Esporte Interativo, o Cartoon Network e a CNN. São três de marcas de excelência em performance digital, que também inspiram as outras marcas nessa transformação do negócio. Isso ocorre também nos canais de filmes e séries. São marcas presentes em todas as formas possíveis, para que o espectador possa assistir onde ele quiser e não apenas de uma forma linear.

O maior concorrente da Turner é a Globosat?

Em pay TV, sim. A Globosat é um líder inspirador e eu acho isso importante. A gente não disputa diretamente com a Globosat. Nós temos um posicionamento específico, assim como a Globosat, a Fox e a Discovery têm outros. Por muito tempo, continuo falando isso, eu acho que a disputa não está entre os meios especificamente. Eu não deveria, não quero e não estou de olho no investimento da Globosat. Olho o mercado como um todo. A participação de pay TV no total de publicidade no Brasil (12%, segundo o Kantar Ibope Media) é muito pouca, pela relevância, pelo tamanho, pela força e pelo que a gente entrega para o anunciante. Tem um potencial grande de crescimento. A ideia é tentar sensibilizar o anunciante, que separa o investimento em caixas, como TV aberta, pay TV e digital, por exemplo, para que parte dessa verba do digital seja investida aqui. Esse investimento no digital não precisa ir só para os grandes players, como Google e Facebook. Existe um mundo digital importante aqui e tem algo que os players digitais não têm, que é o conteúdo. O conteúdo é nosso, sai do berço, aqui é uma fábrica de conteúdo. Acho que todos os players de pay TV estão nesse movimento de sensibilizar o mercado e dizer que existe uma vida digital importante na TV paga e muita oportunidade. Esse é um recado que a gente tem dado a toda hora. E quando você mostra um case que já foi desenvolvido, tem KPI por trás e tem entrega importante, ajuda bastante a desmistificar um pouco esse olhar de que o investimento deveria ir só para o outro lado.

Além da questão da verba, quais são os outros desafios do segmento?

O ano de 2017 teve muita espuma negativa para o meio, de alguma forma acima da realidade e do que realmente está sendo realizado. Quando se fala da queda da base de 20 milhões para 18,5 milhões, vale lembrar que não teve uma indústria que não teve queda significativa. A gente sentiu isso, mas o olhar já é de recuperação. Tem uma retração normal porque a TV paga está atrelada diretamente ao poder aquisitivo das famílias, que teve uma queda. Ao mesmo tempo, a audiência aumentou, o tempo médio de consumo também. É claro que há uma movimentação natural da indústria de pay TV, uma transformação do hábito de consumo do conteúdo. Isso não é novo, é algo que a gente olha com atenção há bastante tempo para a questão do streaming, do consumo não linear, on demand.

Como a Turner enxerga isso?

A Turner é um grupo internacional com presença forte no mercado americano, então a gente acompanha os movimentos de uma indústria que é mais madura e tira alguns ensinamentos importantes. Nossas principais marcas já têm uma extensão de alguma forma no TV Everywhere. Temos o Esporte Interativo com aplicativo que tem conteúdo simulcast, que pode ver ao vivo na TV, em qualquer lugar, com parte on demand muito forte. Tem a mesma coisa com TNT Go, Space Go, Cartoon Go e várias outras iniciativas em que a audiência pode consumir de uma maneira diferenciada. A gente tem muita parceria com OTT e uma área de business development superatuante, liderada pelo Leonardo César, que é um dos fundadores do Esporte Interativo. Tem muita coisa para ocorrer. Todos os meios estão em constante mudança. Netflix tem uma força importante, tem muita gente ali, mas tem muita gente como eu, por exemplo, que tenho Netflix e meus canais de pay TV, meu pacote que me atende também. É uma coisa que dificilmente vai acabar. Esses players, se não estão passando, também vão passar por uma disrupção, porque você não vai ter uma oferta de um player só como Netflix, você vai ter outros grandes competidores aqui. E a Turner pode jogar esse jogo também. Se você olhar, a maior parte das iniciativas de OTT não tem um modelo de publicidade definido. Tem muita oportunidade nesse negócio, com geração de novas receitas, um caminho natural do negócio. Vejo muito mais como oportunidade do que um risco para o nosso negócio. Não podemos pensar apenas no ambiente de pay TV, mas na repercussão disso em relação a influenciadores, a toda movimentação digital. É só ter uma inteligência específica para poder oferecer ao anunciante uma solução integrada.

O que você acha da discussão em torno da publicidade em TV paga?

Acho que se a gente tivesse só a distribuição dificilmente conseguiríamos manter os níveis de qualidade que temos hoje. Posso dizer, com certeza. Em esporte, por exemplo, essa conta não fecharia. Ter direito esportivo, que é algo muito desejado, todo mundo tem dificuldade. Tem de viabilizar a participação com patrocinadores. De verdade, a Turner tem critério importante com alguns pilares para programação, como tamanho de break e número de spots por break, por exemplo. Aqui, temos uma estratégia para reter a audiência. É uma preocupação nossa ter uma estratégia clara de break comercial. Vejo uma coisa ligada à outra e a boa propaganda é importante também. Por isso é importante ter uma área de criação. Muita coisa diferenciada e criativa que criamos para os nossos anunciantes está no break. Tem uma parte dentro do conteúdo e outra no break.

Como estão as discussões dentro do comitê de publicidade na ABTA (Associação Brasileira de TV por Assinatura)?

Um dos objetivos é revisitar esses pontos fortes de pay TV, como essa movimentação que todos os players estão fazendo. Acho que nós deveríamos estar mais bem organizados para mostrar o que o meio está fazendo. Já fizemos algumas pesquisas, tivemos avanços importantes. Mas acho que a gente pode acelerar isso. Não quero comparar, mas acho que o IAB (Interactive Advertising Bureau) fez um trabalho importante de catequização, ensinamento, de aculturamento do mercado em relação ao digital com muita competência. Poderíamos trabalhar mais com cursos, discussões e workshops para fomentar coisas para o meio.