Eixo Benguela, da Ogilvy, preparou uma programação com lives para os colaboradores (Divulgação)

Em 2019, agências de publicidade e Ministério Público do Trabalho (MPT) firmaram o pacto Conexão Negra para promover a inclusão de profissionais negros em seus quadros. Com a proximidade do 20 de novembro, Dia da Consciência Negra, o PROPMARK ouviu algumas das empresas signatárias para acompanhar o andamento do acordo e saber quais os esforços para a formação de líderes diversos.

Fernanda Coelho, CTO do Publicis Groupe no Brasil, relata que o grupo vem discutindo mais fortemente nos últimos tempos a representatividade
nas posições de liderança. “Acho que quando a gente faz um primeiro movimento, acabamos trazendo e melhorando o número nas posições
de entrada, mas eu acho que quando olhamos para as posições de liderança, isso requer um olhar mais direcionado. Não é simplesmente sobre o percentual, é sobre a distribuição também”, analisa.

Recentemente, os CEOs das agências do grupo se reuniram com o coletivo Preto no Preto, formado por profissionais das empresas criativas. O encontro serviu para que os executivos entendessem as necessidades e a realidade dos colaboradores negros.

“Numa reunião às 9h da manhã, se a pessoa, às vezes, se atrasa, não é negligência. É fruto da realidade dela”, exemplifica Fernanda. Para ela, “não tem como esses movimentos não serem genuínos se não derem uma dorzinha no coração”. “Você se pergunta: como eu não percebia? Como eu naturalizava aquilo? E por aí vai”, reflete.

Fernanda Coelho, CTO do Publicis Groupe: “Não é simplesmente sobre o percentual” (Divulgação)

Essa educação do público interno também é uma preocupação na Ogilvy, conforme explica Patrícia Fuzzo, head of talent da agência para a América Latina. Segundo a executiva, em novembro, o núcleo específico para ampliar as conversas sobre diversidade racial dentro e fora da agência, o Eixo Benguela, preparou uma programação que inclui lives para engajar os colaboradores, além de uma pesquisa inédita em parceria com a área de data intelligence sobre racismo estrutural no mercado de trabalho e os impactos na publicidade.

“Temos 27% de profissionais negros atualmente na agência, desses, 9% ocupam cargos de liderança. A Ogilvy foi uma das agências a assinar, em 2019, o pacto com o Ministério Público do Trabalho para a inclusão de mais profissionais negros no mercado de trabalho. Como meta, nos comprometemos a ter pelos menos 30% de jovens negros e 20% de profissionais de média e alta gerência negros nas nossas contratações”, revela. O RH e os líderes da agência criaram ações para atingir estes percentuais. Há, por exemplo, a realização de processos seletivos na Universidade Zumbi dos Palmares desde 2018 e divulgação de todas as vagas em grupos voltados para negros.

Cintia Pessoa, gerente de RH da WMcCann (Divulgação)

Já a WMcCann fechou outubro com 22,6% de colaboradores(as) negros(as). “Tivemos crescimento de 4% desde a assinatura do pacto, em set./2019, e isso é reflexo do recrutamento direcionado: para qualquer vaga aberta, o depto. de RH apresenta ao requisitante pelo menos 30% de candidatos(as) negros(as). Além disso, contamos também com apoio de instituições como Faculdade Estácio, Faculdade Zumbi dos Palmares, Publicitários Negros e Engajafro, entre outras”, revela Cintia Pessoa, gerente de RH da agência.

Na Africa também houve crescimento e a agência firmou parcerias com grupos de afinidades do mercado para identificar talentos, além de promover treinamentos realizados para toda a liderança com o objetivo de conscientizar sobre a importância da inclusão e da adoção de medidas práticas antirracistas.

“É preciso olhar para a raiz da questão: por que não vemos a mesma quantidade de jovens negros e brancos buscando entrar nesse mercado? Porque falta oportunidade desde a base. Por isso criamos a ‘Escola Africa’, projeto de capacitação criativa e inclusão de jovens em situação de vulnerabilidade com o intuito de ajudar a transformar nosso mercado. Com ele, visamos o desenvolvimento de criativos desde a base, com foco total em talentos negros, periféricos e de baixa renda. Nosso objetivo é formar e preparar esses jovens para que eles estejam aptos a ocupar futuramente cargos de liderança nas agências. A Escola Africa foi lançada no começo do ano e a 1ª turma está estudando e recebendo mentorias a todo vapor desde agosto”, relata Camila Fidelis, gerente de gestão de pessoas.

A Wunderman Thompson redefiniu seu famoso programa 20/20. Lançado em 2017 com o objetivo de chegar ao fim de 2020 com 20% do quadro de funcionários em áreas estratégicas da agência preenchido por profissionais negros, o projeto foi atualizado, já que a meta foi batida e há 24,2% de pretos e pardos entre os 550 funcionários.

Pedro Reiss, CEO da Wunderman Thompson (Divulgação)

“Mas aí percebemos que isso ainda é pouco. Por isso, redefinimos o 20/20. Descobrimos que na oftalmologia ‘visão 20/20’ é a definição de uma visão nítida, sem nenhuma distorção. O que pode ser uma visão nítida, sem alteração, de uma agência do que ela representar a população brasileira? Por isso, decidimos ressignificar o 20/20: o programa segue com o mesmo nome, mas outro propósito. Nossa meta passa a ser que a representatividade na WT seja equivalente à proporção da nossa sociedade. E isso vai valer para gênero, raça, necessidades especiais, orientação sexual etc. No caso da equidade racial a nossa meta passar a ser ter 56% de profissionais negros, já que este é o percentual da população negra no Brasil, segundo dados do IBGE/2019”, revela Pedro Reiss, CEO da agência.

Sobre formar líderes negros, Reiss fala que este é hoje o “maior desafio” da agência. “Estamos comprometidos com esta mudança. A primeira medida será a realização da 4ª Semana da Equidade Racial de 2020 (de 7 a 11 de dezembro) em torno desse tema. Vamos discutir a questão e nos colocar, enquanto agência, como ‘parte do problema’, queremos chamar para a discussão e aprender com o processo/insights da Semana. O principal objetivo da semana da equidade é nos preparar para essa próxima fase da nossa transformação (liderança) e, nesse sentido, a expectativa é que depois de absorver o conteúdo a gente construa um plano concreto de transformação. Este ano, porém, diante de todos os acontecimentos, decidimos que devemos extrapolar o que seria um evento interno para discutir coletivamente com o mercado este tema crucial: como acelerar a presença de profissionais negros em cargos de liderança na agência. Afinal, este é um problema universal na nossa indústria e nada melhor do que tornar o evento público”.

Já a FCB conta com 21% do quadro de funcionários composto por pessoas negras e pardas. À época da assinatura do pacto, este número era de 16%. “O esforço é para que consigamos chegar a 30% até o fim do ano que vem”, revela Sandra Denes, VP de RH da agência.

Na Mutato, a porcentagem de profissionais autodeclarados negros subiu de 27%, em 2019, para 32% no primeiro semestre de 2020. “Entendemos que, para ampliar a inclusão de negras e negros na agência precisaríamos buscar ativamente por esses perfis, por isso, estruturamos, em 2019, uma equipe de RH formada majoritariamente de profissionais negras que apoiou esse movimento. Apesar do avanço nesses números, ainda temos o desafio de ampliar essa representatividade também nas lideranças e é nisso que estamos focados atualmente. É importante lembrar que a participação da consultoria EmpregueAfro foi fundamental nesse salto”, destaca Andre Passamani, fundador e co-CEO da Mutato.

O publicitário revela que houve um avanço na representação de média liderança, com 10% de profissionais negros em cargos de coordenação, supervisão e gerência – de acordo com o último Censo de Diversidade (março/2020). “Mas ainda temos o grande desafio de diversificar também os cargos na alta liderança em que temos 0% de pessoas negras. Se levarmos em conta que hoje o mercado de trabalho tem menos de 1% de lideranças negras no Brasil, o caminho que temos à frente é longo e muito difícil. Mas eu insisto em querer acreditar que a gente consiga mudar essa realidade”.

Sandra Poltronieri, diretora de gestão de pessoas da Artplan (Divulgação)

A Artplan, cujo último censo – de 2019 – mostrou um total de 25% de colaboradores negros, iniciou recentemente uma parceria com a consultoria Indique uma Preta, com o objetivo de trazer mais negros para o quadro de colaboradores. “A consultoria prevê um banco de talentos de profissionais pretos, que servirá de base para termos mais negros ocupando nossas vagas, incluindo os cargos de liderança”, ressalta Sandra Poltronieri, diretora de gestão de pessoas da agência.

Na Leo Burnett Tailor Made o percentual de negros “cresceu bastante”, segundo Vivian Vaz, diretora de RH. “Nossa diretriz é de continuar aumentando nossa diversidade e focar também nas posições de liderança. Para acompanhar esse crescimento, foram realizadas rodas de bate-papo com a nossa presidência, com o objetivo de deixar o ambiente mais inclusivo e receptivo para a comunidade negra”.