Entrevista: Douglas Tavolaro
Muita gente se pergunta como o maior canal de notícias do mundo, presente em 212 países e territórios, nunca havia trazido uma operação própria ao maior país da América Latina em quase quatro décadas de existência. Até hoje, mais de 210 milhões de brasileiros só puderam assistir à CNN em inglês ou em espanhol. Mas isso vai mudar a partir de março. E o responsável por trazer a marca ao Brasil, com um projeto produzido por brasileiros para brasileiros, após anos de tentativas frustradas, não poderia deixar de ser um apaixonado pela notícia – e por empreender.
O jornalista Douglas Tavolaro se formou na tradicional Faculdade Cásper Líbero, em São Paulo, e percorreu uma carreira com passagens em redações de vários veículos impressos e emissora de TV. “O jornalismo esclarece e forma cidadãos melhores. Cada vez mais é o pilar de sociedades desenvolvidas”, afirma Tavolaro, que cresceu em uma família de classe média e estudou grande parte da vida em escola pública.
O destino profissional do executivo o levou a criar e implantar o projeto de jornalismo da TV Record, durante 17 anos, até a sua saída do grupo, em janeiro do ano passado. Pediu demissão da empresa como vice-presidente de Jornalismo, após elevar o departamento de pouca relevância à segunda maior força do telejornalismo, com as maiores audiências e faturamentos da emissora. Sob seu comando, a Record venceu seus maiores prêmios em 65 anos de história. Com sensação de dever cumprido, partiu para trilhar o sonho de construir o próprio negócio.
Há mais de 15 anos, Tavolaro mantém relações editoriais e de negócios estreitas com os norte-americanos da CNN, período em que atuava como executivo de televisão. Dessa relação de confiança, surgiu o convite da CNN Internacional Commercial para montar o projeto no Brasil, assumindo uma participação societária na empresa e o cargo de “founder” (CEO fundador). Foi ele quem negociou com os executivos estrangeiros a participação de um investidor nacional para avançar no projeto.
As negociações em Atlanta, Londres e Nova York, sedes mundiais da CNN, foram conduzidas por Tavolaro durante meses em que elaborou, ao lado de sua equipe, o projeto editorial e o plano de negócios que deram vida à nova empresa. Então, convidou o empresário Rubens Menin, do ramo de construção e do setor financeiro digital, com quem afirma ter “relações de profunda amizade e admiração”, para entrar no negócio como seu sócio. A lei exige que empresas jornalísticas sejam de propriedade majoritária de brasileiros.
Nos últimos 12 meses, Tavolaro conduziu contratações de estrelas do vídeo, formou a liderança da empresa, selecionou executivos de jornalismo, planejou a estratégia de marketing, implantou investimentos em programação, distribuição e multiplataforma, firmou parcerias internacionais e estruturou as áreas de gestão e comercial da nova companhia. Agora, a rotina do executivo está cem por cento tomada pelos preparativos finais da estreia do negócio que está agitando o mercado de mídia brasileiro.
A revista Propaganda conversou com Tavolaro na sede da nova emissora, na Avenida Paulista. A entrevista não poderia ter ocorrido em outro lugar: a redação.
Como começou o sonho CNN para você?
A CNN é uma marca presente na formação de qualquer jornalista no mundo, admirada e reconhecida como referência máxima no conceito de produção de notícias. Ninguém se torna um profissional da nossa área sem estudar a trajetória da CNN como o primeiro canal 24 horas de jornalismo. Cresci com essa visão sobre a CNN, como qualquer outro jornalista. Esse desejo foi somado a um outro que aprendi com a minha família, que é o de buscar empreender. Meu avô, italiano, hoje com 96 anos, ex-prisioneiro na Segunda Guerra, chegou ao Brasil fugindo daquele período difícil na Europa e empreendeu. Meus pais empreenderam juntos em um pequeno comércio em São Paulo. Foram exemplos simples, mas bem expressivos para mim.
Isso parece ter sido marcante na sua vida?
Sim, muito. Essa visão empreendedora sempre esteve presente dentro de casa. Mesmo com negócios pequenos, aprendi com minha família a importância de se criar algo importante para a vida das pessoas. O objetivo maior do nosso projeto é ser relevante para o Brasil e os brasileiros, ajudar a melhorar o nosso país com a informação. A CNN nasce aqui com essa meta maior.
Quando aceitou comprar esta ideia, você se encontrava em um ótimo momento em sua carreira e com um futuro promissor. O que o fez ter coragem para dar esta guinada e encarar um novo desafio?
Como um jornalista não abraçaria o projeto de implantar no Brasil a maior marca de jornalismo do mundo? Impossível. Sou grato à Record por tudo o que vivi lá e pelas amizades que levarei sempre comigo. A honra maior agora é fazer parte de um canal que deseja ser importante na vida dos brasileiros. Fazer jornalismo com correção e qualidade para informar melhor.
O Brasil vive um momento de forte polarização política. A CNN vai se posicionar neste cenário?
Esse questionamento é normal no Brasil de hoje. Os últimos anos deixaram os extremos ideológicos muito opostos. Como tenho repetido, não seremos nem de direita, nem de esquerda. Nosso negócio é o jornalismo profissional: isento, transparente e rigoroso. O interesse que nos move é o da sociedade. Vamos trabalhar para colocar no ar as informações após cumprir um processo técnico de apuração e checagem. Teremos pluralidade de opiniões, com nossos analistas buscando sempre isenção e equilíbrio. Além disso, um Conselho Editorial, que será totalmente independente do Conselho de Administração, foi criado para reforçar a credibilidade e a imparcialidade do nosso jornalismo.
Como será a atuação desse Conselho Editorial?
Ele foi inspirado no posicionamento ético da AT&T quando realizou a aquisição da CNN nos Estados Unidos, em 2016. A companhia anunciou publicamente a independência editorial da CNN. O Conselho Editorial da CNN Brasil será formado por sete executivos jornalistas, além da minha presença, incluindo vice-presidentes, diretores, advogados especializados em mídia e consultores da CNN Internacional. Isso é garantia cem por cento de acertos? Não, mas reforça nosso compromisso em acertar. Erros ocorrem e devem ser corrigidos, com humildade e transparência. Mas seremos uma nova opção de notícia confiável para os brasileiros. Temos os melhores profissionais do mercado, na frente e por trás das câmeras, associados à marca global da CNN, para produzir um jornalismo de referência.
Como foi criada a estratégia de marketing do canal? A CNN é muito comentada mesmo ainda sem ter estreado.
Fizemos um trabalho dentro de casa. Tivemos o apoio de duas agências de comunicação: uma voltada às redes sociais e outra para atendimento à imprensa especializada no setor de TV e no mercado de mídia. As decisões estratégias e todo plano de divulgação, passo a passo, foram elaborados em encontros semanais do nosso comitê de vice-presidentes.
Como ter certeza de que a CNN vai dar certo? Quais as garantias?
Dois fatores me dão essa certeza: a competência da equipe que montamos e a convicção de que há espaço para um novo canal de jornalismo no Brasil. O público está ansioso por isso. Como empresa, temos um plano de negócios fundamentado, a longo prazo, em premissas diferentes do modelo tradicional da imprensa brasileira. A experiência dos Estados Unidos tem nos ajudado muito. Acreditamos em um caminho com rotas diferentes. Estamos prontos para disputar o mercado editorial, comercial e de distribuição com nossos grandes concorrentes. Uma de nossas vantagens comparativas é pensarmos diferente. Já nascemos cem por cento digitais, por exemplo. As empresas locais são importantes e estão estruturadas em décadas de tradição, mas há espaço para um novo player de jornalismo com a nossa bandeira e a nossa energia. Todas as pesquisas encomendadas por nós deixam isso claro.
E a curto e médio prazos? Qual a estratégia?
A nossa meta é consolidar a marca e nos apresentarmos como uma nova opção de informação para o público, sem o vale-tudo pela audiência. Vamos conquistar audiência tempo ao tempo, passo a passo, sem afobações. Esses objetivos estratégicos estão alinhados entre todas as partes que estruturam o nosso negócio. A indústria de mídia está em transformação e estamos prontos para essa nova era. Acreditamos que a tecnologia da operação, a modernidade de gestão, a qualidade dos produtos voltados ao nosso target, a marca, a força do nosso time e da nossa programação e o momento do país contam a nosso favor. O Brasil tem pedido uma nova opção de jornalismo