O concurso Miss América de 1968 entrou para a história, não pelo evento em si, mas pelas mais de 400 ativistas do Women’s Liberation Movement, que colocaram no chão e no lixo objetos como sutiãs, sapatos de salto alto, cílios postiços, maquiagens e outros itens ligados à beleza feminina. Este episódio, que ficou mundialmente conhecido como “a queima dos sutiãs”, é reconhecido como um marco na luta pela igualdade de gênero. Nesta mesma época o movimento dos Panteras Negras ganhava força nos Estados Unidos, na luta pelos direitos dos negros, enquanto o festival de Woodstock atraía milhares de pessoas que celebravam o desprendimento dos padrões comportamentais e a liberdade sexual.

Desde então os avanços nos padrões de comportamento social, no que tange à noção de isonomia de gênero, raça, orientação sexual e classe social, ocorreram em ritmo muito mais intenso que nos séculos anteriores, marcados por abismos sociais e desigualdades de toda a sorte. Com o advento da internet, smartphones e mídias sociais, a voz das minorias subjugadas reverberou em todas as esferas da sociedade, provocando transformações nos valores, leis, códigos morais e éticos.

O mesmo vem ocorrendo na publicidade, relação das marcas com seus consumidores, uma vez que estes passaram a conduzir sua jornada de compra com mais atenção e consciência de sua identidade, necessidades e valores. O consumo consciente está deixando de ser uma exceção!

Cabe aos profissionais de marketing captar a essência deste movimento e traduzi-la na comunicação das marcas para criar uma relação mais sólida com seus consumidores, fundada em ações e práticas condizentes com seus propósitos. O resultado desse processo é a representação da diversidade, e de todas as discussões correlatas, na comunicação publicitária.

Não, o assunto não está esgotado. Ainda há muito por fazer neste sentido, mas, felizmente, nos últimos anos, temos visto os anunciantes se mobilizarem  para alinhar o posicionamento de suas marcas  aos anseios de seus consumidores, resultando em iniciativas importantes que contribuem para um mundo mais justo. Mais do que focarem numa oferta ou nas características de um produto ou serviço, os profissionais de marketing têm a responsabilidade de atuar como agentes responsáveis por dar visibilidade às transformações sociais em suas campanhas publicitárias, sob pena de ficarem totalmente desconectados com a realidade e com seus consumidores.

No atual momento de crise mundial, tal responsabilidade ganha ainda mais complexidade, em função de como indivíduos de diferentes etnias, identidades de gênero e condições socioeconômicas estão sendo impactados pela pandemia. Classes sociais menos favorecidas são mais sensíveis aos impactos econômicos, têm menos acesso ao sistema de saúde e poucas ou, muitas vezes, nenhuma, condição de manter o isolamento social.

Mulheres que sempre foram obrigadas a conciliar tarefas domésticas, carreira e interesses pessoais, encaram agora o desafio do home office, muitas vezes  sem a estrutura adequada, com o cuidado dos filhos em casa. Nesse cenário, há também aqueles que observam o ofuscamento de suas prioridades pelas mazelas da pandemia, enquanto temem por sua saúde.

Por definição, a diversidade é múltipla e engloba muito mais do que as discussões de gênero, orientação sexual, condição socioeconômica ou etnia. Em 2018 a ABA, que tem como propósito a mobilização do marketing para transformar negócios e a sociedade, lançou no Brasil de forma pioneira o Guia para Representação Responsável de Gênero na Publicidade.

Como extensão natural desse trabalho a Entidade lança neste mês o Guia para a Abordagem de um Profissional de Marketing para Diversidade e Inclusão. O lançamento ocorrerá no dia 29 de maio, em sua reunião de diretoria, simultaneamente com o lançamento em seu portal.

Criatividade e inspiração florescem nos indivíduos a partir de suas experiências e oportunidades que o ambiente e a cultura proporcionam, mas sem as contribuições de vários grupos, com suas especificidades e peculiaridades, não podemos afirmar que somos defensores da diversidade.

Nelcina Tropardi é presidente da ABA e vice-presidente de Sustentabilidade e Assuntos Corporativos da Heineken