O isolamento social, causado pela Covid-19, trouxe novos comportamentos para o consumidor. Uma dessas mudanças foi a adoção de novos meios de pagamento, como transações por aproximação e carteiras eletrônicas, que diminuem o risco de contaminação. Nesta entrevista, Sarah Buchwitz, vice-presidente de marketing e comunicação Brasil e Cone Sul da Mastercard, fala sobre os principais impactos que a companhia sentiu nos últimos meses, sobre o processo de adaptação das campanhas e ações, e o que mudou na relação com os consumidores. Além disso, a executiva comenta sobre a parceria com o Facebook, para a realização de pagamentos via WhatsApp, e sobre a importância da mobilidade para o desenvolvimento de novos modelos de negócios.
Que balanço a Mastercard faz destes últimos meses em que o país enfrenta o isolamento social?
Todos nós tivemos de nos adaptar, né? Tenho muita sorte de trabalhar na Mastercard, uma empresa que já adotava o sistema de home office. Então, isso já fazia parte do nosso dia a dia e as nossas equipes e agências se adaptaram muito rápido com esse novo sistema. Sobre a nossa estratégia de marca, ela não mudou. A linha estratégica continua a mesma, o que mudou foram as ações. Por exemplo, o nosso foco para o público portador dos cartões Black e Platinum era o das viagens e o da gastronomia. Viagens, agora, não dá para falar, não faz sentido. Então, adaptamos o que havíamos planejado e trouxemos a websérie Crie novos hábitos, comece o que não tem preço, com o chef Alex Atala, para falar mais deste novo momento do consumidor. Outro destaque foi o movimento Faça parte, comece o que não tem preço, que é o nosso compromisso de doação de, no mínimo, dois milhões de pratos de alimentos. Nós já anunciamos uma parceria com iFood e Recarga Pay, e fizemos uma live com os cantores Gilberto Gil e Iza para também arrecadar fundos para a ONG Ação da Cidadania.
O fato de a Mastercard ser uma companhia global ajudou na adaptação das ações no país?
Sem dúvida, nos ajudou muito. Já estávamos acompanhando, não só os resultados de negócios, mas como os consumidores, clientes e o mercados estavam agindo nessas ondas da pandemia. Então, antes mesmo de ela chegar com força no Brasil, nós já estávamos pensando no que fazer, como adaptar as nossas estratégias e como passar essas informações para os nossos clientes.
O esporte e a música são pilares que fazem parte da estratégia de comunicação da marca há algum tempo. Como você adaptou o seu planejamento já que eventos que envolvem essas áreas foram suspensos?
A incerteza é o que mais nos deixa tensos. A UEFA, por exemplo, anunciou que vai ter alguns jogos finais de portões fechados. Então, além de uma mudança drástica das ações, existe também uma incerteza muito grande do que está acontecendo e como trabalhar com ela. Nossa estratégia de patrocínio é focada em paixões e, dentro dela, temos alguns territórios como arte, gastronomia e esporte. Dentro de esportes temos um portfólio muito rico como, por exemplo, o campeonato de games League of Legends. Então, apesar de o futebol estar parado, fizemos uma concentração no que está acontecendo. Em três semanas, o campeonato brasileiro de League of Legends se adaptou, porque ele acontecia em grandes estúdios, voltou em um novo formato e nós aproveitamos este momento para não deixar de nos conectar com o consumidor. Sobre a UEFA, este ano não vamos ter um evento ao vivo para levar os consumidores, mas já estamos pensando em como trazer essas experiências para o digital.
A marca apostou no ‘boom’ das lives e patrocinou o show do cantor Gilberto Gil com a Iza. Teremos outras novidades neste segmento?
Acredito que fomos muito felizes com a live do Gil e da Iza. O resultado foi uma grande surpresa. Agora, estamos buscando quais serão as próximas novidades, não só de música, mais de games e de todos os outros territórios que nós já somos proprietários. Para a Mastercard precisa ser algo que realmente não tem preço, uma experiência priceless. Então, pode ser desde um encontro inusitado, uma experiência gastronômica com um chef ou, até mesmo, uma mistura de sentidos. Precisamos ser ainda mais criativos, mas sempre se atentando à essência da marca. Este é o grande desafio.
A pandemia acelerou a introdução da tecnologia na vida de muitas pessoas. Como a Mastercard analisa a mudança de hábitos dos consumidores?
Neste caso, houve um impacto positivo para o nosso negócio. As transações, que nós chamamos de cartão não presente, ou seja, todas as transações online, cresceram bastante neste momento. Apesar da recessão e da crise econômica, houve um crescimento muito grande das transações online e também dos pagamentos por aproximação. O brasileiro adota muito rápido as tecnologias que fazem sentido para a vida dele.
Essa mudança fortalece a tecnologia de pagamento por aproximação? Você acredita que o consumidor já está mais acostumado?
Sim, ele está mais acostumado. Realizamos uma pesquisa sobre o pagamento por aproximação e observamos que 69% dos brasileiros entrevistados dizem que a Covid-19 os incentivou a fazer pagamentos por aproximação. Já 80% das pessoas entendem que o dinheiro pode gerar mais risco de contaminação. E outros 14% deixaram de usar dinheiro durante a pandemia. Para um país que ainda usa muito dinheiro, este é um dado bastante relevante. Além disso, 78% dizem que o método é seguro. Não só de segurança transacional, mas de carregar o dinheiro e de limpeza. Outros fatores que agora também fazem parte das nossas preocupações.
O smartphone é praticamente uma extensão da vida do usuário. Você acredita que a mobilidade é uma peça importante para o desenvolvimento de novos modelos de negócios?
Costumo dizer que o consumidor está acostumado a fazer tudo pelo telefone. Seja assistir a sua novela favorita, fazer um pagamento no banco online, falar com os parentes e, hoje, até festas acontecem. Então, ele espera o mesmo comportamento no que diz respeito ao meio de pagamento. Em uma das pesquisas que realizamos, 75% dos entrevistados informaram que querem realizar pagamentos via celular de uma forma rápida. Então, não é só a indústria, este é um desejo do consumidor. Ele espera mandar dinheiro com a mesma rapidez que manda uma mensagem de voz. Estamos trabalhando em uma série de soluções e tecnologias de meios de pagamentos para atender essa necessidade do consumidor.
Falando em novos modelos de negócios, recentemente, a Mastercard anunciou uma parceria com o Facebook para a realização de pagamentos via WhatsApp. Como isso vai funcionar?
Foi uma grande parceria. O Brasil foi o primeiro país a receber essa novidade. A experiência de consumo é muito fácil e simples. Lançamos inicialmente com duas fintechs, mas essa iniciativa no momento está parada. O Banco Central do Brasil emitiu uma nova regra relacionada ao ecossistema de pagamentos no país e exigiu a suspensão do serviço de pagamentos via WhatsApp. Vamos atender à solicitação do Banco Central e continuaremos focados no desenvolvimento de um ambiente de pagamentos mais inovador, inclusivo, seguro e competitivo para consumidores e empresas brasileiras. O importante, independentemente do parceiro, da tecnologia, da plataforma, é a experiência do consumidor. Nosso foco é com a inovação. Queremos trazer para o consumidor o que ele quer, que é uma transação instantânea para fazer pagamentos rápidos e de uma forma segura.
Essa iniciativa em outros países já está mais avançada ou não?
Com o Facebook, temos nos Estados Unidos uma ferramenta dentro do Messenger. Mas no WhatsApp, somente no Brasil.
Muitos anunciantes vão deixar de anunciar no Facebook por conta de movimentos políticos, raciais e fake news. Qual a posição da Mastercard?
Os desafios crescentes em nossa sociedade persistem e, em alguns casos, estão se intensificando. Mas racismo, violência e discurso de ódio não têm lugar em nosso mundo. Estamos trabalhando com nossos parceiros e com o Facebook para entender os compromissos e as medidas que serão tomadas para lidar com as acusações levantadas. No momento, não tomamos nenhuma decisão sobre a nossa publicidade nessas plataformas, mas continuaremos avaliando a situação em relação aos padrões estabelecidos por nós.
Que aprendizado a pandemia pode deixar para a indústria?
A pandemia tem nos deixado mais humanos. Então, neste dia a dia em casa, onde todos estão mais expostos, vulneráveis, preocupados com a saúde do corpo e da mente, tudo isso tem nos deixado mais conscientes de que existem pessoas por trás das marcas e instituições. Outro aprendizado é a aceleração da digitalização. A gente fala muito de transformação e, no final, ela veio como uma avalanche. Falamos muito do processo de inovação, mas quando o consumidor tem a necessidade, a marca precisa estar mais preparada. O papel da marca com a sociedade também é um outro aprendizado. Há muitos anos se fala em propósito, mas agora é a hora da verdade. É a hora em que eles precisam sair do power point e virar realidade e se transformar em ação. Este é um momento muito importante para as marcas colocarem seus propósitos em prática, como a Mastercard fez colocando o movimento Faça parte, comece o que não tem preço, que não é um movimento de um dia, de um mês, mas sim de um período onde estamos devolvendo algo para a sociedade. Falando sobre o futuro, sim, nós estamos mais humanos e não podemos esquecer que vamos passar por uma grande recessão econômica. Os próximos meses serão muitos difíceis, mas vamos continuar focando na nossa estratégia e conversando com o nosso público de uma forma que seja relevante com o contexto.