propmark ouviu profissionais do setor para entender como evitar estereótipos e se conectar com esse público
Por estar cada vez mais conectada, consciente e com apetite de consumo, a classe D vem se mostrando como uma das principais forças do mercado. Neste cenário, macas e agências, que antes viam esse público de forma nichada, agora precisam olhar para ele como centro de decisões estratégicas.
Para entender como esse novo cenário tem impactado o setor de publicidade, o propmark conversou com profissionais do mercado que apontam caminhos para uma comunicação mais respeitosa, eficaz e livre de estereótipos. E que, ao mesmo tempo, reforçam a necessidade de escuta ativa e representatividade dos bastidores.
Consumo é conquista
O aumento do consumo nas classes mais populares não é novidade, mas tem ganhado contornos simbólicos importantes. Para Eduardo Mesquita, professor de Branding da ESPM e coordenador de pesquisa do Centro de Estudos Aplicados de Marketing, esse movimento reflete tanto uma melhora econômica quanto uma transformação cultural.
"Mais do que números, esse avanço expõe uma demanda historicamente reprimida. Para muitos consumidores da Classe D, consumir é uma forma de afirmação social e conquista individual", explica. Para ele, esse comportamento revela que o consumo não é apenas funcional, mas simbólico — associado à dignidade, ao pertencimento e à ascensão de status.
No entanto, ele alerta: é importante evitar generalizações. "O Brasil é diverso, e as condições de consumo variam entre regiões e perfis familiares. Assim, o crescimento do consumo nessa classe aponta não apenas para uma melhora econômica, mas também para uma mudança cultural, onde o acesso a bens e serviços representa um marco de inclusão e reconhecimento."
Comunicar com, não para
Na agência Pullse, que atua fortemente com esse público, o ponto de partida é inverter a lógica da comunicação tradicional. "A classe D não é só um público-alvo — é um verdadeiro centro de criação cultural, onde surgem linguagens, hábitos e comportamentos que depois escalam para o resto do país", afirma Allan Barros, CEO da Pullse e do Aceleraí.

Allan explica que o modelo de trabalho das agências parte da escuta: "mapeamos repertórios reais, testamos formatos com quem vive a rotina da ponta e só colocamos no ar aquilo que gera identificação de verdade. Comunicação, pra gente, não é sobre falar para, é sobre construir com."
Erros que ainda se repetem
Apesar dos avanços, ainda é comum ver campanhas com representações rasas ou estereotipadas. Mesquita aponta como principal falha a falta de diversidade nas equipes que pensam as estratégias. "Mesmo com equipes aparentemente diversas, o distanciamento social e cultural de seus integrantes em relação à base da pirâmide leva a decisões e campanhas baseadas em estereótipos e visões distorcidas."
Entre os deslizes recorrentes estão a romantização da precariedade, o tom paternalista e a subestimação da autonomia digital dessa população. Para Mesquita, "ignorar essa presença digital significa perder oportunidades valiosas de engajamento, personalização e construção de vínculos."
A importância da escuta e da presença
Para se aproximar genuinamente da classe D, as estratégias precisam nascer de uma escuta ativa. "No Aceleraí, por exemplo, usamos matriz de microcampanhas testadas em campo, cocriadas com creators locais e validadas com dados reais. Nada de achismo. A marca que escuta, acerta. A que repete fórmula, vira ruído", explica Barros.
A presença nos territórios é outro ponto-chave. “Repertório não vem de apresentação de agência, vem do chão da comunidade”, resume o executivo.
Dados reforçam a mudança
Uma pesquisa recente feita pela Data-Makers, em parceria com a Gerando Falcões e a ESPM, ajuda a sustentar esse cenário. O estudo revela que 59% dos consumidores das classes D e E pretendem aumentar o consumo em 2025 — percentual superior à média populacional.
Além disso, a baixa renda mostra forte presença digital: 91% acessam a internet diariamente, com destaque para redes como Instagram, Facebook, TikTok e YouTube. Também se destacam na valorização de causas sociais e éticas, como inclusão, sustentabilidade e alimentação saudável.
“Esse público quer ser reconhecido em todas as telas, com respeito e protagonismo. Marcas que entenderem isso terão oportunidades valiosas de conexão”, afirma Fabrício Fudissaku, CEO da Data-Makers.
Vínculos reais e duradouros
Para além da linguagem ou do canal, o que faz a diferença é a postura estratégica e simbólica. "Inclusão real, respeito cultural, atualização tecnológica e propósito com impacto tangível são os pilares de uma abordagem estratégica e simbólica capaz de conectar verdadeiramente com a Classe D", finaliza Mesquita.
Em um momento em que o consumo na base da pirâmide se mostra mais forte, agências e marcas que ainda trabalham com estereótipos correm o risco de se tornarem irrelevantes.