Quando traçamos um panorama sobre o mercado do marketing, era muito comum, até mais ou menos no começo de 2020, que alguém contestasse a forma que se trabalha o digital. O argumento sempre foi de que a peça publicitária era mais valiosa que as estatísticas, os leilões nos mecanismos de busca e a automação. É preciso vender o sonho para chegar no público. Pois então, infelizmente aconteceu a pandemia e tudo mudou. O marketing digital cresceu muito e agora é tido como o grande responsável por muitos comércios terem como se conectar com seus clientes. Mas isso significa que o marketing online vai matar o offline? Eu acredito que não.
Primeiro de tudo, acho importante entendermos que tudo foi um movimento natural e orgânico, porque era uma questão de tempo até o marketing digital ganhar tanto espaço em cima do convencional. Justamente por ser uma questão de cultura. À medida que a tecnologia avança, o comportamento de consumo muda bastante. O que mudou no ano passado (e esse ano continua) foi a pandemia. Os consumidores precisam realizar suas compras, de preferência por delivery, em muitos casos. Por isso os canais digitais se tornaram tão necessários. Acontece que a pandemia foi um fator de aceleração, mas em algum momento isso iria acontecer. Muitas empresas começaram a precisar aparecer no ambiente digital, como mercados de bairro, mesmo.
Neste contexto, alguns segmentos aceleram mais que outros. Todos pautados nas mídias online, casos como o varejo online, o de supermercados, comércios locais, bem de consumo e Saúde.
No caso do varejo online, isso ocorreu porque tivemos um período muito grande de lojas físicas fechadas. Os e-commerces em 2020 registraram aumento de 50% nas vendas em relação ao ano anterior, de acordo com a consultora BIP. Nesse cenário, alguns casos que mais impactaram foi a estratégia de vendas por WhatsApp. Nas Casas Bahia, por exemplo, 20% das vendas no ano foram fechadas por esse aplicativo. Isso uniu o útil ao agradável, pois havia uma grande quantidade de vendedores sem poder ir à loja, mas uma necessidade enorme de seguir vendendo. Foi inclusive uma forma de reposicionamento para manter a maior quantidade de empregos possível na ocasião.
Outro nicho que precisou muito do marketing digital foi o de supermercado, ancorado no varejo de alimentos. Houve a necessidade de se adaptar do dia para a noite e informar aos clientes como fazer as compras. Os produtos estavam ali. Eram perecíveis e precisavam ser vendidos, ao passo que os clientes tinham a necessidade de consumi-los por uma questão básica. De lá para cá, esse setor desenvolveu novas formas de ter esse contato, com serviços que antes não dispunham. Por se tratar de um público mais massivo, foi preciso investir em plataformas que trouxessem uma usabilidade maior para os consumidores. Por exemplo, aplicativos com uma navegação simples, para ser possível vender tanto para os millenials quanto para idosos ou pessoas com mais dificuldade em usar tecnologia.
A mesma coisa pode ser dita sobre os comércios locais no que diz respeito à adaptação do dia para a noite. Porém, há a diferença sobre o investimento para desenvolver uma plataforma própria. Neste caso, o importante foi escolher um meio que impactasse o cliente. Muitos fizeram a mesma escolha que a Casas Bahia e passaram a usar o WhatsApp.
Outro segmento que o marketing digital está crescendo a cada dia é o de DTC ou D2C (Direct-to-consumer ou direto para o consumidor). Este setor ainda está com foco nas grandes agências de publicidade, pois é um segmento que busca um trabalho de marca mais do que necessariamente performance. Essas costumam ser empresas de bens de consumo, como Sadia e Seara, que estão pivotando e vendendo direto para o consumidor.
E por fim, mas não menos importante, temos o segmento de Saúde. São as farmácias e seguros, que viram como forma de crescer o investimento em marketing digital. A Droga Raia, por exemplo, focou em um aplicativo próprio que tem como objetivo a melhora da experiência de consumo. Houve uma transformação rápida desse setor pelo contexto que vivemos hoje.
No fim das contas, todos os segmentos que aqui comentei tiveram momentos de alta por conta do uso de ferramentas de marketing digital, mas sinto informar: isso não vai ser para sempre. O contexto também ajudou o crescimento e em algum momento vai haver uma queda no volume de vendas online. No entanto, isso vai se estabilizar depois.
Assim como é verdade que em determinado momento o investimento em marketing offline praticamente cessou. Mas isso aconteceu porque não tinha loja aberta. O que se manteve desse mercado foi o posicionamento das marcas. Afinal, em período de gestão de crise, é importante que as marcas se posicionem. Aliás, é bom lembrar que as marcas que se posicionaram de uma forma correta, como a Ambev, que sempre se declarou a favor da vacina, do isolamento social e das lives, cresceu. Foi assim com a Magazine Luiza também.
Hoje, é possível ver então que “equilíbrio” é a palavra. O marketing offline não vai morrer, porque a TV vai continuar existindo, bem como o rádio. Alguns segmentos dependem do offline, até mesmo banners podem ser importantes dependendo da região do Brasil. O que importa é estar ligado a quem é seu público e qual sua persona. As agências precisam entender a jornada de consumo. É investir no digital para quem tem digital e investir no offline para quem está offline. O tipo de estratégia depende do seu entendimento de público. Se o comportamento do público mudou, sua estratégia tem que mudar também.
Lucas Palhares é Diretor de Negócios da agência de marketing digital Raccoon