Na última quarta-feira (14) meu amigo Luiz Carlos Miele fez a piada mais sem graça de sua vida. Foi encontrado morto em sua casa.
Nós estávamos tratando dos vários lançamentos de seu último livro “O contador de histórias” e da série de shows com o mesmo nome que ele faria em várias capitais.
Para este livro, eu escrevi o prefácio que faço questão de transcrever aqui, como minha última homenagem a ele.
“Miele é simplesmente o melhor ententainer vivo no Brasil. Essa declaração pode à primeira vista parecer exagerada ou apenas um deslize de fã (que sou, assumido). O melhor do Brasil?
Sim, senhoras e senhores, o melhor do Brasil. Dê-lhe um palco e um microfone, dê-lhe plateia e estamos diante de um espetáculo.
Miele faz humor, canta, dança e transforma um teatro, uma boate ou a mesa de amigos num espaço mágico, onde as horas passam, as pessoas são transportadas para um mundo muito mais engraçado e talentoso.
Um lugar que qualquer um de nós dotado de um mínimo de gosto pela vida sonha em viver.
Miele é do time de Bob Hope, James Cagney, Jimmy Durante, Eddie Cantor, Sammy Davis Jr., nos Estados Unidos; Maurice Chevalier, na França; Ivon Cury, no Brasil.
Gente que, na saborosa definição de Bibi Ferreira, ‘canta, dança e representa’.
A enorme, a abissal diferença entre eles todos é que Miele quando conta histórias, conta sua vida.
Essa comparação não é um julgamento de qualidade artística, mas simplesmente a constatação de que Miele faz, de cada apresentação, uma autobiografia.
Que perpassa a biografia de outros grandes artistas brasileiros e alguns internacionais. E isso é único no mundo do espetáculo.
Contando sua vida, Miele conta a história do show biz brasileiro das últimas décadas. Ao que se lhe acrescenta à condição de historiador a de testemunha.
Todos – vá lá, quase todos – grandes momentos da música e dos espetáculos de TV no Brasil tiveram ativa participação do ‘Barba’, como Elis Regina o chamava.
A marca ‘Miele&Boscoli’ durante muito tempo significou um selo de qualidade e inovação na indústria do entretenimento.
Tanto é verdade que os mais recentes musicais que contam e cantam a vida de nossos grandes artistas têm sempre um ator interpretando Miele.
Com um currículo desse tinha tudo para ser um auto- -referente, daqueles que atribuem a si a mudança do mundo.
Nós todos conhecemos muita gente com uma folha corrida bem menor e, ao mesmo tempo, com ego mais inflado.
Miele não é assim.
Conversando com ele, ouvindo-o, o que encanta é sua não estudada modéstia. Não a falsa modéstia, a insuportável humildade de quem espera sempre um desmentido às suas hipócritas declarações de desimportância. Ao contrário.
Miele sabe quem é e o que fez. Mas não se leva demasiadamente a sério e se julga com a mesma amável crítica que destina ao resto da humanidade.
Para Miele o rei sempre está nu. E tem pau pequeno.
Voz grave de locutor, bom cantor, afinado, Miele é também um frasista.
Dele, Affonso Romano de SantÁnna disse: ‘Miele poderia ser só locutor. Poderia ser só cantor. Poderia ser só bailarino. Poderia ser só compositor. Poderia ser só humorista. Poderia ser só compositor. Poderia ser só ator. Pois abriu mão disto tudo para ser tudo isto’”.
O livro está na internet, no site da Bookstart. Vale a pena.
Lula Vieira é sócio da Mesa Consultoria