Como destacou a publicação, a realidade da internet é que “seu poder de mercado é grande demais, sua influência sobre o discurso político e cultural é absoluta demais” e a fila daqueles que desejam colocar freios em sua ação aumenta a cada dia; como a senadora por Massachusetts, Elizabeth Warren, que viu nessa ação uma forma de ganhar crescente projeção. Afinal a internet oferece, cada vez mais, “a lot of nothing”. Mas o maior perigo vem mesmo do Leste, pois, como o próprio Mark Zuckerberg destacou em sua “aula” na Georgetown University, em Washington, “há uma década, os grandes operadores digitais eram todos americanos. Hoje, cinco dos dez maiores são chineses”. Uma alternativa “pior” que Google, Facebook e Amazon, em todos os sentidos.

Os exemplos são o Tik Tok, o Alibaba e o fenômeno WeChat, que já tem centenas de milhões de pessoas usando a internet todos os dias de um jeito que nem mesmo os mais “modernos” pensaram que seria usada. O WeChat começou em 2011 como um aplicativo de bate-papo, mas agora se tornou um superapp.

Com mais de um bilhão de usuários ativos mensais, não é apenas uma rede social – tornou-se um sistema de pagamentos, um meio de comunicação e, talvez o mais ambicioso, a infraestrutura para praticamente qualquer empresa realizar o próprio comércio eletrônico. É a segunda geração de outro gigante da internet, a Tencent.

Na ponta americana, o que se vê é que os megaplayes começam a ter de dividir seu espaço, pois a Amazon é bem mais que um simples site de comércio eletrônico; o Google é muito mais que um mecanismo de pesquisa; e o Facebook é uma coalisão de megasserviços digitais.

Com tudo isso, o futuro da internet, como destacou o NYT, nunca foi tão imprevisível. O certo é que haverá mais controle e até censura, além da óbvia ação das autoridades chinesas, como as leis europeias – da UE em si e de vários países – e os movimentos nos EUA, onde chovem propostas de controle. Com isso, vem se alterando a percepção sobre o que é a internet. Desde os primeiros dias da Arpanet, ela era percebida como sendo aberta e global (para que qualquer pessoa pudesse se conectar, em qualquer lugar) e também igual (na medida em que todos deveriam conseguir dela as mesmas coisas). Mesmo quando ela se transformou de um projeto acadêmico de capital público (em grande parte) para um centro de lucro (principalmente) de capital corporativo, o poder desses valores essenciais persistiu.

A internet iria capacitar as massas, derrubar hierarquias, construir um mundo virtual muito superior ao mundo real que nos unia. Mas ela nunca foi capaz de nada disso e, desde que o poder caiu nas mãos de plutocratas e ditadores, toda a retórica em torno dela serviu apenas aos interesses deles. Dessa forma, a internet não significa mais a mesma coisa para todas as pessoas em todos os lugares, uma ficção que a realidade tornou impossível de sustentar. Até a infraestrutura básica de banda larga e móvel permanece altamente desigual, dependendo de onde você mora, tanto nos EUA como no mundo.

O triopólio (Google, Facebook e Amazon), pelo lado Ocidental, concentra cada vez mais poder e recursos, levando muitos a se unirem contra eles. Na sua luta – e na dos chineses contra eles – estão oferecendo maneiras totalmente novas de estruturar e ordenar a vida online, com consequências que são assustadoras em alguns aspectos, apesar de igualitárias em outros.

Em resumo, a internet é desigual, e assim será, sempre mais. O próprio esperado fenômeno do 5G, ao contrário de ser universal, deverá maximizar as diferenças, tudo contribuindo para transformar a utopia em distopia, e o sonho em um verdadeiro pesadelo.

Rafael Sampaio é consultor em propaganda (rafaelsampaio103@gmail.com)