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Quando um cliente entra porta adentro da minha empresa dizendo taxativamente que quer um projeto de branding, com absoluta certeza e com rigor no pedido, “de branding!”, fico surpreso, nervoso e perplexo. E, claro, acabo ficando feliz também.

Explico.

Para alguns, branding é o momento de se rever o “logotipo” e as expressões de comunicação visual de uma marca. De cara, um erro radical na concepção do tema, pois reduz apenas ao “design” o que se pretende ser um tema de gestão empresarial mais profundo nos dias de hoje.

Para outros, é uma ferramenta filosófica que versa sobre valores e sobre a missão de uma empresa que, geralmente, fica distante das necessidades transacionais do dia a dia e, definitivamente, não ajuda (mas também não atrapalha) os negócios. Claro que essa tese é tão ou mais profundamente equivocada do que a primeira, já que reflete um preconceito raso e notório de que branding não seja capaz de alavancar os negócios e suas receitas.

O que nos interessa aqui não é definir o termo pelo viés da academia, do dicionário ou da comunicação. Mas trazê-lo à realidade em uma expressão que possa traduzir com simplicidade e, ao mesmo tempo, com força o verdadeiro significado da disciplina.

No século em que vivemos, nada pode agregar mais valor para uma companhia e suas marcas do que tornar públicos e evidentes seus princípios fundamentais, seus valores na relação com a sociedade e sua razão de existir. No branding, damos a esse conjunto de comportamentos o nome de Propósito ou Proposta de Valor. É uma espécie de “varal moral corporativo”, onde se penduram várias atitudes empresariais.

Melinda Davis, uma consultora americana especializada em comunicação e psicologia do consumo, em seu livro A Nova Cultura do Desejo, lançado já há dez anos, afirma que o século 21 é o século no qual as marcas e as empresas são “curadoras sociais”, em inglês “social healers”. Os coletivos que conhecemos – escola, igreja, associações, clubes e governo – estão cada vez mais pressionados a terem uma posição clara sobre as causas contemporâneas, mas é evidente que sozinhos não estão dando conta de responderem a isso tudo. O mundo corporativo, por ser um “coletivo” em que passamos ao menos 50% do nosso tempo produtivo, não pode se ausentar em entrar nessas discussões.

Vale mencionar aqui Zygmunt Bauman, pensador contemporâneo que define o mundo em que vivemos na pós-modernidade como “líquido”. Onde os padrões, hábitos e costumes se modificam a cada minuto graças à internet, fica cada vez mais difícil para a sociedade e para o indivíduo reconhecerem em que parâmetros eles estão apoiados. A não ser que o indivíduo volte a olhar mais profundamente para si, refletir sobre suas questões íntimas, morais e éticas. E, a partir delas, atuar de forma consciente. E, nesse sentido, uma empresa com um propósito claro e com princípios virtuosos pode ser um grande exemplo balizador para o indivíduo e, consequentemente, para a sociedade.

Trata-se de uma nova forma de pensar o negócio, com muito mais consciência dos seus impactos sobre o mundo e de suas relações com os diversos stakeholders. Enfim, a marca é o que reflete essa construção de valor, é o que faz com que as pessoas estejam dispostas a pagar mais por seus serviços e produtos porque os valorizam.

Não bastassem as questões de comportamento, uma empresa com um Propósito maior claro impacta diretamente seu dia a dia com os funcionários porque potencializa seus talentos, inspira a cada dia e gera engajamento que vai além da necessidade de um salário no fim do mês. Como efeito colateral, as empresas invariavelmente experimentam um aumento de produtividade e, consequentemente, a geração de mais lucro.

Se o eixo central do branding é a escolha de um Propósito empresarial inspirador para contaminação dos seus públicos, o pedido de um projeto de branding deveria ser celebrado como uma confissão corporativa, um compromisso que vai além do negócio.

Ulisses Zamboni é presidente da Santa Clara, conselheiro do Capitalismo Consciente  e psicanalista (uli.zamboni@santaclara.sc)