Não lanço um livro novo há alguns anos. Tenho medo da noite de autógrafos. A pior coisa que pode acontecer para um escritor é noite de autógrafo.
Ou melhor, é a pior coisa que pode acontecer a um ser humano.
Não existe casamento, divórcio, execução, tratamento de canal ou discurso de senador que se compare a uma noite de autógrafo.
Primeiro a gente passa o dia correspondente àquela noite infeliz vivendo a certeza de que não vai aparecer ninguém.
Jamais conheci um escritor que se considere ou ache que a distribuição dos convites foi feita com um mínimo de responsabilidade.
Durante todas as horas que antecedem a noite de autógrafos não há escritor que não tenha certeza do vexame mais completo.
Na sua percepção, ele acha que pouquíssimos jornais se deram o trabalho de publicar umas poucas linhas a respeito do acontecimento.
E que ninguém recebeu o convite, claro que por negligência da divulgadora (ou divulgador), que só trabalha nessa profissão por absoluta incapacidade de se dedicar a strip-tease, à política ou ao assassínio de aluguel.
Isso sem contar com a má vontade dos donos da livraria e o pessoal do bufê, que, juntamente com os garçons recrutados entre os carcereiros de Bangu I, conspiram para o fracasso total da festa.
E o vinho quase sempre é vagabundézimo, o salgado nojento e a Coca-Cola quente. E a diet sempre acaba antes da hora.
Claro que o leitor já percebeu que tudo isso ocorre somente na imaginação paranóica do infeliz que vai fazer a noite de autografo.
Mas toda essa apreensão, toda essa angústia, ainda não é nada diante do medo insuportável de esquecer o nome das pessoas que comparecerem.
Atualmente existe uma santa providência de colocar um pedaço de papel dentro do livro, partindo-se do princípio de que a maioria dos autores esquece o nome da própria mãe no momento da dedicatória.
Mas tem sempre o animal que se sente íntimo e joga fora o papelzinho, ou se recusa a dar o nome ao atendente no balcão.
Este tipo de escroto merece ser exposto a execração pública.
“E quem é você, sua perua anônima? Nunca te vi mais magra, sua bruxa velha!”.
Numa dessa, em pânico, já esqueci do nome do meu melhor cliente e, outra vez, vendo que minha mulher se afastava e, consequentemente, eu estava sem nenhum apoio, fiquei tão nervoso que esqueci o meu nome.
Sem contar que, lendo um nome de relance escrito na capa e feliz em identificar algo compreensível, acabei fazendo uma dedicatória a… Agir, a própria editora do livro.
Há sádicos que em noite de autógrafos exigem dedicatórias especiais, como demonstração de importância. Cansado de inventar fórmulas novas para este tipo de chato, já escrevi:
“Ao Estevão, com os votos de que ele vá tomar no cu”. E assinei embaixo. Fez o maior sucesso, até hoje não sei como.
Acredito que dei certa demonstração de intimidade. Não me lembro quem seja o Estevão. Só espero que ele tenha se divertido.
Lula Vieira é publicitário, diretor da Mesa Consultoria de Comunicação, radialista, escritor, editor e professor