Em um ano no qual o investimento em publicidade digital deve chegar aos R$ 20 bilhões, segundo projeções do Interactive Advertising Bureau (IAB) Brasil, a entidade dá início a um novo ciclo de gestão.
Marco Bebiano, diretor de negócios para bens de consumo, tecnologia e governo do Google Brasil, acaba de assumir a presidência do IAB, substituindo Ana Moisés, diretora de soluções de marketing do LinkedIn para a América Latina. Na entrevista a seguir, Bebiano fala sobre os desafios da entidade para 2020, relevância da mídia digital e diversidade.
Como você recebe o desafio de liderar o IAB Brasil em um momento de tanta transformação no digital?
É uma honra. Acho que estou dando sequência a um trabalho de alguns anos como conselheiro do IAB Brasil e também como apoiador de outras entidades. Tenho uma bagagem anterior desde quando atuava em agências, como no Grupo de Mídia. Vindo para o Google, comecei a atuar mais forte no IAB. Não é nenhuma novidade essa dinâmica, as discussões, o plano, a estratégia. A novidade é o escopo da cadeira e a responsabilidade de representar toda a indústria de publicidade digital no Brasil. Estou me sentindo energizado.
A gente está muito otimista com a agenda que construímos para 2020 e para os principais desafios do período. Grande parte dessa agenda vem da continuidade de 2019. O IAB tem um planejamento estratégico para os próximos cinco anos. Obviamente, a gente revisita a cada ano, mas Cristiane Camargo [diretora-executiva do IAB] tem feito um trabalho consistente e sólido, e o meu papel é ajudá-la a dar continuidade a esse trabalho.
O que te motiva a participar de forma ativa, voluntária e não-remunerada? Qual é a importância desse comprometimento dos profissionais com as entidades que os representam?
O papel das associações tem sido fundamental para o desenvolvimento do mercado. Se olhar para qualquer entidade séria, você vê o legado que ela trouxe. O que me motiva é que o IAB faz parte de uma indústria dinâmica, em constante movimento, que demanda de quem está sentado lá um skill de aprendizado contínuo, curiosidade de ir atrás, de aprender, exigência de qualidade.
Por ser um mercado que se movimenta, precisa se buscar a barra mais alta possível de qualidade para impactar a indústria. Você vê o quanto consegue fazer a diferença através das associações, e vê-las evoluindo dá uma sensação de missão cumprida. É um sentimento muito nobre. Desde o começo da minha carreira em publicidade participo ativamente dessas discussões. Eu tenho em mim essa semente.
Você é diretor de negócios para bens de consumo, tecnologia e governo do Google. O quanto estar ativamente no mercado ajuda a trazer o pulso do que está acontecendo para o IAB?
É menos sobre o cargo que a pessoa ocupa no mercado e mais sobre os skills para assumir a liderança ao lado da Cris. A gente teve presidentes de diversas representatividades. Naturalmente, no passado, houve uma presença e contribuição grande das empresas que o IAB representa, na indústria digital, mas hoje, se você olhar para o conselho, já não reflete a percepção de apenas pessoas do mercado digital. Temos grandes marcas que anunciam em todas as mídias, como Ambev e Fiat, institutos de pesquisas que aferem todos os meios, como a Kantar, executivos de agências, como o Eduardo Lorenzi, CEO da Publicis, que não compra só digital.
A gente vê que, independentemente de quem está na presidência, buscamos equilíbrio de opiniões e diversidade de experiências, perspectivas e entendimento de mercado. Isso é o mais importante. Que essas pessoas tenham uma profundidade dos desafios do mercado e nos ajudem a liderar uma agenda estratégica e assim evoluir o mercado de publicidade digital.
Você já ocupou a posição de conselheiro no IAB. Quais são as principais diferenças de função agora como presidente?
O conselho tem um papel muito consultivo. Aliás, nosso conselho tem uma frequência significativa anual. Neste ano ele está mais diverso, conseguimos trazer mais mulheres, algo que fico muito feliz. Mas ele é pontual para tomadas de decisões. O papel de presidente está mais próximo da operação e do dia a dia da estratégia do IAB. Tenho calls semanais com a Cris, em que a gente discute metas, o quanto elas estão sendo alcançadas ou não, revisões de métricas. É um papel mais executivo e de gestão, ajudando a Cris, que é quem lidera a associação, no que for preciso para que a operação seja mais eficaz e eficiente dentro dos nossos objetivos.
Quais são os objetivos e metas do IAB para este ano? Muita coisa deve mudar em relação à última gestão?
A gente tem quatro principais pilares, e eles endereçam às oportunidades e desafios do ponto de vista de tecnologia e digital. O primeiro deles, que teremos muito foco, tem a ver com educação e profissionalização do mercado. O IAB foi a primeira entidade digital a fornecer capacitação gratuita para os seus associados por meio do programa Formar para Transformar, lançado em 2019. Queremos expandi-lo, oferecendo, desde o básico da publicidade digital até a parte mais avançada, que inclui programática, gestão de audiência e atribuição.
Temos outra capacitação que será fundamental neste ano. Ela tem a ver com aspectos jurídicos da Lei Geral de Proteção de Dados. Fizemos dois cursos no ano passado que foram muito procurados e neste ano, em função das demandas, também será muito requisitado.
Além da educação, quais são os demais pilares da entidade para este ano?
Trouxemos uma novidade que é o consórcio do Tech Lab, uma empresa do IAB que funciona à parte da entidade, que visa pesquisar e desenvolver padrões técnicos para o mercado digital. O Tech Lab, que foi o responsável por definir o Coalition For Better Ads (CBA) nos EUA. Eles que lançaram um frame work de compliance para regras de proteção de dados na Califórnia, por exemplo. Lançaram também padrões para transparência de dados. É uma empresa que, junto com o mercado, define padrões e melhores práticas para a publicidade digital.
A gente vai ter um grupo de trabalho dedicado no Brasil que vai trabalhar com os comitês para desenvolver guias, podcasts, webnars, conteúdos para trazer as melhores práticas e, junto com outras entidades, ajudar a definir padrões de publicidade digital no mercado brasileiro.
A chegada do Tech Lab para ajudar a criar novos padrões de publicidade digital tem ligação com a saída do IAB do CENP? [Em julho de 2019, as entidades entraram em desacordo sobre o entendimento de que empresas de tecnologia podem ou não ser consideradas veículos de mídia].
Essa questão da regulamentação está muito mais ligada ao nosso terceiro pilar de transparência e confiança. Nossa posição [quanto à saída do CENP] continua a mesma. A missão do IAB é desenvolver o mercado digital. A entidade representa um novo ecossistema de publicidade, com empresas que não existiam há pouco tempo, com competências que não eram requisitadas. Há, então, uma discussão de como adequar a necessidade desse ecossistema ao que existe hoje de regulação. E o que tem não responde à necessidade desse ecossistema.
O que buscamos, através de diálogos, propostas, desenvolvendo pontos de vista, trabalhando junto aos órgãos governamentais, é mostrar como as novas necessidades poderiam ser representadas para a evolução do mercado. Ele já está evoluindo. A tecnologia impacta a indústria de publicidade como um todo. No mundo, mais de 50% dos investimentos de mídia já passam pelo meio digital. No Brasil já passa de 1/3 disso, então, temos um caminho de diálogo pela frente. E vamos continuar, independentemente de estarmos associados a alguma outra entidade ou não.
E quanto aos demais pilares a serem trabalhados neste ano?
O terceiro grande objetivo diz respeito a transparência e confiança. Principalmente através da área de relações governamentais, o IAB dá todo suporte de forma proativa a grandes temas. Por exemplo, neste ano, o tema que daremos grande suporte para os nossos associados e mercado é LGPD. Estamos avançados em entender, suportar e guiar as empresas de publicidade para que elas saibam o que fazer a se adequar a lei. É um exemplo de atuação desse pilar.
E, por último, outro grande objetivo para este ano tem a ver com impacto social e responsabilidade. A gente acredita no quanto o IAB contribui com a audiência do digital, com as pessoas que estão do outro lado, então, há iniciativas endereçadas ao tripé de parceiros, como veículos, plataformas, anunciantes, e as pessoas que usufruem dos serviços e produtos digitais e de tecnologia. Temos, então, iniciativas nessa área. Já no impacto social, vamos discutir tudo o que está relacionado a diversidade.
Pode detalhar melhor como o IAB vai atuar nessas áreas?
Os associados do IAB têm iniciativas e programas voltados para diversidade de gênero, condições físicas, cultural e racial. O que a gente quer hoje é juntar todos esses programas, entender o que cada um tem de melhor e usar isso para o mercado. Porque cada empresa tem os próprios programas. Como expandir isso para o mercado de publicidade como um todo, como fazer com que o IAB seja um catalisador, um curador do que tem de melhor em programas de inclusão, diversidade e equidade.
Queremos, dentro de todas as iniciativas que o IAB for fazer, garantir que a diversidade e a inclusão estão sendo contempladas. Internamente, por exemplo: temos representação de mulheres? Estamos endereçando a diversidade de raça? Estamos trazendo perspectivas culturais diferentes? Esse é um ponto de atenção, e, se for observar, o conselho do IAB tinha apenas uma mulher. Hoje são cinco. Para o mercado, estamos encontrando uma forma de amplificar algo que já está sendo feito pelas empresas. Não queremos reinventar a roda, mas fazê-la rodar mais rápido.