O que era, há poucos anos, uma profecia, uma previsão para o futuro, já se tornou uma realidade. A tecnologia transformou rapidamente os meios de comunicação e os relacionamentos.
O Brasil absorveu rapidamente a tecnologia digital que se expandiu até às mais longínquas regiões, antes não atendidas pela comunicação analógica, e hoje vemos que o universo de smartphones é maior que o tamanho da população. Esse novo cenário mudou os desafios de comunicação das marcas que agora transitam por um mundo novo e em rápida e contínua transformação.
O comando agora está nas mãos do consumidor: essa é a raiz da transformação que a tecnologia trouxe. Essa troca empoderou os consumidores que passam a atuar mais como indivíduos e menos no coletivo. A comunicação do consumidor com as marcas é mais direta e individualizada: ele busca exatamente aquilo atende às suas necessidades emocionais ou racionais; responde imediatamente ao que foi proposto e o que foi entregue; suas opiniões têm voz e ecoam entre seu coletivo mais próximo e chegam com a autoridade, em geral, potencializada pelos seus pares.
Como fica a comunicação das marcas no mundo com o consumidor empoderado? Os consumidores têm nas suas mãos não apenas o controle remoto para zapear os programas e fugir dos anúncios nos intervalos comerciais. O seu poder é ainda maior. Mais de 60% utilizam ferramentas para pular e pagam para não receber anúncios; 48% usam tecnologia para bloquear anúncios; e 45% declaram que não assistem os anúncios e fazem qualquer outra coisa de interesse.
É um cenário extremamente diferente, mas também muito desafiador que pede uma mudança de mindset e de expectativas em relação aos resultados. E temos visto muitas marcas atravessando bem esse terreno com consumidores cada vez mais conectados, mas com a autonomia de ser ou não um receptor da mensagem.
Nos últimos anos, reunindo os aprendizados das marcas e analisando os resultados de comunicação, começamos a considerar alguns caminhos que trazem bons retornos.
Se o poder do consumidor é uma realidade, a comunicação precisa deixar uma impressão significativa e que seja do interesse dele. E o interesse na marca que deve ser despertado está sempre competindo com um universo de infinitas possibilidades.
Se o acesso do consumidor à mensagem é fluída, a mensagem precisa entregar um significado instantâneo. Não existe tempo para parar, refletir, raciocinar e decidir.
Se não há separação entre digital e não digital, a comunicação da marca precisa estar em todos os pontos de contato e trabalhar cada um deles com suas características específicas, sem fronteiras entre online e offline.
Se a comunicação é praticamente individualizada, as marcas precisam ter uma base forte e muito consistente de propósito, propostas e benefícios emocionais e racionais que possam ser traduzidos e recebidos de forma individualizada.
Se o consumidor navega buscando algo que chama a atenção, as marcas tem um cenário competitivo cada vez maior nessa procura por algo que tenha algum significado que crie esse tipo de ligação, que atenda às suas necessidades e que permaneça por mais tempo nas mentes das pessoas para serem acionadas quando necessário.
Se o consumidor é produtor e receptor de conteúdo, a mensagem precisa gerar identificação. Numa tendência de democratização dos vários grupos sociais, étnicos e de gênero, as marcas têm buscado a inclusão dos vários segmentos, gerando bons resultados pela identificação. Para esse processo, a experiência mostra que há a necessidade de fugir dos estereótipos e dar foco na espontaneidade.
Se o consumidor é também um duplicador de mensagens pela facilidade de compartilhamento, não dá para prever o entendimento que o consumidor atribui a comunicação recebida e compartilhada. As marcas precisam de um poder de resposta muito ágil usando canais que tenham autoridade junto ao grupo.
O consumidor de hoje é assim. Essa é a realidade dele e a realidade do seu contexto de comunicação e busca de informação, conteúdo e entretenimento. E a comunicação das marcas está integrada a este cenário. Fica difícil identificar o que seria o “intervalo comercial”.
Marcas grandes e estabelecidas têm mais facilidade ou dificuldade? As marcas com propostas mais segmentadas têm a comunicação facilitada? Marcas com propostas inovadoras em termos de benefícios racionais acham um caminho mais tranquilo de conexão com os consumidores? Como utilizar a base emocional de ligação com a marca, construída ao longo de décadas, numa possibilidade de atenção junto a esses consumidores?
Temos visto cases de sucesso em todos os tipos de propostas. Muitas experiências, aprendizados, investimentos e resultados. Talvez os objetivos e as expectativas de resultados devem ser mudados, especialmente numa época de crise e restrição econômica como atravessamos no Brasil. E considerar principalmente a importância de compreender esse consumidor e o contexto no qual ele vive hoje.
Valkiria Garré é CEO da Kantar Insights Brasil