A origem da palavra me remete a algo que eu trago (de tragar — jogar para dentro).

O que inalo, engulo, sinto, ouço, absorvo, vejo, trago para dentro — o que eu inspiro. Lá dentro, se transforma. É moldado e jogado de volta para fora. Devolvo para o mundo o que levei, mas agora com uma forma totalmente pessoal.

Tudo o que emito, seria, portanto, um resultado de uma olaria internalizada com matéria-prima colhida em um contexto único.

Da minha própria e única experiência. O que envolve ambientes familiares, amigos, trabalho, consumo cultural, entretenimento, os livros que nunca terminei, os podcasts que já ouvi, a pista de uma longa festa no fim de semana ou o papo sem muito interesse no elevador, que depois se repetiu no ponto de ônibus.

Por muitos anos trabalhei em agências. Vezes como mídia, vezes como social media e finalmente como planejamento.

Em todos, algo em comum: estudo de comportamento, hábitos de consumo. A famosa jornada. E o ser humano é tão complexo, não é mesmo? Entender uma pessoa, de verdade, exigiria conhecer todos os contextos acima citados. Exigiria ainda vivenciar as mesmas experiências, ter as mesmas reações químicas neuronais para então chegar às mesmas conclusões.

Quando falamos em clusters, grupos específicos de audiência, significaria então multiplicar essas experiências por cinco, dez, mil, um milhão de vezes. Definitivamente impossível.

Portanto hoje entregamos às máquinas que nos favorece com suas capacidades sobre-humanas que, por meio de dados

gerados por nós, entregam uma média aceitável para trabalharmos com uma relativa certeza.

Hoje já possuímos tecnologia suficiente para confiar nessas informações diárias, entregues em real time, de como e para onde seguir.

Cada vez mais, os dados atropelam as conversas frutíferas de onde nasciam as mais geniais ideias. Hoje não precisamos de ideias geniais.

Precisamos apenas de um pequeno acerto, uma rápida mensagem assertiva para um grupo seleto de pessoas.
O que torna tudo muito mais efêmero. Ideias aquarelas, solúveis em água, de artistas beta-digitais.

Aos apegados, pode parecer triste, mas com uma rápida reflexão concordarão que não é. A essência é a mesma, apenas o meio mudou.

Segundo Elis, ‘o novo sempre vem’. E vem sempre carregado de críticas e inseguranças.

Mas seguimos sendo ‘como os nossos pais’. E é isso o que me inspira. A nossa essência, a essência humana, continuará sendo a mesma. Existimos para colaborar com a nossa existência. Existimos para inspirar e ser inspirados. Existimos para inalar, absorver, ouvir, ver e ser vistos.

Para não nos frustrarmos ainda mais com a chegada assustadora do mundo autônomo, devemos nos aproximar cada vez mais dessa essência. Precisamos voltar para as raízes.

E não tem nada mais humano que a criatividade, que nada mais é que resultado de recortes de inspirações do cotidiano.

E por isso que as conversas, mesmo aquelas de elevador, continuam me seduzindo.

Por isso a novela morna que ainda entretêm meia dúzia de pessoas continua me parando na frente da TV sempre que estou de visita aos meus pais.

Do papo tímido do padeiro ao reclamar nervoso da senhora com o cachorro na rua.

Elas me animam. Animam, me despertam e me atraem de forma irrefutável.

Cada pessoa na rua, cada voz da mesa de trás do restaurante são histórias únicas, cheias de contexto que eu jamais terei capacidade de compreender.

Nem a tecnologia de dados é capaz de captar.

Somos únicos. Isso é o que me inspira.

Tom Rocha é brand strategy manager da VIX Brasil